Hélio Schwartsman*
Acaba hoje o prazo para fazer um lance pela virgindade da estudante brasileira Ingrid Migliorini. Já lhe ofereceram US$ 255 mil pelo direito à primeira noite.
Penso que a jovem está certíssima. Vai levantar
um bom dinheiro para entregar uma simples abstração, que a maioria das meninas
dá de graça a seus namorados. Se há algo chocante na história é o valor que nós,
como espécie, atribuímos à virgindade.
A obsessão se materializa em todos os níveis,
do mais sagrado ao mais profano. Segundo Paul Bloom em "How Pleasure Works", o
termo aparece nada menos do que 700 vezes no Antigo Testamento e ocupa lugar
ainda mais central no cristianismo, com o suposto nascimento virginal de Jesus.
Mesmo no mundo materialista do capitalismo, mulheres gastam pequenas fortunas em
cirurgias de reconstituição do hímen.
Tamanho interesse tem raízes evolutivas. Desde
que a fêmea humana deixou de anunciar ostensivamente seu período fértil, como o
faz a maioria dos primatas, ficou muito mais difícil para o macho ter certeza de
que o filho que ele criaria era mesmo seu. E investir recursos no
desenvolvimento de genes alheios é, em termos biológicos, um desastre. Um modo
de aumentar as chances de o rebento ser legítimo era copular preferencialmente
com virgens.
Se o raciocínio valia no Pleistoceno, não faz
mais nenhum sentido no mundo moderno, em que a mulher pode controlar sua
fertilidade e existem exames de DNA à disposição dos homens mais desconfiados.
Hoje, o conceito de virgindade oscila entre uma relíquia mental da pré-história
e, nas sociedades mais conservadoras, uma forma de tiranizar a mulher.
Antes, porém, de maldizer o processo que levou
a fêmea humana a esconder até de si mesma a ovulação, gerando milênios de
opressão, é bom lembrar que a ocultação do estro resultou também no sexo
recreacional e na formação de relações duradouras entre homem e mulher.
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* Hélio
Schwartsman é bacharel em filosofia, publicou "Aquilae Titicans - O Segredo
de Avicena - Uma Aventura no Afeganistão" em 2001.
Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/helioschwartsman/1168803-o-fim-da-virgindade.shtml
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