segunda-feira, 30 de abril de 2012





“Perguntou-se a José Saramago:


-Como podem homens sem Deus serem bons?


Sua resposta foi:


Como podem homens com Deus serem tão maus?”




É...também me faço a mesma pergunta!

                               O apocalipse segundo a "Bíblia"

                                                                                                                         METÁFORAS
                                                                     “Os quatro cavaleiros do apocalipse”, de Billie Water

No início da era cristã,
por volta dos anos 90,
uma onda de opressão e violência
patrocinada pelo Império Romano
alvejava a comunidade judaico-cristã do Mediterrâneo

No início da era cristã, por volta dos anos 90, uma onda de opressão e violência patrocinada pelo Império Romano alvejava a comunidade judaico-cristã do Mediterrâneo. O clima hostil serviu de inspiração para um dos perseguidos, João de Patmos, redigir um conjunto de textos sobre a história que se passava a sua frente. A obra, intitulada Apocalipse, compõe o último livro da “Bíblia”. Nela, João faz uma leitura econômica, política e social do momento do conflito, explica as causas dele e anuncia como será o fim daqueles dias: a vitória dos que sofriam, do bem sobre o mal. A cada capítulo, o autor procurava passar uma mensagem de conforto que, longe de produzir conformismo, pretendia ajudar o povo a entender aquela situação, resistir e enfrentá-la. Algo como “continue na luta que você vencerá”.
Mais do que o fim do mundo, o Apocalipse de João anunciava, portanto, o fim dos que mandavam no mundo. Acontece que o Apocalipse (apokálypsis, em grego, significa revelação) e outros textos do gênero – que começaram a surgir pelo menos 200 anos antes do de João – são férteis em metáforas e passagens fantásticas. E é esse traço que dá margem a interpretações acerca do fim dos tempos por parte de diferentes correntes religiosas. Personagens e passagens como a besta (que seria, muito provavelmente, o imperador Nero, segundo o Apocalipse de João), o dragão que persegue os descendentes de uma mulher (a Igreja Católica), o cordeiro (Jesus Cristo) enviado dos céus para julgar os homens e os mil anos de paz na Terra vão sendo relidos ao mesmo tempo que fatos históricos, como a ascensão de Hitler, o comunismo, a Guerra Fria e o 11 de Setembro, ganham contornos de sinais do final de tudo.
“Para a tradição apocalíptica americana, que se desenvolveu com grupos religiosos como adventistas, batistas e presbiterianos no século XIX, o “Apocalipse” revelaria as fases da história humana, tanto do passado quanto do futuro próximo, no fim dos tempos” , diz Paulo Nogueira, autor de “O que É Apocalipse” (editora Brasiliense). Desta forma o anticristo poderia ser um novo papa ou um novo ditador, ou quem quer que venha a ser entendido por esses grupos como uma ameaça à liberdade religiosa do mundo e, em especial, uma ameaça à identidade deles. Outro estudioso do tema, o professor de teologia Rafael Rodrigues da Silva, da Pontifícia Universidade Católica (PUC), de São Paulo, reforça a tese com uma indagação: “Qual dos grupos religiosos que leem o fim do mundo estão ajudando o povo a interpretar a crise econômica mundial?” Para ele, leituras fundamentalistas dos textos apocalípticos têm afastado o teor crítico dos escritos antigos e produzido leituras alienantes. “Quando um grupo perseguido não se entrega e diz que vai vencer em nome de Deus, está fazendo resistência. Aqui, hoje, aplicam a história para alienar, fecham a doutrina na questão da salvação e o foco principal do apocalipse – que é ajudar o povo a enxergar o atual momento e fazer o enfrentamento – é esquecido.”
Alexandre Leone, pesquisador do Centro de Estudos Judaicos da Universidade de São Paulo (USP), acredita que a crise econômica seria o fim do mundo do nosso tempo. Entre os judeus, os textos de caráter apocalíptico se encontram no Livro de Daniel, no Antigo Testamento, e não no de João. Em comum com os escritos seguidos pelos católicos estão, entre outros pontos, a vinda de um juiz, no caso o Messias, e a ideia de que a história caminha para o seu final. A batalha do bem contra o mal, porém, não tem destaque na literatura rabínica.
“A natureza não muda, ou seja, não há de fato um fim do mundo, mas um mundo novo, um conserto dele”, afirma Leone, rabino da comunidade judaica de Alphaville. A ideia de arrumar o mundo foi elaborada por rabinos originários da Península Ibérica, de onde os judeus foram expulsos no século XV. “Não pode haver uma vitória de uma corrente – isso acabaria com o equilíbrio das coisas. O mal tem de existir solto no mundo porque é nessa dança que tudo acontece”, diz Leone.
Religião monoteísta como o catolicismo e o judaísmo, o islã também conta com uma teologia apocalíptica. Segundo o “Alcorão” e as profecias de profetas como Jesus, Abraão e Mohammad – existem, no total, 124 mil profetas –, Deus daria pequenos sinais (como a banalização da vida e da morte, as mudanças climáticas bruscas e o fato de o homem imitar a mulher na maneira de se vestir) e grandes avisos (a vinda do anticristo, o retorno de Jesus, a grande guerra mundial, a inversão da rotação da Terra e o nascimento do Sol no Ocidente) da proximidade do fim dos dias. Os muçulmanos aguardariam o retorno de Jesus, que eliminaria o anticristo. Um reino de paz se estabeleceria até um novo tempo de injustiças se reiniciar. Cristo, então, morreria e com ele seus fiéis. Na Terra restariam os injustos, que seriam eliminados no fim do mundo. “Estamos próximos do fim dos tempos. É difícil eu ver algum pequeno sinal dado por Deus que já não esteja entre nós”, diz o sheik Jihad Hammadeh. As crises do Oriente Médio, o clima de tensão no Iraque e a expulsão dos palestinos para a criação de Israel, em meados do século passado, são interpretados pela literatura islâmica, de acordo com o antropólogo Paulo Hilu, coordenador do Núcleo de Estudos sobre o Oriente Médio da Universidade Federal Fluminense, como alguns dos sinais.
Hammadeh, que é presidente da comissão de ética da União Nacional Islâmica, reforça que somente Deus tem o poder de precisar quando as profecias irão se concretizar. Nogueira, em “O que É Apocalipse”, segue esse roteiro e escreve que calcular tempos em que as pragas anunciadas pelo Apocalipse de João viriam a acontecer é “deixar de levar em consideração a linguagem mítica em que o ‘Apocalipse’ foi concebido”. No entanto, a humanidade vive com a perspectiva de que o mundo caminha para o fim, de que há forças antagônicas contribuindo para isso e se esquece de atentar para a salvação dos eleitos. “Aquele que lê o Apocalipse não pode viver a vida esperando o consolo após a morte. Deve procurar a justiça aqui”, diz o cônego Celso Pedro da Silva, especialista em Sagrada Escritura. “Se quer que os mil anos de paz e tranquilidade também previstos no Apocalipse aconteçam, tem de aprender a vencer o dragão agora.”
------------------------------Reportagem por Rodrigo Cardoso
Fonte: Revista ISTÓ É, on line
Raciocínio lógico pode afetar fé em Deus, diz pesquisa
REINALDO JOSÉ LOPES - EDITOR DE “CIÊNCIA+SAÚDE”


Exposição a imagens de 'O Pensador' e verbos como 'ponderar' faz as pessoas se declararem menos religiosas

O "ministério da cultura" adverte: contemplar a escultura "O Pensador", do francês Auguste Rodin (1840-1917), pode fazer com que você fique menos religioso.

A frase soa como loucura, mas esse é um dos achados de um estudo que acaba de sair na revista "Science".

Trata-se, na verdade, de um caso particular de um fenômeno mais amplo: aparentemente, levar as pessoas a pensarem de modo mais "racional", por meio de influências sutis (como a exibição da célebre imagem do homem refletindo), reduz as tendências religiosas dos sujeitos.

A pesquisa é assinada por Ara Norenzayan e Will Gervais, da Universidade da Colúmbia Britânica (Canadá), que estão entre os mais destacados estudiosos da psicologia da religião.

Eles partiram de uma hipótese apoiada por outros estudos, segundo a qual pessoas religiosas preferem usar a intuição ao processar dados, enquanto os não religiosos usam o raciocínio detalhado.

Os religiosos, por exemplo, acabam caindo com mais facilidade em "pegadinhas" lógicas, independentemente de seu QI ou nível educacional.

A dupla de pesquisadores combinou esse dado com uma técnica comum de psicologia experimental, o chamado "priming", que envolve o uso de um estímulo prévio para "preparar" a mente do participante de forma a reagir de certa maneira.

Sabe-se que o "priming" funciona em contextos educacionais. Se alunos de uma escola da periferia leem, antes de uma prova de ciências, sobre garotos pobres que se tornaram grandes cientistas, tiram notas melhores.

No estudo canadense, dezenas de voluntários tinham de realizar tarefas, metade das quais poderia levar a um "priming" do pensamento analítico, enquanto a outra metade era neutra.

Sabe-se que até ler um texto com letras miúdas pode favorecer a ativação desse tipo de raciocínio.

Os voluntários que fizeram as tarefas "analíticas" tiveram menos propensão a se declarar religiosos depois.

Para os pesquisadores, um motivo possível para isso é que a religiosidade depende de processos mentais intuitivos, como detectar "personalidade" no mundo -mesmo em contextos inanimados, como a natureza, o que levaria à crença em deuses. O raciocínio analítico poderia bloquear isso.
Moralizando a Bíblia 

escrito por :Paulo Ghirardelli Júnior

Hoje vamos conversar sobre a série “Rei Davi”, que está sendo exibida pela TV Record.
É uma série muito rica, cheia de detalhes, porém que peca um pouco… E aqui eu digo peca propositalmente, pois quando se falha em reproduzir um texto bíblico, provavelmente Deus fica bravo. Mas, voltando ao assunto, a série peca quando se trata de transmitir o que realmente está na Bíblia.
Eu assisti os primeiros capítulos da série e fiquei curiosa para saber, primeiramente, o final da história, e também se o que eu estava assistindo correspondia ao texto bíblico ou, digamos, fazia justiça ao texto. Resolvi então pegar a minha Bíblia e ler desde a conquista do Rei Saul até o reinado do filho de Davi, Salomão, que foi um rei muito conhecido por sua inteligência, discernimento, e pela famosa passagem em que duas mulheres disputam um neném, alegando ser filho delas e a outra ser uma ladra de bebes. Todos sabemos que Salomão, então, pede que cortem o bebê ao meio, dando metade para cada uma. Nesse momento uma das mulheres cai em prantos e diz que prefere ver o filho vivo, porém com outra, do que morto. Dessa forma Salomão entrega o bebê à verdadeira mãe.
Mas, voltando a falar sobre a série e sobre o Rei Davi, eu percebi que a Record fez algumas mudanças na história. Acredito que eles acharam a história bíblica um tanto “desatualizada” para as audiências modernas da TV. Algumas cenas eles devem ter achado muito fortes, muito violentas, então resolveram contar de outra forma ou mesmo omitir. Um exemplo é o do filho de Jônatas – que é neto do rei Saul e segundo herdeiro do trono – ter nascido sem as pernas ou, melhor dizendo, nascido com as pernas atrofiadas, segundo a versão bíblica. Quem acompanha a série deve ter visto que o menino nasceu com as pernas e acabou perdendo o movimento das mesmas em um acidente.
Outro fato interessante foi a omissão de como Davi adquiriu suas duas primeiras esposas. Posso dizer que foram em circunstâncias um tanto violentas, e até mesmo desonestas. Creio que foi isso que Record pensou, e não as incluiu em sua trama. Nesse caso, não vou contar o que houve, propositalmente, para que o nosso ouvinte fique incentivado a ler a história.
Mas o que mais me deixa curiosa sobre a série é saber como a televisão irá retratar uma cena dessa história que ainda não foi ao ar.
Uma cena muito importante que não poderia deixar de ser mostrada: a união do rei Davi a Batseba, a futura mãe de seu filho e herdeiro do trono, Salomão. Segundo a Bíblia, Davi está em seu palácio quando observa uma bela mulher nua, tomando banho e se insinuando para o rei. Davi fica louco de amores por Batseba, e ao descobrir que a mesma é casada resolve tramar a morte do seu marido para poder casar-se com ela, mesmo sabendo que isso seria uma grande ofensa a Deus e mesmo o marido de Bat Seba sendo um homem fiel do exército de Davi. Claro que Deus não deixa impune esse ato e faz com que o primeiro filho do casal morra. Mas depois, o rei e Deus resolvem fazer as pazes, e Batseba, com todo o seu poder de argumentação e suas belas curvas, mesmo não sendo a primeira esposa, convence Davi a nomear Salomão como sucessor do trono.
 
 
Post scriptum. Na série, depois que fiz este texto para o Programa da Lidiane, vi que o episódio de Batseba com o Rei, acabou também se dando de maneira diferente do da Bíblia. No Livro Sagrado, a moça tira a roupa propositalmente, e passa a nadar em um lugar que o Rei possa vê-la. Na série de TV tudo se passa como se o episódio não tivesse sido programado por nenhum dos dois.
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* Filósofo. Escritor. Prof. Universitário.
Fonte: http://ghiraldelli.pro.br/2012/04/29/moralizando-a-biblia/

domingo, 29 de abril de 2012

Educação e Liberdade
Escreve: Eliani Gracez< filósofa clínica>



Entre os seres que vivem neste planeta,os humanos nascem sem identidade própria, sua identidade é construída a partir do modelo social vigente. O instinto de preservação e de identidade nos animais está interiorizado com a espécie humana não contece o mesmo.
Um exemplo disso são as meninas lobas encontradas em 1920,na India.Elas foram criadas pelos lobos e desenvolveram características de lobos e não de humanos.Isso justifica a importância da educação,e dos bons exemplos,porque os humanos não sabem tirar de si sua própria identidade,e,por isso necessitam de um modelo para se desenvolver.

O que os jovens veem é corrupção,violência social,injustiça ,impunidade,desrespeito às leis,e na televisão assistem a programas que não contribuem em nada com sua formação.Fácil está de perceber a inexistência de um modelo de SER HUMANO,para jovens e crianças se identificarem.O líder do rebanho não é mais um homem ou uma mulher,mas,sim um computador.
Em uma época onde a moral e os valores são duvidosos,e o honesto é chamado de " boboca ", o indivíduo perde seu referencial,causando desestrutura pessoal.Ao culpar a família pela desestrutura da educação,é preciso lembrar que este modelo foi,desde longa data,opressor,e,muitas vezes,violento.Homens,contruíram  uma estrutura machista em cima de uma base não sólida,por isso,mais cedo ou mais tarde,a casa teria que desabar. O moralismo do passado já não serve mais.E,agora,não sabemos o que fazer para estabelecer uma nova ordem.Em meio à desordem,as drogas estão se tornando uma epidemia.Mas o que leva uma pessoa a se tornar um consumidor de drogas? ... talvez seja insegurança,imaturidade,irresponsabilidade,ausência de valores,falta de um ideal,desestrutura pessoal e familiar,curiosidade,fuga,modismo,e,sobretudo,problemas na educação.Um jovem bem educado sabe que a escolha certa é dizer não às drogas.

E,agora,como restabelecer a ordem em meio aos caos?O FATO É QUE ESTE MUNDO JÁ NÃO É MAIS O MESMO,ESTE VELHO PLANETA MUDOU!
O homem também mudou.E onde estão nossos idosos???- Estão  em processo contrário,estão rejuvenescendo.A tecnologia tomou conta da vida.Computadores,máquinas informatizadas,inúmeros satélites rodeando o planeta.Tornamo-nos ciborgues e nos movemos sumultaneamente no real e no virtual.
Com toda essa mudança que perpassa o planeta ,nos esquecemos de nossas crianças,nos esquecemos de que elas também mudaram e não querem mais ser tratadas como no passado.A vida cheira a liberdade.Liberdade de ação,de expressão ,de credo.Somos livres,sim!

E,com isso,deparamos com um grande desafio.O desafio de fazer uso da libertade para o desenvolvimento ,e não para a destruição.O problema tornou-se claro quando vemos jovens qued não sabem administrar sua liberdade,usando drogas.O problema reside no conceito de liberdade,pois tem quem pense que liberdade é fazer o que bem entende da vida.Um prisioneiro é só um prisioneiro,porque não tem liberdade de escolha.Se tivesse,não seria prisioneiro,escolheria ser livre.Isso nos faz pensar que o lugar da liberdade reside no ato de fazer escolhas.Mas poucas são as pessoas educadas para compreender que cada escolha tem uma consequência.Para cada ação,existe uma consequente reação.Quem não pensa nas consequências não é livre,é,prisioneiro de suas escolhas.Você já se perguntou o que seu filho fará com a liberdade dele? - Sim,seu filhote tem liberdade.Como podemos pensar que jovens ,educados, a partir de um conceito de liberdade equivocado,e com um modelo social corrupto ,possam ter boa educação. !!! ???

sábado, 28 de abril de 2012

Posso Errar? 
 Por Leila Ferreira
Há pouco tempo fui obrigada a lavar meus cabelos com o xampu “errado”. Foi num hotel, onde cheguei pouco antes de fazer uma palestra e, depois de ver que tinha deixado meu xampu em casa, descobri que não havia farmácia nem shopping num raio de 10 quilômetros . A única opção era usar o dois-em-um (xampu com efeito condicionador) do kit do hotel. Opção? Maneira de dizer. Meus cabelos, superoleosos, grudam só de ouvir a palavra “condicionador”. Mas fui em frente.

Apliquei o produto cautelosamente, enxaguei, fiz a escova de praxe e... surpresa! Os cabelos ficaram soltos e brilhantes — tudo aquilo que meus nove vidros de xampu “certo” que deixei em casa costumam prometer para nem sempre cumprir. Foi aí que me dei conta do quanto a gente se esforça para fazer a coisa certa, comprar o produto certo, usar a roupa certa, dizer a coisa certa — e a pergunta que não quer calar é: certa pra quem? Ou: certa por quê? O homem certo, por exemplo: existe ficção maior do que essa? Minha amiga se casou com um exemplar da espécie depois de namorá-lo sete anos. Levou um mês para descobrir que estava com o marido errado. Ele foi “certo” até colocar a aliança. O que faz surgir outra pergunta: certo até quando? Porque o certo de hoje pode se transformar no equívoco monumental de amanhã. Ou o contrário: existem homens que chegam com aquele jeito de “nada a ver”, vão ficando e, quando você se assusta, está casada — e feliz — com um deles.

E as roupas? Quantos sábados você já passou num shopping procurando o vestido certo e os sapatos certos para aquele casamento chiquérrimo e, na hora de sair para a festa, você se olha no espelho e tem a sensação de que está tudo errado? As vendedoras juraram que era a escolha perfeita, mas talvez você se sentisse melhor com uma dose menor de perfeição. Eu mesma já fui para várias festas me sentindo fantasiada. Estava com a roupa “certa”, mas o que eu queria mesmo era ter ficado mais parecida comigo mesma, nem que fosse para “errar”.
Outro dia fui dar uma bronca numa amiga que insiste em fumar, apesar dos problemas de saúde, e ela me respondeu: “Eu sei que está errado, mas a gente tem que fazer alguma coisa errada na vida, senão fica tudo muito sem graça. O que eu queria mesmo era trair meu marido, mas isso eu não tenho coragem. Então eu fumo”. Sem entrar no mérito da questão — da traição ou do cigarro —, concordo que viver é, eventualmente, poder escorregar ou sair do tom. O mundo está cheio de regras, que vão desde nosso guarda-roupa, passando por cosméticos e dietas, até o que vamos dizer na entrevista de emprego, o vinho que devemos pedir no restaurante, o desempenho sexual que nos torna parceiros interessantes, o restaurante que está na moda, o celular que dá "status", a idade que devemos aparentar. Obedecer, ou acertar, sempre é fazer um pacto com o óbvio, renunciar ao inesperado.
O filósofo Mario Sergio Cortella conta que muitas pessoas se surpreendem quando constatam que ele não sabe dirigir e tem sempre alguém que pergunta: “Como assim?! Você não dirige?!”. Com toda a calma, ele responde: “Não, eu não dirijo. Também não boto ovo, não fabrico rádios — tem um punhado de coisas que eu não faço”. Não temos que fazer tudo que esperam que a gente faça nem acertar sempre no que fazemos.

Como diz Sofia, agente de viagens que adora questionar regras: “Não sou obrigada a gostar de comida japonesa, nem a ter manequim 38 e, muito menos, a achar normal uma vida sem carboidratos”. O certo ou o “certo” pode até ser bom. Mas às vezes merecemos aposentar régua e compasso.
 
Leila Ferreira é jornalista, apresentadora de TV e autora do livro "MulheresPor que será que elas..."
 Os expulsos

Martha Medeiros
“Entre o eu e a vida abriu-se um hiato, que faz daquela não mais a sua vida, mas um território onde ele não consegue penetrar e se inserir, um lugar estranho que não lhe pertence e ao qual não se sente pertencer, uma contínua fuga de algo que nunca possuiu e que portanto não é seu, mas do qual sente nostalgia como se o tivesse perdido”

(prólogo do livro Niels Lyhne, do escandinavo Jens Peter Jacobsen, publicado em 1880)

É uma sensação esquisita. É Está tudo bem, nada de grave aconteceu, mas você não está legal. Não aguenta mais o trânsito, palco das maiores grosserias, e o que é pior: flagra a si mesmo praguejando na hora do rush, quando sabe que é preciso ter paciência e sair mais cedo de casa, pois os trajetos estão tomando mais tempo.

Está todo mundo nervoso por razões que não necessariamente o fato de você ter cruzado à frente – você que também vive numa pressa danada. Ainda assim, mesmo com toda a compreensão sobre o assunto, que desânimo.

Lê nos jornais que o metrô está longe de sair do papel e suspira. Tampouco se sente seguro para andar de bicicleta em meio ao caos urbano. E não se atreve a dizer em voz alta (é politicamente incorreto), mas até os pedestres estão abusando da soberania que possuem.

Atiram-se na frente dos carros, longe das faixas, com a empáfia de donos da lei, como se não houvesse leis para eles também.Você já não suporta dar e ouvir tanta opinião, e se choca com os desaforos anônimos que inundam as redes sociais.

Quanto mais se enaltece o bom humor, mais aumenta o número de pobres de espírito , pessoas com uma nuvem negra sobre a cabeça, inquisidores a apontar falhas, criticar, debochar. Todos se julgam aptos a dar lições quase não há mais humildade em aprender. Você sabe que não é melhor do que ninguém, porém gostaria de ser melhor doq eu você esmo, mas como?

São tantos avanços tecnológicos, atualizações de vocabulário, acontecimentos, modismos, tendências, como absorver? O dia de ontem torna-se obsoleto a cada nascer do sol, e essa renovação constante não lhe excita, ao contrário, dá preguiça. Você queria mesmo era se refugiar numa casa de campo ao melhor estilo Zé Rodrix, com seus amigos, seus discos, seus livros e nada mais.

Mas você não faz o tipo ermitão a quem bastaria uma hora para sobreviver. Você gosta de ir ao cinema, viajar, conversar, ainda tem curiosidade sobre o mundo. Só que curiosidade moderada não é suficiente. Não basta ter um interesse médio. É preciso acompanhar tudo. Já nem tento. Será assim mesmo que a velhice anuncia que está chegando?

Preferia pensar que é a sabedoria batendo à porta. Não precisar de tanta gente em volta (“Não sofrer de solidão, e sim de multidão” – Nietzsche), não se cobrar modernidade não se envergonhar de usar ferramentas antigas. Mas nada disso é sábio, dizem os outros. É desistência. Talvez você se sinta como eu. Prestes a ser expulsa da própria vida.
Relaxar  é   Fundamental
 
Dar uma pausa na rotina para fazer o que se gosta é um dos melhores investimentos
para a sua saúde
Não restam dúvidas: se você quer espantar de vez o estresse mental, físico e psicológico, a cultura e o lazer são grandes aliados. Pode ser fazendo até coisas banais, como sair com os amigos para tomar um chimarrão no parque. Está mais do que provado que esses momentos de relax ajudam o cérebro a funcionar melhor. Ou seja: enquanto você se diverte, está ativando áreas cerebrais importantes.

– A massa cinzenta é extremamente plástica – afirma Sidarta Ribeiro, um dos mais influentes neurologistas do país.

Uma pesquisa publicada em 2008 por sete grandes universidades americanas mostrou algo que parecia pouco provável: música e teatro aumentam a capacidade de concentração e geram ganhos tão significativos para a memória que você tem como extrapolar a melhora para outras áreas. Eles observaram que quem treina para tocar um instrumento parece ficar mais habilidoso em geometria e a compreender melhor um texto.

Se você é daqueles que insistem na dobradinha casa-trabalho, trabalho-casa, saiba que está deixando de aprimorar sua inteligência e, ainda, prevenir doenças.

– Um dos caminhos mais indiscutíveis para manter as recordações intactas é ler. A memória mantém-se graças ao uso. E a leitura é uma forma de exercitá-la – garante o neurocientista Ivan Izquierdo.

Saiba, a seguir, quais os benefícios de investir em atividades corriqueiras, como tocar violão, ouvir música, ler um bom livro ou conferir uma estreia no cinema. Motivos não faltam para melhorar, brincando, sua qualidade de vida.

Mas, afinal, o que é lazer?

O sociólogo francês Joffre Dumazedier – pioneiro nos estudos do lazer e da recreação – ficou conhecido ao disseminar seu conceito sobre lazer. Ele afirma que trata-se de um conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode entregar-se de livre vontade, seja para repousar, seja para divertir-se e entreter-se ou, ainda, para participar de forma voluntária de alguma atividade que lhe dê prazer. O conceito só se firmou a partir do século 20, sendo que a ideia só foi incorporada a partir do momento em que o modelo capitalista de produção percebeu que o trabalho podia ser aliado ao prazer.

A liberdade é outro grande ganho para quem dedica algumas horas para relaxar. A psiquiatra Eneida Kompinsky comenta que o lazer passa por uma ausência de obrigações – a pessoa escolhe o que quer fazer – e também criatividade para encontrar alternativas para aproveitar o tempo livre, inclusive, sem gastar muito dinheiro.
O fio da memória
DIANA CORSO*

Graças a sua coleção de fantoches, Policho era uma lenda na minha infância. Nas estantes de sua casa, dezenas de figuras caricaturais e mágicas ficavam longe do meu alcance, só os olhos podiam tocá-las. Não eram brinquedos, eram atores, apenas estavam repousando. Seu dono era um “bonequeiro”, fazia teatro de fantoches: em suas mãos eles falavam, dançavam, brigavam muito e arrancavam gritos e risadas da plateia. Fantoches são exagerados.

Atrás do artista havia um homem politizado, ativista em tempos pouco propícios para isso no Uruguai, onde vivíamos. Por isso foi preso e barbaramente torturado. Entre seus crimes estava o fato de ser filho de um importante educador cubano e pai de dois jovens considerados perigosos, como se tornaram os jovens naquele então. Na cela após a jornada de suplícios, ocorreu-lhe uma avassaladora amnésia. Na determinação de calar, já não lembrava quem era: saber-se era perigoso. Fruto do esforço de evocar, veio-lhe à mente o pedacinho de uma história que ele passou a contar a si mesmo. Infelizmente não sei qual era, se conto, lenda ou romance, e não há como lhe perguntar, ele já partiu. Dia após dia, a trama crescia. Scherazade de si mesmo, foi atiçando a própria curiosidade e sobrevivendo à miséria da desesperança. Quando a narrativa se completou em sua cabeça foi como se tivesse atravessado um portal. Ela era a chave: toda sua memória voltou, com ela a identidade e a força para suportar a dor.

A evocação que o livrou da amnésia, podia ter sido de uma lembrança de infância, da família, uma música, o número da carteira de identidade ou endereço, elementos da realidade pessoal que ele procurava resgatar. Mas o que voltou foi uma história. É o mesmo caminho traçado por Umberto Eco em seu livro A Misteriosa Chama da Rainha Loana, no qual um homem recupera a memória perdida visitando o porão da casa que fora do avô, onde ficara sua antiga coleção de gibis. Reencontrar-se com histórias de que gostava foi o método para encontrar a própria identidade porque nelas ficam guardados sonhos e desejos.

São nossas divagações fantasiosas, enfeixadas em histórias que lemos, assistimos ou nos contaram, que melhor nos traduzem e representam: ali está o tesouro da hipotética verdade de cada um. Talvez, se algum dia precisar, eu possa recorrer às histórias que aqueles bonecos quietos na estante me cochicharam, encenadas no palco da imaginação infantil. Eles eram só fantoches, mas tinham um amo que certamente sabia que uma boa história é a chave de tudo o que somos.
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* Colunista da ZH
Quem dá nome às coisas?
Tudo que existe no mundo tem um nome. Mas quem são as pessoas que têm a missão de nominá-los? O poeta e filólogo Fernando Beltrán é um dos pioneiros desta profissão, imprescindível e ao mesmo tempo desconhecida
 
Na foto acima, o conselheiro diretor-geral de Amena,
Belarmino García (esquerda), e
o diretor de comunicação, Manuel Bueno (direita).
Amena se transformou em uma marca
conhecida em nível mundial
Laura Serrano-Conde
Da EFE
Todas as coisas têm seu nome. Desde o dia em que nasce o ser humano se esforça para dar nome aos objetos que quer, porque o nome é a referência.
Mas quem é a pessoa encarregada de escolher os nomes dos objetos? O poeta e filólogo Fernando Beltrán (Astúrias, 1956) é um nominador profissional, um ofício imprescindível e apaixonante, mas pouco conhecido das pessoas.
Seu trabalho é "dar nome às coisas". Ele não é publicitário, não é vendedor, nem escolhe a marca de um produto. Ele escolhe uma palavra para nomear algo que até o momento era inominável e o transforma em realidade.
Ele é um nominador, um ofício necessário e apaixonante, e graças ao qual é possível chamar pelo nome hoje a bebida Naranyá, o supermercado Opencor, o zoo Faunia e a cadeia hoteleira Be Live.
"A maioria das pessoas não sabe o que é um nominador. Nós colocamos nomes nas coisas, porque o nome é algo fundamental. Eu sempre digo que uma imagem vale mais do que mil palavras, mas nunca mais do que uma palavra", revela à Agência Efe Beltrán, que acaba de publicar seu livro "El nombre de las cosas", no qual explica em que consiste esta peculiar forma de ganhar a vida.

 Um poeta que perseguiu seu sonho


Fotografia do autor, Fernando Beltrán, cedida pelo Editorial Conecta
Fernando Beltrán soube desde criança que seu destino era ser poeta. Ele sempre foi "um romântico empedernido", e quando completou 18 anos, contra a vontade de seus pais, saiu de casa para construir seu futuro literário.
Ninguém me entendia, mas eu era apaixonado pela poesia. Meu pai era um grande advogado e queria que eu estudasse Direito como ele, mas não segui essa carreira", confessa.
Beltrán se transformou em um poeta e como todo bom poeta, viveu sempre de outra profissão. Foi administrador, livreiro, jornalista, roteirista de cinema e publicitário.
"Experimentei muitas profissões que sabia eram circunstanciais, que quando me viesse a inspiração para escrever ia deixá-las, mas era preciso viver. Quando comecei a trabalhar na agência de publicidade, percebi que as empresas gastavam milhões em anúncios e na imagem do produto, mas o nome era considerado algo secundário", lembra.
E foi assim que em 1989 ele decidiu montar sua própria empresa, "El nombre de las cosas", e inventar um novo ofício.
"Não sou publicitário, não faço desenho gráfico, eu crio nomes. Também não invento marcas, confusão que as pessoas frequentemente fazem. O que eu faço é escolher um nome que depois, com o tipo de letra e a cor, pode chegar a ser uma marca", indica.
"O nome sempre está dentro do nomeado. Eu só tiro o pó e descubro", conta.

Amena, a galinha dos ovos de ouro

Seu começo não foi fácil. Ele trabalhava sozinho e sobrevivia a duras penas com o pouco dinheiro que entrava. Até o dia em que recebeu a oportunidade.
Tudo mudou quando uma conhecida companhia telefônica espanhola, que procurava uma marca para uma nova linha de celulares, contratou uma empresa e esta, por sua vez, terceirizou a criação do nome para ele. Após muitas horas de trabalho e várias folhas gastas, nasceu Amena (agora a Orange), o nome que o catapultou ao ponto mais alto.
"Foi uma explosão. Escolhi porque era uma palavra diferente, agradável, quente e feminina. Cobrei uma miséria por esse trabalho, nem digo quanto porque me dá vergonha, mas isso abriu as portas para novos clientes e desde então não pararam de chover novos contratos", afirma.
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Fonte: http://noticias.br.msn.com/

Os seus segredos estão por um fio

EUGÊNIO BUCCI*
Aliás, nem mesmo por um fio eles estão. Eles escapam de qualquer jeito, vazam pelas redes que não têm fio nenhum, essas a que aprendemos a chamar de wireless. Os seus segredos, prezado leitor, voam soltos pelo ar. E pelo vácuo.
Não conte para ninguém, mas, se ainda acredita que pode resguardar sua valiosa privacidade, bem, é melhor que você fique sabendo de um segredo terrível: a intimidade de cada um de nós já é quase de domínio público. Não olhe agora, mas estão vigiando você, assim como espionam todo tipo de gente, em todas as partes do mundo. Você quer exemplos? Lá vão três:
1. O vetusto Times de Londres acaba de ser processado sob a acusação de ter violado a conta de e-mail de Richard Horton, um policial que mantinha um blog anônimo, que assinava apenas com o pseudônimo de NightJack. Segundo o processo, que corre desde a semana passada, um repórter do Times, em 2009, invadiu ilegalmente a correspondência eletrônica de Horton e, por meio desse crime, descobriu e revelou indevidamente a identidade do blogueiro. Nas páginas do respeitável Times. Como a ação ainda não foi julgada, é cedo para saber se a Justiça britânica dará ou não dará razão a Horton. Mas não é prematuro dizer que esse processo vem complicar um pouco mais a situação do dono do jornal, o magnata Ruppert Murdoch. A imagem de Murdoch já tinha sido destroçada em 2011, no bojo de outro escândalo, este envolvendo o tabloide sensacionalista News of the World, também de sua propriedade. Ficou demonstrado que o News of the World mandara grampear ilegalmente nada menos que 4 mil correios de voz de celulares. O vexame obrigou Murdoch a fechar as portas do tabloide. Foi um trauma, tanto para Murdoch quanto para qualquer um que acreditasse na inviolabilidade de sua vida íntima. Agora, o rastro de vergonha se aproxima da reputação do Times. Pior para todo mundo.
1. O vetusto Times de Londres acaba de ser processado sob a acu
2. Assim como os jornalistas sem escrúpulos, os arapongas sem limites também devassam a rotina de quem quer que seja, às vezes a serviço de cônjuges desconfiados, outras vezes sob as ordens de governantes autoconfiantes demais. Seja em Londres, seja em São Paulo, seja no Distrito Federal. O rentável negócio da futrica está cada dia mais fácil, graças à falta de caráter e ao excesso de novíssimas traquitanas tecnológicas.
3. A toda hora, pipocam debates sobre como os dois gigantes da internet, o Google e o Facebook, armazenam dados pessoais de seus clientes para depois usá-los em proveito dos anunciantes. Agora mesmo, em meados de abril, o senador americano Al Franken, democrata de Minnesota, encarregado de uma investigação sobre a privacidade dos cidadãos, afirmou que os modelos de negócios das duas empresas são inteiramente baseados na venda dos dados dos usuários. E arrematou: “Você não é cliente dessas companhias; você é o produto que elas vendem”. Claro que o Google se defende com bons argumentos, bem como o Facebook. Este, por sinal, prometeu, há pouco mais de uma semana, que vai informar seus usuários, em detalhes, sobre os dados que coleta a respeito de cada um deles. Veremos.
Não vamos aqui prejulgar o Google, o Facebook, o Times. Eles têm direito de se explicar e talvez não tenham culpa de nada. Não prejulguemos nem mesmo os arapongas, que agem no escuro, feito ratos. Até eles têm direito de defesa. Isto posto, não lutemos mais contra o óbvio: a intimidade não é mais tão íntima como era no passado.
Não lutemos mais contra o óbvio: a intimidade não é mais tão íntima quanto no passado .
Atualmente, escancarar o que antes acontecia entre quatro paredes virou uma febre coletiva, esporte planetário, tanto nos reality shows quanto nas redes sociais. Mas a coisa não ficou só nisso. No embalo da cultura exibicionista, as empresas e os governos desenvolveram técnicas dissimuladas para capturar informações minuciosas sobre o público para ganhar dinheiro – e voto – com elas. Sim, a plateia se embriaga em devassar a devassidão. É o que ela deseja. Mas o poder (econômico ou político) foi além desse desejo e começou a faturar em cima.
Parece uma bobagem desimportante, mas não é. Uma das bases da democracia pode estar ameaçada. O que está se dissolvendo, pelos fios e pelo ar, é o direito à privacidade. Fiquemos atentos. Nas ditaduras, a privacidade não existe – e o Estado é perfeitamente opaco. Mas, na democracia, o Estado tem a transparência como dever – e a vida íntima dos cidadãos é protegida por lei. É por isso que o voto é secreto. Alguma coisa está fora de lugar quando nossa intimidade vai assim, como tem ido, para o espaço.
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* É jornalista e professor da ECA-SP
                                                           CLÁUDIA LAITANO
                             Igualdade &  diferenças
Há um desconforto incontornável com relação à política de cotas raciais nas universidades. Por um lado, as cotas obrigam o Brasil a admitir o apartheid soft que vigora em instituições universitárias (dou um doce para quem se formou na UFRGS com, digamos, 10% de colegas negros na turma). Por outro, as cotas são, em essência, uma confissão de fracasso: não conseguimos resolver nossos problemas de outro jeito, então vai como dá. Meritocracia é para quem pode.

Uma solução bem menos polêmica, mas muito mais complicada, seria corrigir as injustiças quando elas começam: na barriga da mãe (durante o pré-natal), na creche (quando ela é oferecida) ou na alfabetização, já que saúde e educação são, em tese, direitos garantidos pela Constituição. Às vezes, quando prendem um gênio do tráfico que montou uma complexa rede de negócios aos 17 ou 18 anos, fico pensando que a derrota nesses casos é dupla: ganhamos um criminoso, desperdiçamos um moleque empreendedor.

Imagine um país em que os alunos com mais talento para o estudo pudessem ser identificados e valorizados desde cedo, onde quer que estivessem. Na Alemanha, uma sociedade muito mais homogênea do que a nossa, as diferenças entre os alunos são levadas em conta na hora de encaminhá-los para a vida acadêmica. Quando termina o primário, a criança começa a definir a sua orientação profissional conforme o desempenho dos primeiros anos.

Há três opções: a Hauptschule, em que os alunos são preparados para o ensino profissionalizante, a Realschule, que habilita a frequentar cursos superiores, e o Gymnasium, que propicia uma base mais avançada para a vida acadêmica. Há ricos e pobres em todos os níveis, em princípio (embora lá, como aqui, ricos tenham muito mais chances de driblar a falta de talento para os estudos do que os pobres).

O que o sistema alemão explicita é que há diferenças na aprendizagem, como em todas as habilidades humanas: há os com talento para ganhar dinheiro, há os que sabem lidar com pessoas, há os que são bons nos esportes, há os que vão revolucionar a física nuclear – e nem todos precisam estudar no mesmo lugar.

Vai bem o país que consegue oferecer as condições para que cada criança possa ser encaminhada a desenvolver (e identificar) seu potencial da melhor forma possível, independentemente de cor ou classe social.

Bom, esse é o sonho. Mas como é que a gente diz para um guri de 18 anos para esperar um pouquinho porque, quem sabe, daqui a 50 anos, se tudo mudar radicalmente agora, seu neto estará indo para a universidade por méritos próprios porque teve um ótimo ensino básico?

A melhor universidade brasileira, a USP, não está nem entre as 150 melhores do mundo. O país com mais universidades nesse ranking, os EUA, pratica ações afirmativas desde os anos 70. O Ensino Superior no Brasil é fraco e injusto há muito tempo (ou é justo a classe média estudar de graça e o pobre pagar?), e a culpa não é das cotas.
ANTONIO AUGUSTO FAGUNDES
                                        O Amigo

Para o Andre Serpa Teixeira, o “Sacola”


O amigo é um irmão que eu escolhi.
Não me foi dado por meu pai e minha mãe.
Aqueles que eles me deram
São meus irmãos, claro,
Irmãos de sangue de família,
Que eu amo tanto e que também me amam.
Mas eu não os escolhi
– Foi Deus.

O amigo que eu falo foi escolha minha,
Da Vida, feita de sonhos e de esperanças,
De vitórias e de fracassos.
Em todas as horas boas da minha vida
O amigo estava lá
E rimos junto banhados pelo sol das alegrias
E nas horas más
Choramos junto um no ombro do outro.

Como foi que nos tornamos amigos?
Não sei.
Um dia nossos caminhos se encontraram
E o que era para ser uma cruz
Traçada no chão
Se transformou em duas paralelas
Que avançam para o Infinito.
A amizade é uma forma de amor.

quarta-feira, 25 de abril de 2012


JOSÉ PASTORE*

A depressão de 1929 teve efeitos devastadores nos Estados Unidos. Da noite para o dia boa parte da riqueza virou pó. A produção industrial caiu 50% e o comércio internacional encolheu 70%. Mais de cinco mil bancos faliram. Agravadas por uma impiedosa seca, as safras fracassaram por completo. O desemprego disparou, chegando à casa dos 25%.


Para dar uma ocupação a milhões de pessoas que estavam sem ter o que fazer, o governo americano, em meio de tantos cortes nos orçamentos, decidiu expandir as bibliotecas públicas para ali acomodar os que estavam desempregados. Assim foi feito. Os acervos aumentaram, os espaços e os horários de funcionamento se ampliaram. Surgiram nessa época as bibliotecas circulantes para atender os leitores das pequenas cidades e da zona rural.

Qual foi a consequência daquela iniciativa? Importantíssima. Durante quase dez anos, milhões de desempregados se ocuparam com a leitura. O resultado foi o previsível: no meio de tantos desastres, o país enriqueceu o seu mais precioso ativo - o capital humano - e com isso enfrentou os desafios da retomada do crescimento.

A história está repleta de exemplos desse tipo. O Plano Marshall teve sucesso na Europa porque, mesmo durante a guerra, a educação foi preservada. Muitas escolas funcionaram até mesmo em dias de bombardeio.

Depois da terrível devastação nuclear de Hiroshima e Nagasaki (agosto de 1945), o Japão se levantou com base no bom preparo da sua gente. A Coreia do Sul ressurgiu das cinzas após o conflito dos anos 50 e renasceu novamente depois da crise de 1998 - nos dois casos, com base na educação do seu povo.

Li com muita atenção a matéria da revista The Economist (10/3/2012) que revelou uma interessante recorrência nos Estados Unidos: neste ano de 2012, no meio da recessão que ainda assola aquele país, 60% dos americanos de 16 a 24 anos - um recorde histórico! - estão matriculados nas universidades americanas. Mais fantástico é verificar que, entre 2005 e 2011, as bolsas de estudo passaram de 5,5 milhões para 9,6 milhões. O crédito para pagar as matrículas também aumentou de forma expressiva.

Nos Estados Unidos, 50% dos jovens entre 18 e 19 anos estão matriculados nas universidades. E mais: 16% dos que têm mais de 35 anos estudam em escolas de nível superior, ainda que em tempo parcial.

Como se vê, no momento em que faltam empregos, os jovens decidiram sentar nos bancos escolares. Tudo indica que a história vai se repetir. Os Estados Unidos sairão da recessão atual com mais capital humano. Tenho dúvidas de que isso venha a acontecer com os países mais afetados pela crise na Europa (Portugal, Espanha, Itália, França e Grécia), que estão cortando fundos dos orçamentos da educação.

No Brasil, por sua vez, estamos desperdiçando a oportunidade dos bons ventos da economia. Sim, porque, mesmo com todos os incentivos do Pro-Uni, menos de 15% dos jovens cursam as escolas de nível superior. A taxa média de evasão é de 22% e, nas escolas particulares, onde está a maioria dos alunos, chega a 26%. Nessas escolas, a ociosidade atinge 52% das vagas existentes.

Esse quadro precisa mudar não apenas no aspecto quantitativo, mas, sobretudo, no qualitativo. A julgar pelo desempenho dos estudantes nas provas de avaliação, verifica-se que a qualidade do ensino da grande maioria de nossas faculdades está fortemente comprometida pelo conluio entre escolas que fingem que ensinam e alunos que fingem que aprendem. Uma farsa.

A melhoria da educação, além dos visíveis impactos nos campos da cidadania e da democracia, é crucial para elevar a produtividade do trabalho e a competitividade das empresas e da economia como um todo. Para os trabalhadores, é essencial para a elevação da renda e o progresso na carreira. No mundo competitivo, sem educação, não há salvação.
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*José Pastore é professor da FEA-USP, membro da Academia Paulista de Letras e presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomércio de São Paulo. Artigo publicado no jornal O Estado de São Paulo de hoje (24).
Digo que só consulto a internet duas vezes por dia -ao acordar e ao deitar. Questão de higiene -mental


Há um novo crime na praça. E eu sou culpado aos olhos de amigos, colegas, até leitores. Não respondo a e-mails de imediato. Só passados alguns minutos -ou algumas horas.
Defendo-me como posso. Digo, a sério, que só consulto a internet duas vezes por dia -ao acordar e ao deitar. Questão de higiene -mental. Curiosamente, quase sempre estou a escovar os dentes.
Ninguém acredita. E, quem acredita, diz que isso não é desculpa: existem uns celulares que recebem e-mails em tempo real e permitem respostas em tempo real.
Agradeço a informação, mas não era preciso: eu próprio já recebi e-mails do gênero, que terminam com a declaração solene "esta mensagem foi enviada por iPhone".
Nunca sei que responder: mostrar-me abismado com a proeza e aplaudir a grande honra que o sujeito me concedeu?
Às vezes, há situações bizarras. Alguém envia um e-mail. Minutos depois, envia outro, só para perguntar se eu recebi o primeiro. Duas ou três horas depois, vem mais um -dessa vez, uma repetição do inicial, para o caso de eu não ter lido.
Essa comunicação unilateral termina com um quarto ou um quinto, em que sou acusado das maiores baixezas (indiferença, preguiça, hostilidade etc.).
Em poucas horas, alguém iniciou e terminou uma comunicação comigo sem que eu jamais estivesse presente para dizer "presente!". Que se passa com o mundo?
Os especialistas no assunto, psicólogos e sociólogos que pesquisam os paradoxos da internet, afirmam que estamos cada vez mais ligados e exigimos respostas cada vez mais rápidas uns dos outros. Certo, especialistas do óbvio, certíssimo.
A questão, porém, deve ser outra: que tipo de gente a internet está a produzir no século 21?
Foi precisamente essa pergunta que o escritor Stephen Marche formulou em artigo para a revista "The Atlantic" ("Is Facebook Making Us Lonely?"). As conclusões não são otimistas: estamos todos ligados, mas essa sensação de contato permanente não significa que o nosso isolamento (e a nossa solidão) decresceu.
O Facebook é, inevitavelmente, um caso clássico: que significa esse imenso continente virtual onde "existem" 845 milhões de pessoas, onde se publicam bilhões de comentários diários e onde se postam 750 milhões de fotos por semana?
Stephen Marche não faz parte dos luditas modernos para quem o Facebook é a "bête noir" da civilização ocidental. A resposta dele, depois de ler os últimos estudos sobre o fenômeno, é de uma sensatez que arrepia: a internet é um meio, não um fim. O que somos como seres sociais depende da forma como usamos as redes sociais.
Que o mesmo é dizer: quem usa o Facebook para substituir a realidade não aumenta o seu "capital social". Pelo contrário, pode mesmo sentir o isolamento típico de um peixe que contempla o mundo através do vidro do aquário. Paralisante. Angustiante.
No artigo, o autor cita um neurocientista da Universidade de Chicago, John Cacioppo, que oferece uma metáfora ainda melhor: podemos usar o carro para ir ao encontro de amigos; ou podemos dirigir sozinhos pelas ruas da cidade. O mesmo carro, duas atitudes distintas.
A internet, e as redes sociais que ela comporta, é apenas um instrumento para, não um substituto de. O desafio, leitor, não está em quebrar o aquário. Está em sair dele de vez em quando.
Sair. Desligar. Não estar disponível. Ou, como escreve Stephen Marche, "termos a oportunidade de nos esquecermos de nós próprios".
Eis, no fundo, a observação mais luminosa do ensaio: a nossa constante disponibilidade para os outros é apenas uma manifestação mais profunda do nosso insuportável narcisismo. E o narcisismo, como sempre, nasce de uma insegurança que procuramos preencher com o culto doentio do ego.
Pensamos que somos tão imprescindíveis que temos de estar presentes 24 horas por dia na vida alheia. E vice-versa: pensamos que somos tão importantes que os outros têm de estar permanentemente disponíveis para nós.
Lamento, amigos. Lamento, colegas. Lamento, leitor. Os meus silêncios não têm nada de pessoal. Nem eu nem você somos assim tão importantes.

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* Colunista da Folha
jpcoutinho@folha.com.br
Fonte: Folha on line, 24/04/2012