Luís Fernando Veríssimo*
Os papas já tiveram o poder de reis. A história da Europa é, em grande parte, a história desta divisão de poder e da luta entre os dois absolutismos, o dos papas e o dos monarcas. O Geoffrey Barraclough (historiador favorito do Paulo Francis quando este ainda era de esquerda e escrevia no “Pasquim”) tinha uma tese segundo a qual a rivalidade de Roma com os reis explicava a superioridade da Europa sobre as sociedades orientais, que já eram civilizadas quando a Europa ainda era terra de bárbaros, mas governadas por dinastias antigas, rígidas e incontestadas, e por isso paradas no tempo. Na Europa, quem não quisesse se submeter a uma monarquia tinha a opção de se submeter à Igreja. A troca era de um império teocrático por outro, claro, mas criou-se o hábito de dissidência e de pensamento dialético, prólogo para o desenvolvimento científico que viria depois, apesar do obscurantismo da Igreja. E a opção determinou que a Europa não fosse um império monolítico, e sim uma coleção de pequenos Estados. Acima de tudo, o pluralismo reforçou a independência e a importância das cidades comerciais – Milão, Palermo, Gênova, Veneza, Marselha, Barcelona, Antuérpia, Southampton, Lisboa, as cidades da Liga Hanseática (o primeiro ensaio de um mercado comum europeu) etc., – cuja competição impulsionaria as descobertas e a expansão colonial. Tudo isto porque os papas eram iguais aos reis, inclusive na pretensão de representarem a vontade de Deus na Terra, com exclusividade.
Dizem que certa vez o Stalin reagiu à notícia de que o Vaticano o teria reprovado, por alguma razão, com a pergunta desdenhosa: “E quantas divisões tem o papa?” Desde que perdeu seu poder que rivalizava com o dos reis, o papa só tem a seu dispor a Guarda Suíça, e assim mesmo para fins decorativos. Mas o Vaticano é o grande exemplo de um Estado cuja potência não se mede com armas – pelo menos não com armas convencionais. Atualmente, a julgar pela recepção que ele teve no Brasil, o arsenal do Vaticano se resume no sorriso simpático de um homem. A Igreja não tem mais a relevância política e histórica que teve antigamente, e sacrificou muito da sua autoridade moral com posições retrógradas e escândalos financeiros e sexuais. Mas a emoção das multidões que ele mobilizou serviria como uma resposta ao Stalin.
Dizem que certa vez o Stalin reagiu à notícia de que o Vaticano o teria reprovado, por alguma razão, com a pergunta desdenhosa: “E quantas divisões tem o papa?” Desde que perdeu seu poder que rivalizava com o dos reis, o papa só tem a seu dispor a Guarda Suíça, e assim mesmo para fins decorativos. Mas o Vaticano é o grande exemplo de um Estado cuja potência não se mede com armas – pelo menos não com armas convencionais. Atualmente, a julgar pela recepção que ele teve no Brasil, o arsenal do Vaticano se resume no sorriso simpático de um homem. A Igreja não tem mais a relevância política e histórica que teve antigamente, e sacrificou muito da sua autoridade moral com posições retrógradas e escândalos financeiros e sexuais. Mas a emoção das multidões que ele mobilizou serviria como uma resposta ao Stalin.
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* Jornalista. Escritor. Colunista da ZH.
Fonte: ZH on line, 29/07/2013
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