A morte do Niemeyer comoveu o país.
Confesso que também me comovi e rezei privadamente pela alma do homem que,
embora assumidamente comunista e ateu – uma tautologia não estivéssemos no
Brasil -, tem uma alma imortal.
A comoção, a meu ver, se
justifica pela presença de Niemeyer no imaginário popular do homem que construiu
a nova Capital, projetando nela e alhures obras arquitetônicas que ficaram
gravadas na mente de brasileiros e estrangeiros. Justifica-se ainda pela
longevidade do arquiteto, uma vez que a velhice, sobretudo a centenária, costuma
despertar uma certa admiração e uma pontinha de inveja em todos. Um velhinho
centenário é sempre uma criatura indefesa a quem queremos abraçar e
proteger.
Por outro lado, Niemeyer
manteve a lucidez de um gigante ao longo de seus 105 anos incompletos. E não me
consta que tenha repudiado suas ideias, nada indefesas. Aliás, ninguém estaria a
salvo se elas tivessem prosperado no Brasil. Onde os ídolos do arquiteto tomaram
o poder deixaram um legado de morte e destruição do homem e do humano. De
idealista Niemeyer nada tinha, sua ideologia era o materialismo dialético
marxista e a consequente rejeição de nosso patrimônio espiritual e cultural
judaico-cristão.
Nas últimas homenagens a
Niemeyer puderam ser vistos dois padres, um pastor luterano e um rabino
realizando conjuntamente as “exéquias” do arquiteto. Espírito cristão? À exceção
do rabino evidentemente. Ausência de julgamento? Solidariedade com a família?
Nada disto! Pura e simplesmente absoluto desrespeito às convicções íntimas
mantidas durante décadas por Niemeyer e, como não?, aos sacramentos da fé.
Qual teria sido a reação do
arquiteto se lhe fosse dada a possibilidade de despertar e dizer algumas
palavras aos presentes antes de voltar ao sono da morte? Que hinos gostaria de
ouvir: "com minha Mãe estarei" ou o da Internacional Socialista? Que bandeiras
quereria ver hasteadas ao lado da brasileira: a do Apostolado da Oração ou da
Rússia stalinista? Que símbolos ostentados: a cruz ou a foice e o martelo? Em
que presença preferiria passar estes últimos instantes antes de voltar ao pó: a
dos religiosos ou a dos camaradas?
Ora, demos a palavra ao morto!
Bem, sabemos que o morto já as havia pronunciado reiteradas vezes antes do
passamento. E não as respeitaram!
Como bons cristãos, devemos nos
abster de julgar o destino da alma imortal de Niemeyer, que confiamos ao Deus
bondoso e misericordioso. Como bons cristãos, devemos nos solidarizar com a dor
da família, apoiando-os com nossas orações e – no caso daqueles que lhes são
próximos – com a presença. Como bons cristãos, sobretudo se sacerdotes, devemos
conhecer o sentido dos ritos que realizamos, sem o que são meras repetições
vazias de palavras e gestos.
Niemeyer construiu algumas
igrejas, é verdade. Do ponto de vista arquitetônico, o juízo sobre elas pode
variar de pessoa a pessoa. Mas, da perspectiva cristã, elas são qualquer coisa
exceto lugares de culto. Sua mais famosa é a Catedral de Brasília e a que foi
encomendada pelo Arcebispo de Belo Horizonte, a mais recente. Dom Rossi Keller,
bispo de Frederico Westphalen, diz em poucas e inequívocas palavras o que são as
“igrejas” de Niemayer:
“A meu ver, a intenção do marxista Niemeyer era
clara: a resignificação do sagrado... golpe do marxismo soviético, com seus
imensos prédios cheios de... vazio. Expressão de uma alma sem fé: vazio, espaços
vazios. Na verdade, a meu ver, era como que um grito de uma alma que teve na
infância marcas católicas, mas que, infelizmente perdeu-se em uma ideologia
falida. A arquitetura sagrada cristã tem alma, tem quem a habite: é casa de Deus
e casa do homem. É lugar de encontro: vê-se, toca-se, sente-se o odor do eterno.
Tem Presença, é habitada. Tudo aponta para a eternidade, de certa forma, já
presente. A torre é como um dedo apontado para cima, para lembrar o homem que há
um Deus e um céu. A abóbada é representativa do céu definitivo. O Átrio,
representa as portas da eternidade, acolhedoras, abertas. A nave mostra a
necessidade do caminho, do estar no mundo, etc. Niemeyer nunca poderia expressar
isto em sua arquitetura, não porque não fosse capaz. Mas porque não tinha o dom
da fé. Portanto sua arquitetura, a meu ver é cheia de ... vazio: bonita,
elegante, até digna. Mas, infelizmente, vazia.”
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* Bispo Diocesano da Igreja Católica de Frederico Westphalen, Rio Grande do
Sul.
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