terça-feira, 31 de maio de 2016

" Por Mais RIGOR da JUSTIÇA " *** continuam acovardados... ???




 RICARDO NOBLAT

O GLOBO - 30/04


Sejamos francos: políticos com medo de serem presos conspiraram, sim, para derrubar a presidente Dilma. Um governo fraco, autor de graves erros, daria vez a um governo de "salvação nacional" encabeçado pelo vice Michel Temer, capaz de tirar o país do atoleiro econômico. E assim, suspeitos ou acusados de corrupção poderiam salvar-se mediante um acordo que freasse o avanço da Lava-Jato. Que tal?

NADA DE estranho. Nem mesmo de absurdo. Os donos do poder, fossem eles políticos ou não, sempre souberam construir acordos e preservar a própria pele em detrimento da moral e da Justiça. Por extensão, também suas fortunas e posições na hierarquia social. A história do país está repleta de exemplos. E magistrados jamais foram insensíveis a tais acordos. Pelo contrário.

É DISSO, EM resumo, que dão notícia as gravações de Sérgio "Lobo de Wall Street" Machado, presidente da Transpetro nos últimos 12 anos e bem-sucedido caixa oculto para enriquecimento dos caciques do PMDB e financiamento de suas campanhas eleitorais. Apetrechado com equipamentos de escuta e monitorado por agentes federais a pouca distância, Machado foi à luta e saiu laureado.

NO PERÍODO DE uma semana, a divulgação das gravações atingiu três vistosos alvos - os senadores Romero Jucá (RR) e Renan Calheiros (AL), e o presidente de honra do PMDB José Sarney (MA), ex-presidente da República. Jucá perdeu o Ministério do Planejamento. Renan, a vergonha, se vestígio dela ainda lhe restasse. Sarney arranjou um triste fecho para sua biografia.

O BRASIL VIVE "sob a ditadura" da Justiça, reclamou Sarney. Que aconselhou Machado a não meter advogados em tratativas para escapar da Lava-Jato. Sarney tinha outro plano: acionar o ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Cesar Asfor Rocha, amigo de Teori Zavascki, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). Quem sabe Teori não ajudaria Machado?

A ASFOR ROCHA, Renan preferia o advogado Eduardo Ferrão, também amigo de Teori. Sarney e Renan garantiram a Machado todo o empenho para que seu caso não "descesse" à República de Curitiba, chamada de "Torre de Londres" por Jucá. "É preciso estancar a sangria", advertiu Jucá. E "a moça" imaculada (Dilma) carecia de forças para a tarefa. Temer teria certamente.

É MAIS CORRETO dizer que Dilma "carecia de forças" para socorrer políticos em apuros do que de vontade. A Procuradoria-Geral da República quer investigá-la pela nomeação de um ministro sob o compromisso de votar a favor da libertação de empreiteiros presos pela Lava-Jato. Segundo Sarney, a imaculada Dilma pediu à Odebrecht que pagasse no exterior despesa de sua campanha.

POR QUE EM tantos diálogos gravados ou reproduzidos, políticos sugerem dispor de livre trânsito entre ministros de tribunais superiores? Alguns por fanfarronice. Outros porque têm de fato. Não há julgamento puramente técnico. São homens e mulheres que julgam. E por mais que persigam um estado de isenção plena - e nem todos perseguem -, jamais o alcançam.

O STF MANDOU para a cadeia 25 dos acusados pelo escândalo do mensalão do PT, mas recusou-se a investigar a fundo a responsabilidade de Lula no episódio. Desta vez, tudo indica que será mais rigoroso com os réus da roubalheira na Petrobras, sem condescendência com nenhum, seja por distração ou - muito pior - conivência. É o que se espera dele.

" O Legado e a Farsa "

DENIS LERRER ROSENFIELD

O ESTADÃO - 30/05

O novo governo Temer começou, definitivamente, sob o signo do rompimento com a sua predecessora em duas áreas importantes: a econômica e a de Relações Exteriores. O embuste no qual vivia o país foi revelado mediante medidas corajosas que sinalizam um novo rumo para o país.


A nova equipe econômica, sob a batuta do ministro Henrique Meirelles, partiu do reconhecimento do rombo deixado pelo governo anterior, calculando, agora, um déficit de R$ 170,5 bilhões. A veracidade no tratamento das contas públicas e a transparência dos cálculos são condições de toda sociedade moderna.

Já não era mais possível seguir convivendo com a “contabilidade criativa” e a ficção de números sem cessar revistos e de pouca credibilidade. Estávamos nos tornando, neste aspecto, a Argentina dos Kirchner. Felizmente, também lá o novo presidente Macri rompeu com essa aberração.

O novo presidente mostrou a sua força no Congresso com a aprovação esmagadora das novas medidas, sinalizando com condições de governabilidade inexistentes sob o governo anterior. Estabeleceu-se uma relação de coordenação e harmonia entre os Poderes, e não de confronto.

É bem verdade que não se trata de um mar de rosas, pois as relações fisiológicas continuam imperando, mas se trata agora, neste primeiro momento, de um dado da realidade. Não se muda um país da noite para o dia e as prioridades são as reformas fiscal, previdenciária e trabalhista. Cada uma no seu momento. O Brasil precisa urgentemente se modernizar. Disto depende o seu futuro.

Não é pouca coisa o reconhecimento do rombo deixado pelo governo Dilma. A solução de problemas passa necessariamente por um diagnóstico correto. Não se cura uma doença se não se sabe o que aflige o paciente. A ex-presidente vivia no mundo dela, tão mais dissociado da realidade que a propaganda eleitoral em seu último pleito trazia números e “realidades” nos quais nem o seu partido veio a acreditar.

E, mesmo depois disto, foi incapaz de reconhecer os seus erros e pedir perdão à nação. Perseverou em seus equívocos e foi obrigada a se retirar. Note-se, ainda, que as ditas pedaladas fiscais não deixam de ser amostras do mundo ficcional no qual habitava, procurando, nele, manipular a realidade.

Outra saída da ficção dilmista/lulista/petista foi o estabelecimento de um teto para os gastos públicos, criando condições para uma desvinculação orçamentária que atingirá áreas como Saúde, Educação e Previdência. Não é mais possível continuar com a irresponsabilidade no tratamento da coisa pública, aumentando desenfreadamente gastos sem as correspondentes receitas. Trata-se de receita certa para o desastre, o que terminou acontecendo.

Os representantes da ficção, contudo, já estão alardeando que se trata de medidas “liberais” que atentam contra os “direitos sociais”, como se não fossem eles que tivessem produzido 12 milhões de desempregados, o número podendo logo atingir 14 milhões, arruinado a saúde e piorado significativamente a educação, com o pendor, inclusive, de ideologizá-la.

As Relações Exteriores, sob a liderança do novo ministro José Serra, sofreram uma guinada logo nos primeiros dias. O Itamaraty tinha se alinhado à escória latino-americana e africana. Os laços privilegiados com a África, em nome da “solidariedade”, privilegiaram ditadores sanguinários que se perpetuam há décadas no poder. Dívidas foram perdoadas em nome dos seus povos, quando, na verdade, equivaleram simplesmente a uma transferência maior de recursos roubados para as contas desses tiranos na França, Suíça e Reino Unido. Lula e o PT se regozijaram; os povos desses países continuaram na opressão.

Os laços “especiais” com os países bolivarianos são outra herança maldita dos governos petistas, que o novo ministro teve o cuidado inicial de romper. Os governos anteriores foram coniventes com diferentes atentados à democracia perpetuados nesses países. A Venezuela é um exemplo de até onde foram os liberticidas, reduzindo seus povos à miséria, em nome, precisamente dos “pobres” e dos “direitos sociais”. Pisotearam as liberdades, produtos básicos escasseiam nas prateleiras de supermercados, a inflação corrói os salários e, pasmem!, são saudados pela esquerda brasileira. Em bom momento, o ministro Serra deu um basta a isto, não mais atrelando o país a esses que são atualmente desesperados!

Cabe, por último, uma observação relativa à distinção entre esquerda e direita. Na verdade, ser de direita significa saber fazer contas, não gastar mais do que ganha. Uma pessoa de “direita” sabe calcular a relação entre receita e despesa, devendo, necessariamente, responsabilizar-se por tudo o que faz. Neste sentido, pode-se dizer que à ideia de direita correspondem o cálculo entre receita e despesa e a responsabilidade correspondente. Nada muito diferente do que faz um(a) chefe de família quando contabiliza o que pode gastar cada mês em função dos seus proventos. No trato da família, toda pessoa, saiba ou não, é de direita. Se não o fizer, pode produzir um desastre familiar.

Consequentemente, ser de esquerda, e isto o PT mostrou com clareza meridiana no exercício do poder, significa não saber fazer cálculo, achando que o melhor dos mundos pode se produzir com gastos sem limites, como se orçamentos realistas fossem uma coisa de “liberais”. Algo que poderia ser simplesmente menosprezado. Ser de esquerda significa, então, ser irresponsável no tratamento da coisa pública. Pior ainda, os que assumem tais posições, quando confrontados ao seu inevitável fracasso, transferem essa responsabilidade aos outros, os “liberais”, a “direita”, como se não tivessem nada a ver com os resultados de suas ações.

Entende-se, assim, melhor os que se intitulam “progressistas”, pois isto significa, para eles, conservarem o que há de mais nefasto no tratamento irresponsável da coisa pública. Almejam que a roda da história ande para trás. Vivem em uma ficção ideológica que é nada mais do que uma farsa.



" Muito Cacique "

 EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADÃO  - 30/05




Juntos, os Três Poderes da União têm mais de 1,12 milhão de servidores. Desse total, 30,93% exercem cargo comissionado ou função de confiança, indica recente relatório do Tribunal de Contas da União (TCU). Trata-se de um índice muito alto de discricionariedade no preenchimento das funções públicas, incompatível com a Constituição Federal, que obriga o poder público a fazer valer, entre outros, os princípios da eficiência e da impessoalidade.

O objetivo do estudo do TCU foi “identificar e avaliar riscos relativos às funções de confiança e aos cargos em comissão, assim como dar transparência acerca dos quantitativos, atribuições, requisitos de acesso e outras informações relevantes sobre o tema”. Trata-se de tema relevante, quer seja pelo histórico de um poder público inchado, com muita gente vivendo à custa do Estado, quer seja pelos 13 anos de lulopetismo, nos quais houve um deliberado aumento do número de nomeações, com o objetivo claro de aparelhar o Estado.

O estudo do TCU lembra que as funções de confiança devem ser exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo. Já os cargos em comissão – ou comissionados – são de livre nomeação e exoneração, ainda que a Constituição Federal exija a definição de porcentuais mínimos de servidores de carreira nesses postos. Com dados de julho e agosto de 2015, o levantamento analisou 278 organizações dos Três Poderes da União.

No Poder Executivo há 963.172 servidores ativos, com 33.581 cargos comissionados (3,4%) e 221.646 funcionários em funções de confiança (23%). Já o Poder Legislativo tem o maior porcentual de servidores em cargos em comissão. Para um total de 24.174 servidores, há 15.453 cargos comissionados (63,9%) e 3.743 servidores em funções de confiança (15,4%).

O Poder Judiciário, com seus 115.760 servidores, tem os maiores índices de pessoas em funções de confiança. São 55.964 (48,3%) servidores nessa situação, além de 8.525 cargos comissionados (7,3%). No Poder Judiciário é minoria quem não tem um cargo em comissão ou uma função de confiança. Tem mais cacique do que índio. Semelhante distorção foi encontrada em 65 dos 278 órgãos analisados pelo TCU.

O estudo analisou nove possíveis riscos relativos ao processo de escolha de funcionários comissionados. São eles: investidura de pessoas sem as necessárias competências, aumento de gastos com pessoal, conflito entre o interesse público e os interesses da pessoa indicada, cargos comissionados cujas atribuições não são de direção, chefia ou assessoramento, descumprimento dos porcentuais mínimos de servidores de carreira em cargos em comissão, perda de experiência em razão da transitoriedade dos cargos comissionados, não utilização de bancos de talentos ou fontes institucionais para seleção de candidatos, nepotismo e nomeação de pessoas impedidas por lei de assumir essas funções.

Esses riscos não são elucubrações – são bem reais. Ninguém nega que o bom funcionamento do poder público exija a previsão de cargos comissionados. Mas isso está longe de significar que um terço dos servidores tenha cargo comissionado ou exerça função de confiança. Além dos gastos que tais nomeações acarretam, é difícil vislumbrar eficiência num sistema tão maciçamente preenchido por escolhas pessoais, que, segundo a Constituição, devem ser exceções.

O problema não é, porém, apenas a questão da imensa quantidade desses cargos, cujo número certamente precisa ser reduzido. Como lembra o TCU, a discricionariedade envolvida na investidura de um cargo de livre nomeação e exoneração também deve se submeter ao princípio da eficiência. A livre nomeação não significa diminuição ou exclusão da exigência. Seja qual for o cargo, “os servidores públicos devem agir com qualidade, presteza e eficácia”. Aqui também está um urgente desafio.

" A Justiça e os DECAÍDOS "

 SÉRGIO FERNANDO MORO

     O Estado de S. Paulo - 31/05

Tommaso Buscetta é provavelmente o mais notório criminoso que, preso, resolveu colaborar com a Justiça. Um detalhe muitas vezes esquecido é que ele foi preso no Brasil, onde havia se refugiado após mais uma das famosas guerras mafiosas na Sicília. No Brasil, continuou a desenvolver suas atividades criminosas por meio do tráfico de drogas para a Europa. Por seu poder no Novo e no Velho Mundo, era chamado de “o senhor de dois mundos”.

Após sua extradição para a Itália, o célebre magistrado italiano Giovanni Falcone logrou convencê-lo a se tornar um colaborador da Justiça. Suas revelações foram fundamentais para basear, com provas de corroboração, a acusação e a condenação, pela primeira vez, de chefes da Cosa Nostra siciliana. No famoso maxiprocesso, com sentença prolatada em 16/12/1987, 344 mafiosos foram condenados, entre eles membros da cúpula criminosa e o poderoso chefão Salvatore Riina, que, pela violência de seus métodos, ganhou o apelido de “a besta”. Para ilustrar a importância das informações de Tommaso Buscetta, os magistrados italianos admitiram que, até então, nem sequer conheciam o verdadeiro nome da organização criminosa. Chamavam-na de Máfia, enquanto os próprios criminosos a chamavam, entre si, de Cosa Nostra.

Sammy “Bull” Gravano era o braço direito de John Gotti, chefe da família Gambino, uma das que dominavam o crime organizado em Nova York até os anos 80. Gotti foi processado criminalmente diversas vezes, mas sempre foi absolvido, obtendo, em decorrência, o apelido na imprensa de “Don Teflon”, no sentido de que nenhuma acusação “grudava” nele. Mas, por meio de uma escuta ambiental instalada em seu local de negócios e da colaboração de seu braço direito, foi enfim condenado à prisão perpétua nas Cortes federais norte-americanas, o que levou ao desmantelamento do grupo criminoso que comandava.

Mario Chiesa era um político de médio escalão, responsável pela direção de um instituto público e filantrópico em Milão. Foi preso em flagrante em 17/2/1992, por extorsão de um empresário italiano. Cerca de um mês depois, resolveu confessar e colaborar com o Ministério Público Italiano. Sua prisão e colaboração são o ponto de partida da famosa Operação Mãos Limpas, que revelou, progressivamente, a existência de um esquema de corrupção sistêmica que alimentava, em detrimento dos cofres públicos, a riqueza de agentes públicos e políticos e o financiamento criminoso de partidos políticos na Segunda República italiana.

Nenhum dos três indivíduos foi preso ou processado para se obter confissão ou colaboração. Foram presos porque faziam do crime sua profissão. Tommaso Buscetta foi preso pois era um mafioso e traficante. Gravano, um mafioso e homicida. Chiesa, um agente político envolvido num esquema de corrupção sistêmica em que a prática do crime de corrupção ou de extorsão havia se transformado na regra do jogo. Presos na forma da lei, suas colaborações foram essenciais para o desenvolvimento de casos criminais que alteraram histórias de impunidade dos crimes de poderosos nos seus respectivos países.

Pode-se imaginar como a história seria diferente se não tivessem colaborado ou se, mesmo querendo colaborar, tivessem sido impedidos por uma regra legal que proibisse que criminosos presos na forma da lei pudessem confessar seus crimes e colaborar com a Justiça.

É certo que a sua colaboração interessava aos agentes da lei e à sociedade, vitimada por grupos criminosos organizados. Essa é, aliás, a essência da colaboração premiada. Por vezes, só podem servir como testemunhas de crimes os próprios criminosos, então uma técnica de investigação imemorial é utilizar um criminoso contra seus pares. Como já decidiu a Suprema Corte dos EUA, “a sociedade não pode dar-se ao luxo de jogar fora a prova produzida pelos decaídos, ciumentos e dissidentes daqueles que vivem da violação da lei” (On Lee v. US, 1952).

Mas é igualmente certo que os três criminosos não resolveram colaborar com a Justiça por sincero arrependimento. O que os motivou foi uma estratégia de defesa. Compreenderam que a colaboração era o melhor meio de defesa e que, só por ela lograriam obter da Justiça um tratamento menos severo, poupando-os de longos anos de prisão.

A colaboração premiada deve ser vista por essas duas perspectivas. De um lado, é um importante meio de investigação. Doutro, um meio de defesa para criminosos contra os quais a Justiça reuniu provas categóricas.

Preocupa a proposição de projetos de lei que, sem reflexão, buscam proibir que criminosos presos, cautelar ou definitivamente, possam confessar seus crimes e colaborar com a Justiça. A experiência histórica não recomenda essa vedação, salvo em benefício de organizações criminosas. Não há dúvida de que o êxito da Justiça contra elas depende, em muitos casos, da traição entre criminosos, do rompimento da reprovável regra do silêncio. Além disso, parece muito difícil justificar a consistência de vedação da espécie com a garantia da ampla defesa prevista em nossa Constituição e que constitui uma conquista em qualquer Estado de Direito. Solto, pode confessar e colaborar. Preso, quando a necessidade do direito de defesa é ainda maior, não. Nada mais estranho. Acima de tudo, proposições da espécie parecem fundadas em estereótipos equivocados quanto ao que ocorre na prática, pois muitos criminosos, mesmo em liberdade, decidem, como melhor estratégia da defesa, colaborar, não havendo relação necessária entre prisão e colaboração.

Na Operação Lava Jato, considerando os casos já julgados, é possível afirmar que foi identificado um quadro de corrupção sistêmica, em que o pagamento de propina tornou-se regra na relação entre o público e o privado. No contexto, importante aproveitar a oportunidade das revelações e da consequente indignação popular para iniciar um ciclo virtuoso, com aprovação de leis que incrementem a eficiência da Justiça e a transparência e a integridade dos contratos públicos, como as chamadas Dez Medidas contra a Corrupção apresentadas pelo Ministério Público ou outras a serem apresentadas pelo novo governo. Leis que visem a limitar a ação da Justiça ou restringir o direito de defesa, a fim de atender a interesses especiais, não se enquadram nessa categoria.

                                  *Sérgio Fernando Moro é juiz federal

" O Paradoxo de Temer "

MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 31/05




Mais uma vez o presidente interino, Michel Temer, titubeou para demitir um ministro envolvido em revelações que o inviabilizavam no cargo. O que mais preocupa não é simplesmente a tibieza que Temer vem revelando, que não se esvai com um tapa alegórico na mesa. A razão desse comportamento é que está no centro das atenções.

Ele foi aconselhado a não incluir no Ministério pessoas investigadas nas diversas operações criminais em curso, especialmente a Lava-Jato. Também não deveria acatar sugestões de políticos expostos a essas investigações, muito menos dos presidentes da Câmara (afastado), Eduardo Cunha, e do Senado, Renan Calheiros, ambos com pencas de processos no Supremo Tribunal Federal (STF).

Mas as ligações políticas de longo alcance com toda essa cúpula do PMDB impedem que Temer tenha a independência que o momento exige de um presidente que assumiu o cargo interinamente, devido ao impedimento de uma presidente que, apanhada em desvios fiscais graves, tem, além de tudo, o envolvimento carnal com um partido, o PT, metido em todo tipo de falcatrua.

Curiosamente acontece com Temer o mesmo que com Dilma: o seu entorno está todo contaminado por denúncias de corrupção, com raras exceções, mas as acusações diretas contra ele são ainda tênues. No caso dela, são mais consistentes, até mesmo pelo domínio dos fatos que ela detinha desde que era ministra de Minas e Energia e chefiava o Conselho de Administração da Petrobras. Mas, assim como Dilma está sendo, ele também poderá ser atingido letalmente por delações premiadas ou gravações clandestinas.

Portanto, Temer não tem as mãos livres para agir com desenvoltura neste momento em que depende do apoio do Senado, para confirmar o impedimento definitivo da presidente afastada, e também do Congresso, para aprovar medidas econômicas impopulares, mas decisivas. Por isso ele tem que, ao mesmo tempo em que negocia com políticos, manter a sociedade esperançosa de novos dias, tarefa difícil que às vezes pode ser até mesmo paradoxal.

Nada menos transparente do que a reunião que Fabiano Silveira teve com o presidente do Senado, cuja gravação foi revelada pelo “Fantástico”, da Rede Globo, no domingo. O teor das conversas não deixava dúvidas de que o novo ministro estava orientando seu “chefe” da ocasião a como escapar dos procuradores da Lava-Jato.

Parece pouco provável que ele, como chegou a alegar, não soubesse quem era o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, mas isso é o de menos. O que revelou o grau de comprometimento de Silveira com o presidente do Senado foi a sugestão para que Renan Calheiros não entregasse ao Ministério Público sua defesa detalhada, evitando assim que os procuradores tivessem base para contestá-la e investigá-lo.

Outro ponto crucial das gravações foi o relato do presidente do Senado de conversas que Fabiano Silveira mantivera com membros do MP, com intuito de sondar o que eles teriam contra Renan Calheiros. Isto é, Silveira, que àquela altura era membro do Conselho Nacional de Justiça indicado pelo próprio Renan Calheiros, usava sua posição para obter informações que beneficiassem quem o indicou.

E assim supostamente agiria no Ministério da Transparência, uma pasta fundamental no combate à corrupção, percepção que retira do ministro sua autoridade moral. O presidente Temer tem um duplo desafio pela frente: recuperar a credibilidade da economia e a imagem do Brasil como um país confiável e seguro como ambiente de negócios.

Recuperar a economia requer esforços e fórmulas que estão sendo encaminhadas pela equipe econômica, em conjunto com áreas estratégicas do governo. Já encaminharam medidas de forte impacto positivo. A recuperação da credibilidade — interna e externa — suscita, porém, para além da agenda econômica, a importância da agenda anticorrupção do governo Temer.



E essa agenda tem sustentação não apenas na opinião pública, o que já não seria pouco, mas num conjunto de exigências internacionais de investidores que buscam ambientes transparentes e seguros para negócios. Países corruptos são tidos como refratários aos investidores internacionais e propensos à insegurança jurídica.

" As * jabuticabas - do Sindicalismo "

JOSÉ PASTOREResultado de imagem para desordem e regresso imagens

O ESTADÃO - 31/05

Poucos são os empregados que conhecem a razão de pagar tanto dinheiro aos sindicatos laborais. Quando muito sabem que são descontados em um dia de salário por ano a título da contribuição sindical (imposto sindical). A cobrança é obrigatória para quem é e quem não é filiado ao sindicato. Isso é lei, não há o que reclamar. É uma jabuticaba brasileira.

Para quem ganha R$ 3 mil por mês, por exemplo, são R$ 100 anuais. E a cobrança não para aí, porque os sindicatos recolhem dos empregados, de uma só vez ou em parcelas, valores que chegam a 10% do salário a título de contribuição assistencial ou negocial. No caso em tela, isso dá mais R$ 300 por ano, descontados de forma generalizada, a despeito de decisões judiciais do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior do Trabalho, que limitam essa cobrança aos empregados filiados dos sindicatos e que assim concordarem.

Além dessas duas contribuições, há a associativa – de valores variados, para os filiados dos sindicatos – e a confederativa, que é cobrada para a manutenção do sistema confederativo. São quatro contribuições! Para o empregado que ganha R$ 3 mil por mês, pode-se estimar um dispêndio anual de, no mínimo, R$ 500.

Será que todos os empregados estão de acordo com essas cobranças? Para quem discorda, o primeiro passo é calcular exatamente o quanto de seu salário vai para entidades sindicais, que muitas vezes nem conhecem.

É claro que os sindicatos precisam de dinheiro para formar líderes, promover campanhas salariais, atuar nos poderes públicos e prestar serviços aos seus representados. Sei que muitos fazem tudo isso com rara competência. Mas, como em qualquer outra associação, agremiação ou clube, só deveria pagar quem é filiado ou os que aprovarem o referido pagamento em assembleias democráticas.

As jabuticabas não param aí. Por força de um dispositivo constitucional (artigo 8.°), os sindicatos brasileiros não têm nenhuma obrigação de prestar contas do que gastam aos seus filiados ou representados, nem mesmo ao Poder Público. Você já viu algum balanço anual de sindicato publicado em jornal de grande circulação?

Em nenhuma parte do mundo entidades que recebem recursos públicos estão isentas da responsabilidade de prestar contas aos poderes constituídos e aos seus representados (José Pastore, Reforma sindical: para onde o Brasil quer ir?, São Paulo: Editora LTR, 2003). No Brasil, essa estranha prerrogativa é garantida pela Constituição Federal. Os sindicatos podem fazer o que quiserem com o que arrecadam, até mesmo se engajar em campanhas políticas com apoio a este ou àquele candidato. Você, caro eleitor, alguma vez foi consultado sobre o uso do seu dinheiro para apoiar candidatos ou movimentos sociais?

Nos Estados Unidos, os professores da Califórnia estão neste momento na Suprema Corte pedindo para não pagar contribuições aos sindicatos que usam seus recursos em campanhas políticas que contrariam os seus princípios. Tudo indica que a Corte proibirá a cobrança de professores não sindicalizados.

O Brasil chegou perto de resolver esses problemas quando, em 2003, representantes dos empregados, empregadores e governo, reunidos no Fórum Nacional do Trabalho, firmaram um acordo para eliminar gradualmente a cobrança das contribuições compulsórias, ampliando, no mesmo ritmo, a cobrança de contribuições voluntárias, com a aprovação e controle dos representados. Lula engavetou o histórico acordo que, no fundo, era e é a espinha dorsal da reforma sindical. Sem isso não há como ter no País sindicatos representativos e como fazer valer as regras básicas da democracia.

Sei que o tema é espinhoso. Mas é preciso mudar. 

O Brasil não pode insistir em querer ser o único certo em todo o mundo.

*É professor da Universidade de São Paulo, presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomercio-SP e membro da Academia Paulista de Letras

" Erros e Atrasos "

MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 31/05

Em menos de 20 dias, Temer já tem coleção de erros. O governo Michel Temer já errou demais para o pouco tempo que tem. Criticar a administração Dilma não é o mesmo que avalizar as decisões do presidente em exercício.

 Temer escolheu alguns excelentes quadros para a economia e acertou na direção das primeiras medidas fiscais, mas já coleciona um número impressionante de erros. Mesmo com falhas, é um governo constitucional, como é o da presidente afastada.

Aquestão que se coloca não é a da legitimidade constitucional, mas da qualidade das decisões. Um ministro da transparência nada transparente em relação às conversas com lideranças envolvidas na Lava-Jato é um dos erros. 

O presidente tentou mantê-lo mesmo diante das evidências de que ele tinha explicado ao presidente do Senado como ele deveria esconder informações da Procuradoria-Geral da República. No seu pedido de demissão, Fabiano Silveira diz que “não sabia da presença de Sérgio Machado”. Só se Machado tiver ficado transparente ao ponto da invisibilidade, porque Silveira dialogou com ele. Esse é o segundo ministro que cai. O primeiro foi Romero Jucá, que obviamente daria problema. E deu.

Outro erro foi a escolha do general Sérgio Etchegoyen para ministro-chefe da Secretaria de Segurança Institucional. O general foi aquele que soltou uma nota virulenta contra a Comissão da Verdade por ter colocado seu pai, o general Leo Etchegoyen, na lista dos 377 envolvidos com tortura. 

Mesmo sendo da ativa, quando são limitadas as possibilidades de manifestação política, o general disse que a Comissão da Verdade era “leviana”, porque “estabeleceu a covardia como norma e a perversidade como técnica acusatória” e definiu como “patético" o esforço da Comissão de “reescrever a história”. Não achando suficiente, ele está processando a Comissão da Verdade.

A CNV foi uma iniciativa do Estado brasileiro. É a Nação que precisa se encontrar com a sua História. Expressões como “covardia como norma” e “perversidade como técnica” são boas para definir a tortura que houve no governo militar, e não a tentativa de esclarecer esse crime. É mais uma submissão do poder civil à versão dos militares sobre a ditadura. Temer agora está na estranha situação de ter um dos seus ministros processando o Estado, que criou e manteve a CNV.

O presidente interino, Michel Temer, acha que boas indicações como fez para a Petrobras e o BNDES permitem que ele tenha nomeações políticas para outras estatais. É preciso não ter entendido a lição da Lava-Jato para aceitar indicação política para as empresas do setor elétrico. Lá, houve corrupção, exatamente porque o PMDB e o PT trataram a área como feudo. O governo diz que o critério será o da competência. O ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa foi escolhido dentro dos quadros da Petrobras e tinha fama de competente, mas foi para a diretoria para servir ao PP. O problema é o pedágio que o indicado tem que pagar ao partido que o indica.

Dilma fez uma desordem enorme nas contas públicas. Ao contrário do que ela diz, sua política econômica favoreceu mais os mais ricos, com os enormes subsídios ao capital, muito maiores do que as transferências para os mais pobres. No fim de semana, em entrevista, Dilma disse que nunca recebeu Marcelo Odebrecht no Alvorada, mas a agenda a desmentiu. Disse que ninguém previu a crise econômica, mas ela foi perguntada sobre isso em todas as entrevistas que deu em 2014. Dilma permanece em divórcio com os fatos.

Temer demonstrou que quer organizar a desordem fiscal mesmo sabendo que isso levará anos e que, na melhor das hipóteses, seu período será de 31 meses. Por outro lado, o governo tem dado sinais claros de retrocesso em várias áreas e fez escolhas muito infelizes.

" Ruim com ele, pior sem ele "

 ELIANE CANTANHÊDE


Estado de S. Paulo - 31/0


Perguntar não ofende: qual o objetivo de quem é contra o impeachment de Dilma Rousseff e está queimando pneus em estradas, invadindo prédios da Cultura, gritando “Fora Temer” na parada LGBT, exibindo cartazes no exterior para dizer que “there is a coup in Brazil”? E qual o objetivo de quem é a favor do impeachment, mas torce contra o governo interino de Michel Temer, condena as propostas para combater o rombo das contas públicas e repudia a indispensável reforma da Previdência?

Tanto quem é a favor quanto quem é contra o afastamento de Dilma tem de ter em mente a responsabilidade coletiva com a história e que só há três saídas para um país mergulhado em tantas crises. Fora disso, não há alternativa, a não ser anarquia.

Uma saída é dar uma trégua para Temer governar e a equipe de Henrique Meirelles tentar por a economia em ordem nesses dois anos e meio, para entregar para os eleitores em 2018 um país razoavelmente saneado. Temer não é perfeito e o PMDB tornou-se muito imperfeito, mas ele foi escolhido por Dilma e por Lula e eleito na chapa do mesmo PT que anima os queimadores de pneus, os invasores da Cultura, os que gritam “Fora Temer” e uma turma que mora fora – uns, há tantas décadas, que deveriam estar mais preocupados com o Trump.

Além de habitar o Jaburu, Temer despacha agora no Planalto por força da Constituição, que assim determina: sai um(a) presidente, assume o vice. Não importa se é bonito, feio, gordo, magro, se é Itamar Franco ou se é Michel Temer. Ele está lá, e o Brasil, os brasileiros, a indústria, o comércio e os 11 milhões de desempregados precisam desesperadamente que comece a equilibrar as contas públicas e a fazer a economia andar.

A saída número 2 é a volta de Dilma. Sério mesmo, alguém deseja de fato a volta de Dilma, com sua incapacidade de presidir o País, negociar com o Congresso, ouvir os conselhos do padrinho Lula ou, aliás, ouvir qualquer expert de qualquer área sobre qualquer coisa? No aconchego dos seus lares, na convivência com familiares, amigos e vizinhos e nas conversas com seus travesseiros – e com o próprio Lula –, será que os petistas de raiz querem mesmo a volta de Dilma?

Os deputados não são lá essas coisas, mas acataram o impeachment pelo crime de responsabilidade fiscal, previsto na Constituição e confirmado pelo resultado final: um rombo que o governo Dilma admitia ser de R$ 96,6 bilhões e que a equipe de Meirelles descobriu bater em R$ 170 bilhões. Mas, além do fato formal, deputados e senadores tocaram o processo adiante pelo desmantelamento da economia, o esgarçamento das relações políticas e porque Dilma conseguiu ser a presidente mais impopular do país desde 1985.

A opção 3 (dos favoráveis e contrários ao impeachment) seria a antecipação de eleições diretas, empurrando Temer ou Dilma para a renúncia (dependendo de o Senado confirmar ou não o impeachment), ou dando um golpe branco e mudando a Constituição por questões conjunturais. E o que viria depois? Uma eleição às pressas, sem que os partidos tivessem se preparado e sem candidatos à altura da crise. Dá um frio na espinha pensar nos aventureiros que se lançariam como salvadores da pátria, da ética, da economia, dos “bons costumes”, da “ordem” deles, do “progresso” deles.

Isso não é brincadeira. O seguro, que morreu de velho, recomenda respeitar a Constituição, o Congresso que o eleitor elegeu e a posse do vice que 2014 jogou no Jaburu, na perspectiva de assumir com o afastamento constitucional da presidente. Vale, sim, gritar contra muitas coisas, inclusive a nomeação de um ministro da Transparência indicado, ora, ora, pelo senador Renan Calheiros. Mas o esforço para derrubar Temer, neste momento, é trabalhar contra o Brasil.

segunda-feira, 30 de maio de 2016

" Pés no Chão "

 




A simplicidade é o novo luxo. Aliás, sempre foi, apenas está recebendo o status merecido diante da falência econômica mundial



Saí de férias nas últimas semanas e não levei nenhum sapato de salto alto na bagagem. Nada contra, acho bonito, só que uso pouco. Salto agulha, só em festas de casamento e similares. Já um saltinho médio, tipo tacão, em botas e sandálias, ok. Mas dessa vez eu saí do país apenas com rasteirinhas e tênis e descobri que estava sintonizada com os atuais costumes, mesmo sem me dar conta. Depois de umas perambulações por lugarejos praianos e vilas medievais, passei três dias em Paris, meca da alta-costura, capital da elegância feminina, e não vi uma única mulher usando salto alto. Sério. Nenhuma.

Por alguma conexão cósmica, no mesmo dia em que percebi isso, li a notícia de que Julia Roberts havia circulado pelo tapete vermelho do Festival de Cinema de Cannes com os pés descalços, em protesto contra a expulsão de algumas mulheres que não seguiram o protocolo ano passado, enquanto que a jornalista Mauren Motta postava em seu perfil no Facebook o apoio à britânica Nicola Tharp, uma recepcionista de 27 anos que se recusou a trabalhar nove horas em pé usando salto e foi demitida.

Não sou partidária do desrespeito ao dress code estipulado por empresas e pelo bom senso: acho que vestir-se convenientemente, de acordo com a ocasião, é uma questão de bons modos. Mas nada impede que a gente repense a obrigatoriedade dos maiores ícones masculinos e femininos: a gravata e o salto alto. O uso de um e de outro deve ser facultativo, não uma imposição.

Posto isso, mudo de assunto, mas nem tanto. Voltei da Europa convencida de que o glamour tornou-se obsoleto. O mundo está em constante mudança, e é hora de sermos mais realistas e práticos. Glamour e ostentação não significam a mesma coisa, mas confundem-se. Tudo o que é over resvala para a cafonice. A simplicidade é o novo luxo. Aliás, sempre foi, apenas está recebendo o status merecido diante da falência econômica mundial.

Não estou falando apenas de consumismo, mas de atitude, de cultura, de estilo de vida. “Menos é mais” já deixou de ser uma tendência para virar um clássico. A Europa não é o paraíso: tem gente nas esquinas pedindo esmola, tem desemprego, tem greves, tem escândalos, nada está assegurado, o pulso pulsa.

Mas pulsa sem espalhafato. A Europa se manifesta num tom mais baixo e nem por isso deixa de ser escutada. Mantém a compostura. Não há celulares em cima das mesas dos restaurantes. Não há barulho excessivo. Não há cores gritantes. Não há tanto agrotóxico, maquiagem, pressa, televisão, grosseria, suores, botox. Não há tanto enfeite, não há tanta sedução ostensiva, não há tanto. As coisas funcionam sem os excessos. Há valores máximos dentro do mínimo.

Voltei sonhando (alto) com um Brasil mais pé no chão.

" A Hora da Previdência "

 

EDITORIAL ZERO HORA



A reação de contrariedade de centrais sindicais à reforma da Previdência do setor privado incluindo uma série de manifestações programadas para esta semana é previsível diante do tom emocional com o qual o tema costuma ser tratado. Ainda assim, até mesmo sindicalistas contrários a mudanças não têm como negar a gravidade dos números que, na hipótese de nada ser feito, tornam a situação ainda mais delicada, colocando sob ameaça o futuro imediato de quem já está aposentado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ou em período de contribuição.

Os dados são incontestáveis. Só entre 2014 e 2015, os desembolsos do setor previdenciário aumentaram 10%, enquanto as contribuições se reduziram em 3%. Se nada for feito para deter esse descompasso entre receitas e dispêndios, já em 2019 o passivo pode alcançar R$ 200 bilhões. É um montante suficiente, por si só, para colocar em risco a viabilidade do próprio sistema, situação que nenhum país minimamente preocupado com a seriedade fiscal e com o futuro da população pode admitir.

Evitar que o sistema previdenciário se inviabilize não é uma questão de responsabilidade apenas do governo e de parlamentares, mas de todos os brasileiros. Diante da gravidade a que o setor foi levado por constantes omissões de quem não admite se desgastar perante os eleitores, não haverá saídas fáceis e sem ônus para os trabalhadores. Ainda assim, neste ou em qualquer outro governo, o custo para a sociedade vai depender da demora para esse desafio ser enfrentado. Evidentemente, urgência não significa imposição ou ausência de diálogo.

PONTO PARA A TRANSPARÊNCIA

Assinada na semana passada e divulgada na última sexta-feira, resolução do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ricardo Lewandowski, acaba com a tramitação dos chamados processos ocultos na Corte Suprema. Com o fim do procedimento, mesmo os processos que correm em segredo de Justiça terão os nomes das partes conhecidos pela sociedade, em obediência ao que o próprio ministro classifica como princípios constitucionais da publicidade, do direito de informação e da transparência.

A classificação anterior de processos “ocultos” possibilitava segredo total a autoridades investigadas, permitindo consultas apenas por parte do ministro relator do Supremo ou do procurador- geral da República. Evidentemente, não fica abolido o sigilo garantido pela Constituição para preservar o interesse público ou até mesmo para não causar prejuízos às investigações. Mas agora a sociedade poderá saber que o processo existe e também conhecer o nome ou pelo menos as iniciais de quem está sendo investigado.

No momento em que se multiplicam as investigações sobre integrantes dos altos escalões da administração pública, em decorrência da Operação Lava-Jato, o Supremo demonstra sintonia com os cidadãos que exigem combate efetivo e continuado à corrupção. Depois da prisão de empresários, políticos e servidores envolvidos em irregularidades, já não se pode mais dizer que a publicidade das falcatruas é a única punição. Ainda assim, os brasileiros têm o direito de saber quem está dando trabalho à Justiça por não ter se comportado de forma republicana.

" A Origem do MAL "

 
30 de maio de 2016 
LUÍS GUSTAVO PEDROSO LACERDA





Por algum tempo, transitou a filosofia pela linha de argumento que atribuía à sociedade a origem de todo o mal que podia se apoderar do homem. Segundo essa vetusta corrente de ideias, ingênuos e inocentes eram os aborígines, antes de serem conspurcados pela insidiosa civilização que lhes contaminava com a perniciosa concupiscência e seus perversos efeitos.

Entretanto, essa senda de pensamento não convenceu por muito tempo, embora possa, por vez ou outra, ainda encontrar alguns temerários e duvidosos simpatizantes. Predomina hoje, no que se pode denominar de “pensamento ocidental contemporâneo”, a concepção que sustenta ser exatamente do homem a responsabilidade pelos seus próprios atos, não apenas aqueles dos quais orgulhosamente se jacta, mas também a responsabilidade por aqueles atos que pode tentar sorrateiramente ocultar ou da autoria deles se eximir.

A corrupção incrustada nos círculos de poder, a violência urbana persistente e diária, nódoas que nos atormentam nos tempos atuais, encontram, portanto, origem identificada e sabida. O mal concretizado pelos atos de escárnio e desdouro ao erário, o mal consistente dos constantes e cruéis atos de violência contra a vida e o patrimônio do cidadão, todos são males que não podem ser imputados aos deuses, aos astros, à sorte, à luta de classes ou a outros hipotéticos e sediciosos mecanismos da sociedade. Pelo contrário, o mal está, por essência, nos homens que assim agiram e assim agem.

Nesse desencantador estado de coisas, a reação de todos que somos vítimas poderia se limitar ao estupor e à inanição pelo fracasso das nossas mais simples esperanças. Mas, diversamente do que se preconizava, é justamente na sociedade, fundamentada no Estado de direito, que o homem pode encontrar a solução para o empenho de suplantar a corrupção e sobrepujar a violência. Acreditar na ordem jurídica e concretizar sua aplicação firme e isonômica são condições inarredáveis da resposta a tais desafios. A impunidade, maior fator criminógeno entre os diversos que se apresentam na nossa realidade, deve ser verberada ao extremo, não apenas através da persecução incansável dos atos contrários à lei, mas também através de penas efetivas e proporcionais às ofensas cometidas.

Somente a civilização pode vencer o mal.

Juiz de Direito*