CLÁUDIA LAITANO
Anos atrás, deixei de assinar definitivamente uma revista de circulação nacional depois de ler um artiguete contra o diretor Cacá Diegues. Na época, o que me irritou no texto, além do despropositado tom de linchamento moral, foi o fato de o autor – não identificado, se não me falha a memória – usar um assunto para, de fato, falar de outro. Cacá Diegues era esculhambado de forma covarde não pelo que faz (filmes), mas pelo que pensa (sobre política).
Todo veículo tem direito de expressar claramente seu ponto de vista político e econômico em editoriais e em artigos sobre política e economia, mas quando tudo, do Carnaval ao joguinho de totó, é analisado a partir de uma determinada perspectiva externa ao objeto em si, a chance de se ser intelectualmente desonesto (e de se dizer bobagem) é muito grande. Vale para esquerda, direita e todos seus matizes ideológicos.
O episódio do cancelamento aconteceu já há algum tempo. De lá para cá, o país de alguma forma mimetizou a revista. Ficamos mais sectários – ou pelo menos mais explicitamente sectários. As redes sociais popularizaram uma espécie de pensamento acrítico, disseminado igualmente nos grandes veículos de imprensa, que se esforça para acomodar todos os fatos dentro de uma pauta política, faça sentido ou não. A forçação de barra pode ser pueril ou infame, mas em todos os casos empobrece o debate e desvia o assunto para longe do que devia estar sendo discutido. Na verdade, essa postura dispensa totalmente o debate: antes de saber do que estamos falando, todo mundo já escolheu seu lado.
Três exemplos apenas desta semana. Primeiro, o ridículo. O Ministério da Saúde lançou uma campanha de vacinação nas escolas contra o vírus HPV. Alguns médicos são a favor, outros são contra. Um típico debate em que o público leigo deveria abaixar suas orelhas e apenas ouvir os especialistas de um e de outro lado antes de tomar qualquer posição. Foi o que vários jornais fizeram. Para os que defendem o governo em qualquer situação, porém, a conclusão foi imediata: os jornais estavam ouvindo opiniões contrárias à vacina porque a campanha foi lançada por um governo petista. Simples. Debater para quê, doutor?
Dois exemplos infames. Nesta mesma semana, a deputada federal Manuela D’Avila e a atriz Letícia Spiller foram assaltadas. Em um giro impressionante de eixo de debates, a tragédia pessoal das duas foi usada para atacar suas visões pessoais sobre política e direitos humanos. Aparentemente, pessoas que preferem que criminosos sejam julgados e não linchados, que acreditam que presídios não deveriam funcionar como matadouros e que educação de qualidade pode tirar jovens do caminho do crime merecem ser assaltadas ou, no mínimo, deveriam aproveitar o infortúnio para reavaliar tudo o que pensam sobre justiça social.
É mais ou menos como dizer que a moça que usa minissaia estava pedindo para ser estuprada: pura e simples cafajestice.
Anos atrás, deixei de assinar definitivamente uma revista de circulação nacional depois de ler um artiguete contra o diretor Cacá Diegues. Na época, o que me irritou no texto, além do despropositado tom de linchamento moral, foi o fato de o autor – não identificado, se não me falha a memória – usar um assunto para, de fato, falar de outro. Cacá Diegues era esculhambado de forma covarde não pelo que faz (filmes), mas pelo que pensa (sobre política).
Todo veículo tem direito de expressar claramente seu ponto de vista político e econômico em editoriais e em artigos sobre política e economia, mas quando tudo, do Carnaval ao joguinho de totó, é analisado a partir de uma determinada perspectiva externa ao objeto em si, a chance de se ser intelectualmente desonesto (e de se dizer bobagem) é muito grande. Vale para esquerda, direita e todos seus matizes ideológicos.
O episódio do cancelamento aconteceu já há algum tempo. De lá para cá, o país de alguma forma mimetizou a revista. Ficamos mais sectários – ou pelo menos mais explicitamente sectários. As redes sociais popularizaram uma espécie de pensamento acrítico, disseminado igualmente nos grandes veículos de imprensa, que se esforça para acomodar todos os fatos dentro de uma pauta política, faça sentido ou não. A forçação de barra pode ser pueril ou infame, mas em todos os casos empobrece o debate e desvia o assunto para longe do que devia estar sendo discutido. Na verdade, essa postura dispensa totalmente o debate: antes de saber do que estamos falando, todo mundo já escolheu seu lado.
Três exemplos apenas desta semana. Primeiro, o ridículo. O Ministério da Saúde lançou uma campanha de vacinação nas escolas contra o vírus HPV. Alguns médicos são a favor, outros são contra. Um típico debate em que o público leigo deveria abaixar suas orelhas e apenas ouvir os especialistas de um e de outro lado antes de tomar qualquer posição. Foi o que vários jornais fizeram. Para os que defendem o governo em qualquer situação, porém, a conclusão foi imediata: os jornais estavam ouvindo opiniões contrárias à vacina porque a campanha foi lançada por um governo petista. Simples. Debater para quê, doutor?
Dois exemplos infames. Nesta mesma semana, a deputada federal Manuela D’Avila e a atriz Letícia Spiller foram assaltadas. Em um giro impressionante de eixo de debates, a tragédia pessoal das duas foi usada para atacar suas visões pessoais sobre política e direitos humanos. Aparentemente, pessoas que preferem que criminosos sejam julgados e não linchados, que acreditam que presídios não deveriam funcionar como matadouros e que educação de qualidade pode tirar jovens do caminho do crime merecem ser assaltadas ou, no mínimo, deveriam aproveitar o infortúnio para reavaliar tudo o que pensam sobre justiça social.
É mais ou menos como dizer que a moça que usa minissaia estava pedindo para ser estuprada: pura e simples cafajestice.
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