sexta-feira, 31 de julho de 2015

" Por que uma mãe deletou o facebook da filha de 10 anos "


Relato de mãe na rede social sobre pedófilo que abordou sua filha mostra o perigo de ceder à vontade da criança


                               BRUNO FERRARI



Crianças e redes sociais: uma mistura que não combina (Foto: ThinkstockPhotos)
Está lá, na seção de perguntas frequentes do Facebook: "Para se cadastrar no Facebook, é preciso ter pelo menos 13 anos".
Tenho quase certeza que você conhece alguém com menos de 13 anos que tem uma conta na rede social, certo?
Dá para entender por que as crianças não respeitam a regra - a maioria das vezes com o aval dos pais. As redes sociais são um ambiente extremamente convidativo. Dá para jogar, assistir a vídeos e, principalmente, manter contato com os coleguinhas de escola. Proibir o seu filho de usar o Facebook pode lhe render um ar de mãe radical ou carrasca. Significa ouvir a resposta automática: "Mas todo mundo na minha classe está no Feeeice!"

Daí entra a velha máxima da minha mãe: "Se todo mundo se jogar do penhasco, você se joga junto?". Como eu odiava quando ela falava assim... mas, como boa mãe que é, tinha razão.
Você deixaria sua filha ou seu filho brincar numa praça que está lotada de gente com más intenções?  
Nada melhor para chamar a atenção para um problema tão sério do que um relato verdadeiro publicado por uma mãe. Ontem, a carioca E. S. (ela pediu para não ser identificada), mãe de uma garota de 10 anos, compartilhou uma história em sua página no Facebook de causar calafrios. 
Leia trechos do relato:
"Sempre achei que criança não deveria ter facebook, mas a maioria dos amiguinhos da C. tem, e sempre ouvi de muitas pessoas que eu era radical por não deixá-la ter... Enfim, acabei cedendo. Ontem à noite ela pediu pra usar e deixamos, pela primeira vez. Imaginem qual não foi o tamanho da minha surpresa ao ver que ela tinha 92 solicitações de amizade, a maioria com fotos de adulto no perfil e sem nenhum amigo em comum! Me pergunto o que uma criança de 10 anos tenha de tão interessante pra um adulto desconhecido, embora, infelizmente, eu já saiba a resposta... Ela veio muito assustada mostrar pra mim e pro meu marido uma mensagem de um desconhecido. Que bom que conversamos muito com ela e a orientamos, mas mesmo assim ela poderia ter caído na conversa."
As imagens falam mais do que qualquer comentário que eu possa fazer:
Troca de mensagens com suspeito de praticar crime de pedofilia (Foto: reprodução)
A partir daí, E. S. começou a se passar pela filha até enquadrar o sujeito. Ele a bloqueou. 
As ruas estão cheias de criminosos ou gente com doenças que podem levá-las a cometer crimes. Por isso, ninguém em sã consciência deixa o filho pequeno sair por aí sem supervisão, certo? Deveria ser assim também nas redes sociais. 
O relato de E.S é raro. As pessoas preferem não se expor. Mas é essencial para abrir os olhos de outros pais e responsáveis por menores que insistem em criar perfis em redes sociais. Como disse a própria E.S no final de seu post: "Tudo no seu tempo."

" Contas Públicas têm pior resultado da história para junho e primeiro semestre "


Os resultados de governo, estados, municípios e empresas estatais terminaram junho com rombo de R$ 9,3 bilhões


REDAÇÃO ÉPOCA
As contas do setor público fecharam junho no vermelho. Em dados divulgados pelo Banco Central, nesta sexta-feira (31), o resultado de governo, estados, municípios e empresas estatais foram negativos em R$ 9,3 bilhões, caracterizando um déficit primário (quando se comparam receitas menos as despesas, sem considerar gastos com juros). Esse é o pior resultado da série histórica que começou a ser contabilizada em dezembro de 2001, de acordo com a Folha de S.Paulo.

>> Petrobras recebe R$ 69 milhões desviados por Barusco

Se considerarmos o resultado do primeiro semestre de 2015, no entanto, as contas ficaram no azul. As contas públicas tiveramsuperávit de R$ 16,22 bilhões. Esta é, contudo, a menor economia feita para pagar os juros da dívida pública na série histórica. Nos seis primeiros meses do ano passado, por exemplo, o superávit tinha sido de R$ 29,3 bilhões.

>> Dilma libera crédito extraordinário de R$ 5,1 bilhões para Fies

"Naturalmente, o resultado do mês e do semestre refletem um quadro em que a atividade econômica sobretudo repercute no desempenho fiscal [das contas públicas], a despeito das medidas adotadas para recuperação e receitas e contenção de despesas. Há um impacto significativo da atividade econômica sobre a arrecadação e sobre as receitas, que se reflete nesse desempenho no período", disse o chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Tulio Maciel, de acordo com o G1.
contas públicas (Foto: ÉPOCA)

" Petrobras recebe sessenta e nove milhões, (69milhões ) desviados por BARUSCO "



Estatal conseguiu retomar equivalente a 80% do valor repatriado da Suíça, após Lava Jato. O restante permanece à disposição da Justiça


Pedro Barusco, ex-gerente da Petrobras, em depoimento à CPI que investiga esquema de corrupção na estatal (Foto: Antonio Cruz / Agência Brasil)
Petrobras conseguiu recuperar mais de R$ 69 milhões desviadospelo ex-gerente da estatal Pedro Barusco. O valor foi entregue em uma cerimônia nesta sexta-feira (31), na sede do Centro do Rio de Janeiro, após determinação da Justiça Federal.

A quantia equivale a 80% dos quase US$ 29 milhões (R$ 86,9 milhões)repatriados da Suíça. O restante permanecerá à disposição da Justiça para eventual existência de outros lesados a serem indenizados, segundo o Ministério Público Federal (MPF-RJ) informou ao G1.

Pedro Barusco é um dos delatores da Operação Lava Jato. Ele exerceu cargos de gerencia na Diretoria de Exploração e Produção, de 1995 a 2003, e foi gerente-executivo de engenharia na Diretoria de Serviços até 2011. Nas funções, recebeu propinas entre 1999 e 2012, inclusive em contratos que envolveram a fornecedora de navios-plataforma holandesa SBM OffShore.

Na cerimônia estavam presentes o procurador-geral da República,Rodrigo Janot, Aldemir Bendine, presidente da Petrobras, Luís Inácio Adams, Advogado-Geral da União do Brasil, Valdir Simão, no comando da Controladoria-Geral da União, Jose Eduardo Cardozo, Ministro da Justiça e Renato Silva de Oliveira, Procurador da República no Estado do Rio de Janeiro.
De acordo com Janot, a Petrobras foi vítima de ação de criminosos, mas lembrou de que não há cidadão acima da lei. “O que esses criminosos fizeram além de barbaramente saquear os recursos da empresa, foi retirar da sociedade brasileira o seu orgulho. Com esse sinal, a gente pretende reverter esse quadro e permitir que possamos de novo ter o orgulho, recupera nosso orgulho”, disse o procurador-geral da República.


" O Que è ter Fé "


 Fr. Betto*

Para Jesus, ela não significa aceitar o que prega uma religião, mas agir levado por amor, solidariedade e justiça

Todos conhecemos pessoas que frequentam a igreja e, no entanto, se comportam de modo contrário aos valores evangélicos: tratam subalternos com desrespeito; sonegam direitos de empregados; discriminam por razões raciais ou sexuais. Pessoas que enchem a boca de Deus e trazem o coração entupido de ira, inveja, soberba; são indiferentes aos direitos dos pobres; omitem-se em situações graves que lhes exigem solidariedade.

E temos à nossa volta, no círculo de amizades, pessoas ateias ou agnósticas que, em suas atitudes, fazem transparecer tudo o que o Evangelho acentua como valores: amor ao próximo, justiça aos excluídos, solidariedade aos necessitados, etc.

O Catecismo da Igreja Católica, aprovado por João Paulo II, em 1992, e elaborado sob a supervisão do téologo Ratzinger, futuro papa Bento XVI, define a fé como “adesão pessoal do homem a Deus”. E acrescenta que é “o assentimento livre de toda a verdade que Deus revelou.” E a portadora dessa verdade é a Igreja.

Assim, só teria verdadeira fé cristã quem submete seu entendimento ao que ensina a autoridade eclesiástica (papa, bispos e pastores).

Devido a essa maneira de entender a fé, o que se crê se tornou mais importante do quecomo se vive. Criou-se uma ruptura entre fé e vida. A ponto de uma pesquisa na França, ao indagar a diferença entre um empresário sem religião e outro cristão, teve como resposta da maioria um detalhe: o segundo vai à missa de vez em quando. No resto, em nada diferem...

Para Jesus, quem tinha fé? A resposta é desconcertante. Em Mateus 8,10, Jesus declara que o homem com mais fé que até então havia encontrado era um oficial romano, um centurião.

Ora, como Jesus pôde elogiar a fé de um oficial pagão? O episódio demonstra que, para Jesus, a fé não consiste, em primeiro lugar, naquilo que se crê, e sim no modo de proceder. Aquele pagão era um homem solidário, preocupado com o sofrimento de um servo.

A mesma atitude de Jesus se repete no caso da mulher cananeia, que também era pagã. A mulher pede a Jesus que lhe cure a filha. Diante dela, Jesus reconhece: “Mulher, grande é a sua fé!” (Mateus 15,28). Grande, não por causa da crença da mulher, e sim por seu procedimento amoroso.

O mesmo ocorre no caso do samaritano hanseniano, curado em companhia de nove judeus (Lucas 17,11-19). Os judeus, segundo suas crenças religiosas, se apresentaram aos sacerdotes, como recomendou Jesus. Já o samaritano, que não obedecia às prescrições das autoridades religiosas e não se sentia obrigado a submeter-se a elas, retornou para agradecer a Jesus, que lhe exaltou a fé: “A sua fé o salvou” (Lucas 17,19).

Para Jesus, portanto, a fé, antes de se vincular a um catálogo de crenças, a uma doutrina, se relaciona a um modo de viver e agir. Jesus, por vezes, duvidou da fé de quem estava mais próximo dele (Marcos 4,40). Discípulos e apóstolos foram considerados “homens de pouca fé” (Mateus 8,26).

Jesus fez a desconcertante afirmação de que prostitutas e cobradores de impostos terão precedência no Reino de Deus, e não os “exemplares” sacerdotes (Mateus 21,31).

Isso deixa claro quem Jesus reconhecia como crente. Não propriamente quem aceita o que prega a religião, e sim quem age por amor, solidariedade e justiça. Ter fé é, sobretudo, viver de acordo com os valores segundo os quais vivia Jesus.

A Igreja está em crise. Suas autoridades culpam o laicismo, o relativismo, o hedonismo. Ora, será que as autoridades religiosas, e nós, frades, freiras, padres e pastores, não temos culpa nisso, por apresentar a fé cristã como verdades cristalizadas em doutrina, e não expressada em vivência?


* Frade Dominicano. Escritor. Teólogo.  
Fonte: Jornal O Globo online, 30/07/2015

" Questão migratória é o principal problema europeu, mais que a crise grega "


 

 Policiais bloqueiam passagem de imigrantes que tentam passar para o lado britânico - PASCAL ROSSIGNOL / REUTERS

 Para Bruno Cautrès, do Instituto de Estudos Políticos de Paris, incapacidade da UE alimenta populismo

PARIS - O drama dos migrantes que têm se arriscado no Eurotúnel para chegar ao Reino Unido colocou a questão novamente em pauta. Para Bruno Cautrès, analista do Instituto de Estudos Políticos de Paris, a incapacidade da Europa em lidar com a situação alimenta o populismo que rechaça os refugiados e dá voz a radicalismos.

Qual o significado de mais este incidente em Calais?
Há muito tempo, não somente a França, mas a Europa, não sabe enfrentar esta situação. E temos o sentimento de que é algo cada vez mais grave. Há uma pressão crescente, e esta questão da imigração e dos refugiados se tornou o problema número um da Europa, talvez mais do que a crise grega. Os países europeus se sentem pouco à vontade em aceitar assumir sua parte do problema. É um problema para o qual ninguém parece ter uma solução.

Como você analisa a reação dos envolvidos hoje?
As respostas se restringiram ao âmbito da manutenção da ordem, do reforço da segurança, com envio de policiais. O ministro do Interior francês disse que a situação em Calais reflete o estado dos problemas e das tensões do mundo. Tudo bem, ele tem razão. Mas dizendo isso, ele não diz nada. Fui surpreendido por essa abordagem do governo francês restrita às questões de segurança.
 
Há uma impotência europeia para enfrentar o problema?
As soluções são de longo prazo e onerosas, de nível internacional, nas áreas de políticas de cooperação, de desenvolvimento. As soluções de curto prazo são humanitárias. A Itália teve razão em lembrar que os fundos europeus que lhe haviam sido destinados para enfrentar a situação foram reduzidos. Hoje, é ainda mais difícil, pois muitos governos têm o sentimento de que os cidadãos não acreditam mais na Europa.

Este quadro favorece o discurso da extrema-direita e do populismo, de Marine Le Pen (FN), e também a proposta do ex-presidente Nicolas Sarkozy, de acabar com o Espaço Schengen?
São temas do terreno da extrema-direita que proporcionaram seu sucesso na França, com o objetivo de amedrontar com a ameaça de uma invasão de refugiados e imigrantes. E também de dizer que abandonando a soberania nacional em detrimento da Europa, do Espaço Schengen (espaço europeu em que os países participantes têm fronteira aberta entre si), a França se coloca em perigo. Se o que se passou hoje, ocorresse duas semanas antes do primeiro turno da eleição presidencial, haveria um efeito importante.
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Reportagem por 

" Isso foi ontem "

 
31 de julho de 2015 | N° 18243 
MARCOS PIANGERS





E você me disse que me odeia e que preferia não ter nascido. Isso foi ontem, quando você fez 18 anos. E um pouco antes eu disse que não ia emprestar o carro, que apesar de estar com o papelzinho da autoescola aquilo ainda não era a sua carteira de motorista. E você disse que estava muito nervosa no teste e não sabia se tinha passado.

E você disse que estava feliz com a nova escola, já tinha feito umas amigas. Isso foi ontem, quando a gente se mudou de cidade.

E você disse que tinha adorado a festa, mesmo que a gente tivesse pouco dinheiro pro vestido de 15 anos. Eu senti que você estava só sendo educada. E você disse que a prova tinha sido impossível e que a professora não ensinava nada e só jogava a matéria no quadro. Isso foi ontem, quando você me falou que pegou recuperação. E você disse que ia brincar um pouco mais lá embaixo e ia fazer a lição de casa amanhã de manhã. Isso foi ontem, e até agora nada.

E você me disse pelo telefone que estava com saudade e eu me senti o pior pai do mundo porque não estava com você no seu aniversário de 12 anos. E você veio correndo me mostrar mais um dente que tinha caído e eu peguei o dente e guardei no bolso da minha camisa e esqueci ele lá. E você odiou quando a gente passou seu aniversário em Recife, longe de todas as suas amigas, sem festa e sem presente. Isso foi ontem, quando você fez 10 anos.

E você disse que agora não precisa mais sentar na cadeirinha do carro. E eu te dei um celular bem baratinho, porque não conseguia me imaginar longe de você sem poder me comunicar. Na escola, tinha aquele menino que te chamava de “menina do celular”, porque você era a única menina com pais tão preocupados, ligando de 10 em 10 minutos. Isso foi ontem, no seu primeiro dia de aula.

E eu e a sua mãe choramos escondidos com uma pena de você, quando sua irmã nasceu e sentimos que você não seria mais nossa princesinha. Iria ter que dividir o reino com um novo bebê. Isso foi ontem à noite, depois que você dormiu. E você insistiu pra dormir na minha cama porque estava com medo do escuro e me chutou a noite inteira. Isso foi ontem e agora eu estou todo dolorido. 

E você me disse que me amava pela primeira vez, provavelmente só repetindo o que eu te digo todo dia. Isso foi ontem. E eu estava nervoso e atrapalhado. Sua mãe tranquila e feliz. Viramos a noite no hospital, ontem, quando você nasceu. Tentando entender como cuidar de você. Um dia a gente aprende.

quinta-feira, 30 de julho de 2015

" Tecnologia NOVO SISTEMA OPERACIONAL "





Será este o Windows definitivo?


VERSÃO 10 TERÁ UPGRADE gratuito para quem já usa versões originais, aposenta o Internet Explorer e agrega um assistente de voz. Microsoft busca manter a supremacia no mercado.

O número 10 não é à toa. Ao pular do 8 para a versão lançada ontem, o Windows indica que fecha um ciclo, corrige defeitos graves e finca o pé em novos setores. Gratuito para quem já tem Windows 7, 8 ou 8.1, o novo sistema operacional da Microsoft traz de volta o menu iniciar, aposenta o Internet Explorer e mostra o Cortana, assistente virtual da empresa dirigida por Satya Nadella.

Por falar em Nadella, esse é o primeiro grande lançamento da companhia sob a batuta do americano com ascendência indiana – que substituiu Steve Ballmer e foi nomeado CEO por Bill Gates em fevereiro de 2014. A intenção dele fica clara em frase destacada no evento de ontem:

– Queremos sair do momento em que as pessoas precisavam do Windows, para chegar a um momento em que as pessoas escolhem o Windows e, enfim, que elas amem o Windows.

Gustavo Lang, diretor de Windows da Microsoft no Brasil, considera essa versão quase um “Windows definitivo”:

– Quando a gente introduz o Windows como produto, não precisaria ter o 10 na frente. É a nossa plataforma, e o nosso compromisso é mantê-la sempre atualizada. Já fui perguntado se a Microsoft atingiu a perfeição, mas é exatamente o contrário, queremos renová-la com muito mais rapidez, constantemente.

Especialistas reforçam a importância do novo Windows para a gestão de Nadella. Ousado, o sistema operacional indica possíveis caminhos para a empresa, principalmente pelo fato de unificar a experiência do usuário em diversas plataformas. O novo Windows estará disponível para PCs, tablets, smartphones, Raspberry Pi, Xbox One, HoloLens, entre outras.

– É a chance de a Microsoft se reposicionar. Passar a ter sistemas não só para desktop, mas para tablet, celular etc. Ela começa a botar as mãos em um mercado que é todo do Android. E, ao disponibilizar o Windows de graça, a empresa passa a mensagem de que vende serviços, soluções, e deixa de ser uma companhia que vende o software – analisa Julio Machado, professor da Faculdade de Informática da PUCRS, que trabalha junto ao Centro de Inovação da Microsoft na universidade e já testou as versões beta do Windows 10.

Se o pulo do Windows 7 para o 8 foi um susto – o sistema operacional apresentou muitas mudanças que desagradaram os usuários e causou certa estranheza na base de consumidores –, a evolução para o 10 é mais suave. A colunista Vanessa Nunes, especialista em tecnologia, descreveu a transição como “nada traumática”, e o sentimento ao utilizar a nova versão “foi de alívio”. Isso porque defeitos e medidas antipáticas de anos passados foram corrigidos.

EMPRESA ESPERA CHEGAR A UM BILHÃO DE USUÁRIOS

O menu iniciar é um organizador. E funciona, como sempre funcionou. A aposentadoria do Internet Explorer era quase uma obrigação – o produto já havia se tornado piada e chegou a ser descrito pela própria Microsoft como “o navegador que você ama odiar”. Com o Edge, a experiência fica mais rápida, leve e atualizada.

Por último, o Cortana pode ser um atrativo bastante importante para possíveis novos consumidores. Bastante parecido com a Siri, software da Apple que responde a comandos de voz do usuário, o Cortana ainda não tem versão em português, o que atrapalha a experiência, mas parece ser uma evolução importante no escopo da Microsoft. A empresa garante que até o final do ano a versão para brasileiros estará disponível para os “Windows insiders” (grupo de usuários beta). Depois de aprovada, é liberada para todo mundo.

Com a nova versão, a Microsoft espera que 1 bilhão de pessoas usem o Windows até 2018. Nos Estados Unidos, o Windows 10 Home custa US$ 119 (cerca de R$ 402) para quem não tem versões posteriores ao Windows 7 em seu computador. A versão Pro sai por US$ 199 (cerca de R$ 672).

gustavo.foster@zerohora.com.br - *O repórter viajou a convite da Microsoft

" Pensamento Binário "


Vladimir Safatle* 
 
"É patético ter que receber afagos como "você faz o jogo da direita" todas as vezes que critica de forma dura os descaminhos do governo federal. Normalmente, tais afagos vêm de pessoas que procuram esconder sua capacidade de pensar criticamente sob a fantasia da luta constante e inglória contra as forças do atraso."

Ele cita o exemplo de G. Deleuze a ser meditado nos dias de hoje. O pensador francês "costumava mostrar a grandeza de seu pensamento fazendo algo que irritava mais de um de seus colegas. Mesmo sendo alguém vinculado à tradição do pensamento radical francês, ele não deixava de mostrar a genialidade de certos autores claramente conservadores, como Charles Péguy e Paul Claudel, ou de autores "moderados", comoHenri Bergson. Era uma maneira de mostrar verdadeira abertura ao pensamento e à criação, independentemente de onde ela viesse".

Eis o artigo.

Há anos, escrevi aqui que um país em involução mental só consegue contar até dois. Seus debates organizam-se a partir de um polaridade simplória na qual nenhum pensamento um pouco mais elaborado é possível.
Tudo deve encaixar em dois conjuntos, sendo que um deles serve apenas para ser sumariamente descartado e esconjurado. Este é um dos aspectos daquilo que Christian Dunker chamou recentemente de "lógica do condomínio" a organizar a vida intelectual do país.

De fato, há algo de cômico em ter que ouvir cada vez mais frases como "Vá para Cuba" ou "Aqui não é a Coreia do Norte" todas as vezes que alguém defende políticas esquerdistas de combate à desigualdade social e de regulação econômica.

Não passa na cabeça destas pessoas que é possível ser radicalmente de esquerda e contrário, por exemplo, ao Estado degenerado que acabou sendo implantado em Cuba. Não, isso é muito complicado para alguém que, no fundo, só consegue pensar com as dicotomias mais primárias da Guerra Fria.

Da mesma forma, é patético ter que receber afagos como "você faz o jogo da direita" todas as vezes que critica de forma dura os descaminhos do governo federal. Normalmente, tais afagos vêm de pessoas que procuram esconder sua capacidade de pensar criticamente sob a fantasia da luta constante e inglória contra as forças do atraso.

Há meses, apareceu em uma livraria um dos títulos mais inacreditáveis que um livro poderia ter: "10 livros que estragaram o mundo". Entre eles estavam listados obras deFreudDarwinLêninHitlerNietzsche e Marx. Esta é a melhor síntese deste pensamento binário que nos assola nos dias atuais.
Não se trata de dizer que você discorda do encaminhamento de certas ideias. Trata-se de dizer que tais ideias "estragaram o mundo", que é melhor queimar os livros que as expressam, nunca mais lê-los, colocando-os ao lado de Hitler (que também gostava de falar de livros que estragaram o mundo e que mereciam ser queimados). Engraçado saber que livros que dizem que outros livros estragaram o mundo são o deleite de alguns.

Gilles Deleuze costumava mostrar a grandeza de seu pensamento fazendo algo que irritava mais de um de seus colegas. Mesmo sendo alguém vinculado à tradição do pensamento radical francês, ele não deixava de mostrar a genialidade de certos autores claramente conservadores, como Charles Péguy e Paul Claudel, ou de autores "moderados", como Henri Bergson. Era uma maneira de mostrar verdadeira abertura ao pensamento e à criação, independentemente de onde ela viesse. Eis um bom exemplo a meditar nos dias de hoje.
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* Vladimir Safatle, professor de filosofia da USP, em artigo publicado pela Folha de S. Paulo, 28-07-2015.
Fonte: IHU online, 29/07/2015

" As crises da vida e a autorealização "


 Leonardo Boff*
 
"A realização pessoal não consiste na quantificação de capacidades pessoais que podem ser realizadas, mas na qualidade, no modo como fazemos bem aquilo que a vida situada nos cobra. A quanti­ficação, a busca de títulos, de cursos sem fim, pode significar em muitas pesoas a fuga do encontro com a tarefa de sua vida: de se medir consigo mesmo, com seus desejos, com suas limitações, com seus problemas, com suas positividades e negatividades e integrá-los criativamente".

Quase só se fala de crise e crise das crises, aquela da Terra e da vida, ameaçadas de desaparecer como acenou o Papa Francisco em sua encíclica sobre “o cuidado da Casa Comum”. Mas tudo o que vive é marcado por crises: crise do nascimento, da juventude, da escolha do parceiro ou parceira para a vida, crise da escolha da profissão, crise do “demônio do meio-dia”como a chamava Freud que é a crise dos quarenta anos quando nos apercebemos que já estamos chegando ao topo da montanha e começa a sua descida. Por fim a grande crise da morte quando passamos do tempo para a eternidade.

O desafio posto a cada um não é como evitar as crises. Elas são inerentes à nossa condição humana. A questão é como as enfrentamos: que lições tiramos delas e como podemos crescer com elas. Por aí passa o caminho de nossa auto-realização e de nossa maturidade como seres humanos.

Toda situação é boa, cada lugar é excelente para nos medirmos conosco mesmo e mergulharmos em nossa dimensão profunda e deixar emergir o arquétipo de base que carregamos (aquela tendência de fundo que sempre nos martela) e que através de nós quer se mostrar e fazer sua história que é também a nossa verdadeira história. Aqui ninguém pode substituir o outro. Cada um está só. É a tarefa fundamental da existência. Mas sendo fiel neste caminhar, a pessoa já não está mais só. Construíu um Centro pessoal a partir do qual pode se encontrar com todos os demais caminhantes. De solitário faz-se solidário.

A geografia do mundo espiritual é diferente daquela do mundo físico. Nesta os países se tocam pelos limites. Na outra, pelo Centro. É a indiferença, a mediocridade, a ausên­cia de paixão na busca de nosso EU profundo que nos distancia de nosso Centro e dos outros e assim perdemos as afinidades, embora estejamos ao lado deles, no meio deles e pretendendo estar a serviço deles.

Qual é o melhor serviço que posso prestar às pessoas? É ser eu mesmo como ser-de-relações e por isso sempre ligado aos outros, ser que opta pelo bem para si e para os outros, que se orienta pela verdade, ama e tem compaixão e misericórdia.

realização pessoal não consiste na quantificação de capacidades pessoais que podem ser realizadas, mas na qualidade, no modo como fazemos bem aquilo que a vida situada nos cobra. A quanti­ficação, a busca de títulos, de cursos sem fim, pode significar em muitas pesoas a fuga do encontro com a tarefa de sua vida: de se medir consigo mesmo, com seus desejos, com suas limitações, com seus problemas, com suas positividades e negatividades e integrá-los criativamente. Foge no acúmulo do saber inócuo que mais ensoberbece e afasta dos outros do que nos amadurece para poder compreender melhor a nós mesmos e o mundo. A linguagem trái estas pessoas que dizem: sou eu que sei, sou eu que faço, sou eu que decido. É sempre o eu e nunca o nós ou a causa, comungada também por outros.

A realização pessoal não é obra tanto da razão que dis-corre sobre tudo, mas do espíritoque é nossa capacidade de criar visões de conjunto e de ordenar as coisas em seu justo lugar e valor. Espírito é descobrir o sentido de cada situação. Por isso é próprio do espírito a sabedoria da vida, a vivência do mistério de Deus, decifrado em cada momento. É a capacidade de ser todo em tudo o que faz. Espiritualidade não é uma ciência ou uma técnica, mas um modo de ser inteiro em cada situação.

A primeira tarefa da realização pessoal é aceitar a nossa situação com seus limites e possibilidades. Em cada situação está tudo, não quantitativamente dis-tendido, mas qualitativamente recolhido como num Centro. Entrar nesse Centro de nós mesmos é encontrar os outros, todas as coisas e Deus. Por isso dizia a velha sabedoria da Índia: “Se alguém pensa corre­tamente, recolhido em seu quarto, seu pensamento é ouvido a milhares de quilômetros de distância”. Se quiseres modificar os outros, comece por modificar-te a ti mesmo.

Outra tarefa imprescindível para a realização pessoal é saber con-viver com o último limite que é a morte. Quem dá sentido à morte, dá sentido também à vida. Quem não vê sentido na morte também não descobre sentido na vida. Morte porém é mais que o último instante ou o fim da vida. A vida mesma é mortal. Em outras palavras, vamos mor­rendo lentamente, em prestações, porque quando nascemos começamos já a morrer, a nos desgastar e nos despedir da vida. Primeiro nos despedimos do ventre materno e morremos para ele. Depois nos despedimos da infância, da meninice, da juven­tude, da escola, da casa paterna, da idade adulta, de algumas de nossas tarefas, de cada momento que passa e por fim nos despedimos da própria vida.

Esta despedida é um deixar para trás não apenas coisas e situações, mas sempre um pouco de nós mesmos. Temos que nos desapegar, nos empobrecer e esvaziar. Qual o sentido disso tudo? Pura fatalidade irreformável? Ou não possui um sentido secreto? Despojamo-nos de tudo, até de nós mesmos no último momento da vida (morte), porque não fomos feitos para esse mundo nem para nós mesmos, mas para o Grande Outro que deve encher nossa vida: Deus! Deus vai, na vida, nos tirando tudo para nos reservar cada vez mais intensamente para si; pode até tirar-nos a certeza se tudo valeu a pena. Mesmo assim persistimos, crendo nas palavras sagradas:”Se teu coração te acusa, saiba que Deus é maior que teu coração”(cf. 1 Jo 3,20 ). Quem conseguir incorporar as negatividades, mesmo injustas, em seu próprio Centro, este alcançou o mais alto grau dehominização e de liberdade interior.

As negatividades e as crises pelas quais passamos, nos dão esta lição: de nos despojar e nos preparar para a total plenitude em Deus. Então, como diz o místico Sâo João da Cruz: seremos Deus, por participação.
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 *Leonardo Boff, teólogo, filósofo e escritor.
Fonte: IHU online, 29/07/2015

" Hermann Hesse : O GURU DOS HIPPIES "


Hermann Hesse: o guru dos hippies
Nobel de Literatura, Hermann Hesse é um dos mais importantes escritores alemães do século 20 e sua obra provoca uma espécie de culto místico. O autor do romance “O Lobo da Estepe” quis mudar-se para o Brasil e, depressivo, foi paciente de J. B. Lang e de C. G. Jung

A Floresta Negra, no Sudoeste da Alemanha, é uma das mais belas regiões do país. A área abrange quase a metade do Estado de Baden-Württemberg — que, ao Sul, faz limite com a Suíça e, a Oeste, com a França. A topografia é acidentada com vales, colinas e montanhas cobertas de densa mata de pinheiros que, ao sol do verão, assumem uma cor verde-escuro quase beirando ao preto, daí o nome de Floresta Negra. A Oeste, formando a divisa com a França, serpenteia languidamente o Reno, a mais importante veia aquática europeia, cujas nascentes têm suas origens nos Alpes suíços; em seu percurso penetra o território alemão do Sul ao Norte, onde faz um desvio em direção à Holanda e lá desemboca no rio Maas — formando um intrincado delta cujos braços espraiam-se no Mar do Norte. A Floresta Negra estende-se além do Reno, em território francês, onde as árvores são da mesma família e a cor verde-escuro viceja. O que muda é apenas o nome: os franceses chamam-na de Floresta dos Vosgues.

Em território alemão, no coração desta floresta, encontra-se a pequena e pitoresca cidade de Calw, um nome que soa estranho para os que não vivem na região. A localização geográfica de Calw, cujas origens datam do ano 1075, também é estranha: a cidade encontra-se numa depressão. No linguajar corriqueiro, diríamos que Calw situa-se num buraco. A cidade é cortada pelo Nagold, rio que, em termos de Brasil, seria considerado riacho. Mesmo assim, o Nagold, no passado certamente com mais água, teve uma importante função na história da cidade. Até o século 19, o pequeno rio era a principal via de transporte fluvial para os troncos de pinheiros da Floresta Negra. Eram amarrados em balsa e transportados via rio Neckar até ao Reno, de onde seguiam até à Holanda e, não raro, para a Inglaterra.

Durante quase toda a Idade Média, Calw foi um grande centro de comércio — com estabelecimentos manufatureiros de couro, moinhos, serrarias, marcenarias e artesãos de móveis e de construção de casas do estilo enxaimel, a arquitetura típica da região.

O Sul da Alemanha, a partir do século 17 até meados do século 20, era fortemente influenciado pelo pietismo, o maior movimento reformista dentro do protestantismo europeu após a Reforma Protestante. Os pietistas, profundamente crentes, conservadores e intransigentes a tudo quanto era novo, levavam o conteúdo da Bíblia ao pé da letra e eram, por isso, considerados ortodoxos dentro do protestantismo.

Foi neste ambiente que, em 2 de julho de 1877, nasceu e passou a sua infância e parte da adolescência Hermann Hesse, o mais lido escritor alemão do século 20. Perscrutar a vida desse autor não é tarefa rotineira e quem a enceta deve estar ciente de que, caso tiver percepção para os sentimentos mais intrínsecos da alma humana, acaba perscrutando a si mesmo.

Hermann Hesse, aos 20 anos
Hermann Hesse, aos 20 anos
Hermann Hesse não aceitou e muito menos se conformou com o ambiente no qual nascera e crescera. Muito cedo deu mostras de rebeldia contra a “camisa de força” que lhe fora imposta pelo ambiente pietista. No círculo familiar sua rebeldia contra a extremada religiosidade causou tanto incompreensão quanto preocupação, pois os Hesse, por gerações, eram crentes convictos, engajados na igreja, em serviços missionários e na publicação de literatura religiosa.

Portanto, o jovem foi a primeira ovelha negra de uma linhagem familiar que não conhecia nada além do sacrifício à religião. Mais tarde, Hermann Hesse registrou em seu diário uma observação que explica um dos motivos de sua rebeldia adolescente: “Que pessoas encarem a sua vida como vassalas de Deus e que procurem, isentas de qualquer impulso egoístico, viver a serviço e sacrifício para com Deus foi uma vivência da minha juventude que me influenciou profundamente”.
Hermann Hesse foi um homem que, durante toda a sua vida, teve que lutar contra dúvidas, anseios e aflições. O ambiente familiar pietista, por ser rígido, serviu de húmus no qual se desenvolveram seus futuros devaneios psíquicos por meio dos quais acabou encontrando o seu caminho à literatura. Durante toda a sua vida, Hesse foi um solitário que não suportava pessoas por muito tempo ao seu redor. Mesmo suas mulheres — teve três —, só as tolerava a certa distância. Em sua obra “O Lobo da Estepe” (best seller também no Brasil), Hesse registrou uma frase elucidativa: “Solidão é independência, com ela eu sempre sonhara e a obtivera afinal após tantos anos”.

Para compreender a beleza, a profundidade e o sentido da obra literária de Hermann Hesse é preciso entranhar-se nos labirintos da alma do autor. É necessário perceber Hermann Hesse como indivíduo, entender o ambiente em que viveu e conhecer a sua genealogia. Seus parentes, além de pietistas, tinham ampla cultura humanista.

Sua vida é bem documentada, o que vale para os seus ancestrais tanto da linhagem paterna, os Hesse, como da materna, os Gundert. Os bisavós tinham o hábito de guardar todo e qualquer papel, por mais insignificante que fosse. Cartas, apontamentos, cartões postais, simples bilhetes — tudo era guardado. O mesmo costume tinham também os avós e seus pais. Graças a esse cuidado, os registros, documentos e demais fontes de informações existentes sobre a ascendência de Hesse são amplas. A dedicação à literatura e à arte de escrever já eram hábitos que existiam nos dois ramos familiares de seus ancestrais.

O avô paterno, dr. Carl Hermann Hesse (1802-1896), nasceu em Livland, na Estônia, à época pertencente à Rússia. Era casado com uma alemã, médico e conselheiro de Estado, em Weissenstein, na Estônia. Além do russo, falava alemão, latim, grego e hebraico. Como pietista, ministrava aulas bíblicas, fundou um orfanato, escreveu artigos para jornais e é autor de vários livros, entre os quais uma ampla autobiografia em dois volumes. Hermann Hesse, o neto escritor, não chegou a conhecer o avô pessoalmente mas, desde jovem, manteve com ele regular correspondência até sua morte.

O avô materno, dr. Hermann Gundert, nasceu em Stuttgart, na Alemanha, em 1814. Fez seus estudos preliminares no célebre mosteiro de Maulbronn, cujas origens datam do século 11 e a seguir matriculou-se no Tübinger Stift, fundado em 1536, uma instituição de elite, ligada à Universidade de Tübingen. Em seus quase cinco séculos de existência, o Tübinger Stift formou grandes homens da cultura alemã, como o astrônomo Johannes Kepler, o poeta Friedrich Hölderlin, os filósofos Georg Wilhelm Friedrich Hegel e Friedrich Schelling e o escritor e tradutor Eduard Mörike.

O dr. Gundert era pessoa de ampla cultura. Começou a escrever durante os seus estudos preliminares em Maulbronn. Datam desse período vários dramas, entre eles um sobre Pedro, o Grande. Ampla era a sua vocação para as línguas. Durante a sua formação em Tübingen, estudou latim, grego, hebraico, inglês, francês, italiano, indu e malaiala. Terminados os estudos, passou um período na Inglaterra e de lá partiu para Tschirakal, na Índia, onde inicialmente trabalhou como professor. Não demorou, interessou-se por atividades missionárias e ocupou-se da área de seu interesse, as línguas. Estudou vários dialetos indus, traduziu a Bíblia do latim para o malaiala e compilou o primeiro dicionário inglês-malaiala, trabalho que lhe custou mais de 30 anos de pesquisa e continua sendo obra básica até os dias de hoje. No Estado de Kerala, na Índia, fundou um jornal, escreveu livros escolares, traduziu obras do sânscrito para o malaiala, inclusive um documento budista dos primeiros séculos da era cristã. Casou-se, na Índia, com Julie Dubois, filha de calvinistas da região de Genebra, com quem teve dez filhos, entre os quais Marie Gundert, a mãe de Hermann Hesse. Julie Dubois (avó de Hermann Hesse) nunca chegou a falar e escrever o alemão corretamente, mas, além de sua língua materna, o francês, dominava perfeitamente o inglês e o indu e vários dialetos. Cultivava uma vida ascética, era rigorosa e intransigente.

Gundert regressou à Alemanha em 1859 e assumiu uma editora de literatura religiosa. Viveu em Calw por mais 33 anos, dedicou grande parte desse tempo às pesquisas linguísticas. No Estado indu de Kerala, Gundert é respeitado como grande cientista linguístico. O Estado o homenageou com monumento, nome de rua e placa comemorativa. Gundert escreveu mais de oito mil cartas, que foram usadas por um de seus genros, Johannes Hesse, o pai de Hermann Hesse, para publicação de uma biografia sobre o sogro.

Johannes Hesse (1847-1916), filho do dr. Carl Hermann Hesse, nasceu em Weissenstein, na Estônia. Hermann Hesse — com um avô paterno russo casado com uma alemã, um avô materno alemão casado com uma francesa; o pai russo casado com uma alemã e ele próprio nascido em Calw — tinha dúvidas quanto a sua nacionalidade. Em suas notas autobiográficas, escreve: “Naquela época eu não sabia qual era a minha nacionalidade, provavelmente russa, pois meu pai foi súdito russo e tinha um passaporte russo; a mãe, nascida na Índia, era filha de um suábio e de uma francesa-suíça. Tal origem mesclada impediu-me de ter maior respeito perante nacionalismos e limites fronteiriços”.

Em 1919, ao decidir que a região da Floresta Negra era a sua origem, berço, cultura, pátria, Hermann Hesse passa a se considerar cidadão alemão. Segundo as leis vigentes da época, como filho de um missionário alemão-báltico (russo) casado com uma mulher nascida na Índia, oficialmente o escritor era cidadão russo. Entre 1883 e 1890 e a partir de 1923 tornou-se cidadão suíço. No entremeio, tinha também os direitos de cidadania do Estado alemão de Baden-Württemberg.

Johannes Hesse, pai de Hermann, indivíduo franzino, nervoso, leitor incansável, laborioso em anotar e registrar tudo que lia, ouvia e observava, aos 16 anos resolveu ser missionário. Seus textos, escritos nessa idade, não revelam nenhum fanatismo; ao contrário, era um homem pensativo e ponderado. Além da biografia sobre o sogro, escreveu outras 16 obras. Na Índia, a serviço missionário, casou-se com a viúva Marie Gundert, a filha de Hermann Gundert. Marie Gundert, mãe de Hermann Hesse, era escritora. Publicou vários livros, entre os quais encontra-se uma biografia sobre o naturalista inglês David Livingstone. Falava um inglês impecável, razão pela qual os pais de Hermann Hesse costumavam comunicar-se em inglês.

Hermann Hesse conheceu muito bem o avô materno, Hermann Gundert, com o qual manteve estreito contato. Tinha-o em grande conta e dedicava-lhe uma imensa afeição. No texto autobiográfico “A Meninice de um Mágico”, Hermann Hesse fala com sentimentalismo sobre o avô: “E todas essas coisas pertenciam ao avô, e ele, o idoso, respeitado, po­deroso, com sua densa barba branca, sabia tudo, mais poderoso do que meu pai e minha mãe, estava em poder de muitas outras coisas e poderes… sua sala e sua biblioteca, ele era também um mágico, um homem que sabia de tudo, um sábio. Ele entendia todas as línguas dos homens, mais do que trinta, talvez também a língua dos deuses, talvez a língua das estrelas, ele escrevia e falava o páli e o sânscrito, falava e cantava canções em canarês, bengalês, hindustâni e singalês e recitava orações e textos dos muçulmanos na língua destes. Recebia muitas visitas e eles falavam em todas as línguas”.

Diante desse manancial cultural, com vários escritores entre seus ancestrais, o pequeno Hermann Hesse, fortemente influenciado pelo avô materno e pelo próprio pai, teve, desde tenra idade, uma educação condicionada ao preparo do serviço missionário, como foram seus pais, avós e bisavós. Sob o peso da profunda religiosidade, o jovem Hesse decidiu não se tornar “vassalo de Deus”. Começam assim os conflitos com Johannes, que, embora não fosse um pai extremado, queria o filho como missionário. Prova disso é o fato de que o pai começou a ministrar-lhe aulas de latim desde a infância. Hermann Hesse, mais tarde, comenta esse período em “Meninice de um Mágico”: “Até a idade de 13 anos nunca me preocupei com o que seria da minha vida futura e que profissão deveria seguir”. Uma das coisas que Hermann admirava em seu pai, que falava várias línguas, era o seu estilo claro e preciso ao usar a língua alemã.

Os primeiros intensos abalos psíquicos que Hermann sofreu aconteceram durante seus primeiros quatro anos de ensino elementar na escola que frequentava em Calw, com o irmão mais novo, Hans (1882-1935). Os métodos educacionais eram rígidos. Castigos corporais eram medidas usuais aceitas tanto pelos pais como pelas autoridades. Abusos, com graves lesões corporais, eram frequentes e impunes. Hans sofreu um trauma escolar em virtude dos métodos educacionais pelos quais passou e do qual não conseguiu livrar-se durante o resto de sua curta vida, que terminaria em suicídio. Hermann Hesse abordou essa tragédia nos livros “Demian”, “O Jogo das Contas de Vidro” e “Debaixo das Rodas”. Nessa a personagem principal, Hans Gie­benrath, em referência a seu irmão morto, é retratada como vítima dos métodos educacionais. Nessa obra encontra-se a seguinte passagem: “A escola é a única instituição cultural que, apesar de levar a sério, me irrita. Em mim a escola estragou muita coisa e conheço poucas personalidades que não passaram pela mesma experiência. Para sobreviver nesse ambiente você precisa aprender a mentir e o irmão Hans era um menino sério e é por isso que na escola em Calw quase o mataram, quebraram-lhe a espinha dorsal”.

Em 1891, o pai matriculou Hermann Hesse, de 14 anos, no renomado mosteiro de Maulbronn, onde o avô materno estudara. O astrônomo Johannes Kepler, que nasceu em Weil der Stadt, pequena localidade a nove quilômetros de Calw, frequentou o mesmo ginásio do mosteiro de Maulbronn, três séculos antes de Hermann Hesse (de 1586 a 1589).

“Serei escritor ou nada”

Hermann Hesse
Em Maulbronn, o seminarista Hermann Hesse redigiu algumas peças de teatro em latim — que ele mesmo ensaiava com colegas e as apresentava aos alunos internos. Suas cartas aos pais eram em forma de rima e muitas em latim. Ele gostava do ambiente, mas vivia com receio de acabar virando missionário. Resolveu enfrentar o pai escrevendo-lhe uma carta com uma frase derradeira: “Serei escritor ou nada”. Mais tarde Hesse confessa: “Quanto mais avançava em idade, tanto mais compreendi quanta semelhança eu tinha com o meu pai”.

Depois de sete meses em Maulbronn, Hermann fugiu do internato. Só foi encontrado dois dias depois, confuso e transtornado. Após uma tentativa de suicídio, foi internado numa clínica psiquiátrica. Após o tratamento, ingressou num ginásio em Cannstatt, um bairro de Stuttgart. Não suportando o ambiente escolar, Hermann deixou o estabelecimento e começou a trabalhar numa livraria em Esslingen, onde suportou apenas três dias.

Regressou à casa dos pais em Calw e foi trabalhar como aprendiz na firma Perrot, que fabricava relógios para torres de igreja. Permaneceu no emprego por um ano e meio. Durante esse período, aos 17 anos, Hermann Hesse falava seriamente de planos para emigrar para o Brasil, assunto frequente nos seus apontamentos e escritos.

O relacionamento com a mãe Marie era normal e Hermann costumava dizer que a amava. O relacionamento sofreu uma ruptura abrupta numa época em que Hermann já publicara textos, comentários e seu nome já era conhecido. Hermann redigiu um pequeno texto com o título “Minha Mãe”, convencido de que ela o apreciaria. Enganou-se. A mãe, num gesto indelicado, humilhou e reduziu a nada o trabalho do filho. Passado mais de meio século, Hesse recordou com amargura do episódio e disse nunca ter perdoado a mãe.

A partir desse episódio a vida de Hermann Hesse transforma-se numa roda viva. Em 1895 começa a trabalhar numa livraria em Tübingen (que ainda existe), publica algumas poesias e uma obra com o título “Uma Hora Após a Meia-Noite”, escreve regularmente para o jornal suíço “Allgemeine Schweizer Zeitung”, e viaja três meses pela Itália. Ao regressar, trabalha num antiquário em Wattenwyl, na Suíça, e seu romance “Hermann Lauscher” é publicado. Em 1903, volta a viajar pela Itália, desta vez, acompanhado pela fotógrafa Maria Bernoulli. Ao mesmo tempo, publica sua obra “Peter Camenzind” (1904), seu primeiro romance cujo enredo contém muitos paralelos biográficos. “Peter Camenzind” torna-se um best-seller, Hesse casa com Maria Bernoulli e compra uma propriedade em Gaienhofen, no Lago de Constança, na divisa da Alemanha com a Suíça.

Às margens do lago, a criatividade literária de Hermann Hesse desenvolve-se em bom ritmo. Em 1906 publica “Debaixo das Rodas” e em 1910 “Gertrudes”, novela escrita em primeira pessoa, na qual o autor narra os infortúnios de uma dolorosa experiência de amor. Entre 1905 e 1911 nascem os seus três filhos, Bruno, Heiner e Martin. Para distrair-se Hermann Hesse pratica a jardinagem. Na área que circunda a casa, Hesse planta árvores, arbustos e cultiva rosas. Muito do que plantou na época continua a vicejar até hoje sob os cuidados de uma sociedade mantenedora que tem o zelo de conservar a propriedade e cultivar as mesmas plantas, rosas e flores que Hesse cultivara.

Em 1911 Hesse parte para uma viagem à Índia. Queria conhecer o lugar no qual a mãe nascera e onde os pais trabalharam. A viagem estende-se à Indonésia e à China. Ao regressar publica “Da Índia”. Essa viagem à Índia o decepciona por não encontrar lá o que os pais idolatravam.

Enquanto isso Maria Bernoulli começa a ter problemas psíquicos. Hermann Hesse demonstra não ser capaz de lidar e viver com uma situação dessas. Chega à conclusão que, para dar continuidade à sua ocupação literária, precisa de sossego. Maria é internada num hospital psiquiátrico e os três filhos são entregues à tutela de parentes e amigos. Resolve mudar-se para a Suíça. Deixa a propriedade e seus bens em Gaienhofen, leva consigo apenas a sua escrivaninha, vai à Berna onde aloja-se na Casa Welti. Em 1914 publica “Rosshalde”, romance no qual fala do fracasso do matrimônio de um casal de artistas. A obra traz marcantes traços biográficos. Em toda a literatura alemã Hesse é o autor que mais traços autobiográficos incluiu em sua obra.

No início da Primeira Guerra Mundial, Hermann Hesse se engaja em projetos e serviços humanitários. Um de seus trabalhos foi a criação de um grupo que se ocupou com a remessa de livros para presos em campos de concentração. Em 1915 publica “Knulp”, obra na qual o autor mostra ao leitor o quanto o homem depende de convenções sociais.

Em 1916 Hermann Hesse é acometido de uma crise nervosa que o prende por meses no sanatório Sonnmatt, em Lucerna, na Suíça. Tem início uma profunda amizade com o psicanalista J. B. Lang. Nesse estado de espírito publica um artigo contra a guerra sob o pseudônimo de Emil Sinclair e começa a ocupar-se regularmente com a pintura aquarelista.

O guru dos hippies

Hermann Hesse
Em 1919 publica “O Regresso de Zaratustra”, obra dirigida aos jovens: “O mundo não está aí para ser melhorado. Mas vocês estão aí para serem vocês mesmos. Vocês estão aí a fim de que este mundo sombrio, com esse acorde e com esse tom de vocês, fique mais rico. Seja você mesmo e o mundo tornar-se-á mais belo e mais rico”. Paralelamente Hermann Hesse muda-se para a Casa Camuzzi, em Montagnola, no Tessino, onde permanece até 1931.

Ainda em 1919 Hesse publica “Demian”, sob o pseudônimo de Emil Sinclair, e faz amizade com Ruth Wenger, com a qual acaba se casando. O casamento dura apenas três anos, de 1924 a 1927. Em 1921 Hesse começa a escrever “Sidarta”, o qual teve que interromper em virtude de um bloqueio psíquico. Hesse cai em profunda depressão. Começa a sua segunda análise psicanalítica, dessa vez, com o renomado psiquiatra C. G. Jung. Em 1922 termina e publica “Sidarta”, sobre o qual Henry Miller escreveu: “Sidarta é, para mim, um medicamento mais eficiente do que o Novo Testamento”.

Nesse entretempo Hesse publicou várias obras, entre elas, “O Lobo da Estepe” (1927). No mesmo ano Ninon Dolbin aloja-se na Casa Camuzzi, aparentemente como secretária. Em 1931 Hesse começa a escrever “O Jogo das Contas de Vidro” e se casa com Ninon Dolbin. Em 1931 Hesse muda-se para a “Casa Rossa”, uma mansão construída por um abastado admirador, H.C. Bodmer, que deu a Hesse o direito de ocupá-la até a sua morte. No muro da porta de entrada Hermann Hesse prendeu uma tabuleta com os seguintes dizeres: “Não recebo visitas”. Certo dia subiu à montanha seu amigo Thomas Mann. Este, ao ler os dizeres, deu meia-volta. Conta-se que nunca mais os dois escritores voltaram a se encontrar. A “Casa Rossa” hoje é propriedade particular.

Em 1943, doze anos após iniciá-lo, publica sua obra máxima “O Jogo das Contas de Vidro”. Em 1946 Hermann Hesse é agraciado com o Prêmio Nobel de Literatura.

Não é possível comentar todas as obras de Hesse num texto relativamente breve. Além disso, há resenhas de seus livros em mais de cinquenta línguas. Por esta razão procuramos dar especial ênfase ao homem Hermann Hesse, pois é imprescindível conhecê-lo para podermos compreender e fruir o conteúdo, a beleza e a profundidade de sua obra.

Hermann Hesse ainda era vivo e sua obra já tinha sido traduzida para 34 idiomas. “Parece-me que os japoneses são os que melhor me entendem e os que menos me entendem são os americanos. Mas esse também não é o meu mundo. Nunca chegarei lá”, comentou logo após ter recebido o Nobel. Em meados dos anos 1950, o editor Siegfried Unseld recomprou os direitos sobre a obra de Hermann Hesse por 2 mil dólares. Assinado o contrato, Unseld e o antigo editor foram para o almoço, durante o qual o americano disse: “Se o sr. quiser rescindir esse contrato tão desvantajoso, podemos cancelá-lo”. Unseld não o cancelou e, passados dez anos, as obras de Hermann Hesse tornaram-se su­cesso também nos Estados Unidos quando a juventude hippie, à procura de novas alternativas de vida, confrontou-se com os textos de Hesse, este passou a ser visto como uma espécie de guru. Outro fator que contribuiu para o sucesso de Hesse nos Estados Unidos foi a banda “Steppenwolf” (Lobo da Estepe), que adotou o nome do livro e fez com que a obra influenciasse várias gerações.

Hermann Hesse, além de dedicar-se a seus textos, empenhava grande parte de seu tempo em responder cartas de leitores. Nesse particular, supera Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832), o grande autor clássico da literatura alemã, que escreveu mais de 30 mil cartas. Hermann Hesse escreveu mais de 40 mil, a maioria delas ainda estão preservadas. Não apenas trocava correspondência com renomados homens da literatura, como Thomas Mann, Stefan Zweig e Romain Rolland, mas também com políticos, chefes de Estado e com milhares de leitores que lhe escreviam pedindo conselhos ou ajuda para problemas da alma humana. Hesse fazia questão de responder pessoalmente às cartas que recebia. Ao responder às perguntas pessoais de leitores, Hesse costumava apelar à moral, à ética, à tolerância e aos fundamentos básicos do cristianismo do qual tentara livrar-se em Maulbronn.

Até agora apenas parte de suas cartas foram publicadas em dois volumes, está previsto o lançamento de uma edição completa de sua correspondência que deverá abranger um total de dez volumes.

Apenas “ler” Hesse não é suficiente. Para entendê-lo é necessário “encontrá-lo” e a melhor maneira de encontrá-lo é aprofundar-se em sua biografia. Em Calw, sua cidade natal, o município criou o Museu Hesse, no qual encontra-se grande parte de seu acervo. Sua casa em Gaienhofen, que hoje está como ele a deixara, também foi transformada em museu, e em Montagnola, nas montanhas do Lago Lugano, encontra-se a terceira parte de seu acervo.

A única arma que Hesse usou foi a caneta

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É oportuno mencionar um detalhe pouco conhecido da vida de Hermann Hesse: o autor foi grande admirador e profundo conhecedor dos contistas da Renascença Italiana. Em 1920 Hesse selecionou e publicou uma coletânea de 16 contos de autores italianos sob o título “Novellino”, na qual encontram-se cinco títulos de Franco Sacchetti, quatro de Giovanni Fiorentino, dois de Masuccio Salernitano, um de Nicolau Maquiavel, e quatro de autores anônimos. O título de Nicolau Maquiavel é “Belfagor” e foi Hesse que, pela primeira vez, publicou-o em língua alemã. O “Novellino” de Hesse foi republicado na Alemanha numa versão atualizada em 2012.

Otto Maria Carpeaux, ao caracterizar Hesse, escreveu: “A vida de Hesse foi um caminho de sucessivas autolibertações, através de revoltas do individualista contra a escola, contra a família, contra o cristianismo, contra o estilo burguês de vida, contra a guerra, contra a Europa e contra todos os tabus que o lar, a sociedade, a religião e o Estado querem impor”. A caracterização de Carpeaux é correta. Falta apenas um detalhe: a única arma que Hesse usou foi a caneta.

Quem caminha pelas ruas de Calw encontra Hesse como eu o encontrei. Lá está ele, no meio da ponte sobre o Nagold, seu lugar preferido quando menino, em estátua de bronze em tamanho natural, com o seu inseparável chapéu à mão. O escultor deu-lhe um rosto tranquilo, talvez até feliz, e quando nos acercamos temos a impressão que Hesse fala conosco: “Desci por estes barrancos do rio quando menino junto com outros de minha idade. Subíamos na balsa e os balseiros levavam-nos alguns quilômetros rio abaixo onde, numa curva, deixavam-nos saltar à margem donde regressávamos a pé”. A expressão de felicidade estampada em seu rosto parece dizer: “Hoje sei muito bem que nada na vida repugna tanto ao homem do que seguir pelo caminho que o conduz a si mesmo”.

Hermann Hesse morreu em 9 de agosto de 1962, em Montagnola, aos 75 anos. Transcorridos 50 anos, a data foi devidamente lembrada em 9 de agosto de 2012 com cerimônias, festejos, palestras e conferências realizadas durante todo o último trimestre do cinquentenário de seu falecimento ao redor do mundo. Suas obras continuam vivas e hoje, mais do que no passado, o número de leitores e admiradores de Hermann Hesse aumenta em todos os quadrantes. Especialmente na Europa, Estados Unidos, Japão, China, Índia e Coreia do Sul. Hesse continua sendo um autor de interesse universal. Talvez seja esta a verdadeira razão pela qual Hermann Hesse nos cumprimenta com um sorriso feliz lá do alto da ponte de sua cidade natal.