André Pereira*
Lamento informar aos mais jovens e aos crédulos empedernidos, de modo inadequado para esta época de festividades cristãs e com o estilo tão abrupto que sempre surpreende meus interlocutores: a felicidade definitivamente não existe.
Pasmem: como o bom velhinho Papai Noel, o coelhinho da Páscoa e a igualdade social, a dita felicidade, com a estabilidade paralisante do funcionalismo público e o lucro selvagem da iniciativa privada, não passa de uma ilusão comercial do marketing religioso de praticamente todas as seitas e promessas eleitorais.
É como a tentação macieira de Eva e Adão contemporâneos seduzidos por apostas lotéricas dos jogos de azar que se justificam pela promessa de golpe de sorte que vai nos livrar da inadimplência existencial. Felicidade é palavra tão desgastada, que a toda hora jogador de futebol usa-a para divulgar, sem nenhuma prova de sensibilidade e com as feições faciais inalteradas, a imensa sensação de que está imbuído no clube, que logo trocará por outro de melhor remuneração.
Estar feliz é um termo tão corriqueiro no vocabulário moderno, que está associado invariavelmente a bens de consumo, com posses devidamente estimuladas pela publicidade que, claro, cumpre seu papel capitalista de vender, com remorsos ou pruridos sepultados sob o som imaginário da caixa registradora dos ganhos superlativos. Um carro zero, uma garota siliconada de glúteos hortifrutigranjeiros ou uma bebida colorida são clichês de felicidade, nos aplicados à exaustão,desde o século passado.
Felicidade plena é uma expressão vocabular que pode ser abolida pela sua completa inadequação vivencial. Mas, principalmente, pelo caráter de alcançabilidade invariavelmente futura de que está impregnada. Desejamos mais felicidades quando emitimos cumprimentos pelo ano vindouro ou por eventos futuros. Ou quando cumprimentamos alguém pelo aniversário ou saudamos por uma formatura em curso acadêmico, almejando sempre o porvir, o tempo que virá.
Uma trajetória de saltos e sobressaltos,calços e percalços, tão antimaterialista quanto antidivinista, me ensina que os melhores instantes da vida só se revelam no cotidiano diário que sempre nos reserva pequenas fortunas de satisfação que, quando verdadeiramente solidárias, sinceras e amistosas, sem pieguice nem egoísmo, legitimam a soma desses momentos que nos fazem sentir bem,especialmente conosco mesmo, aqui e agora,sem nenhuma postergação enganosa.-------------------
*Jornalista
Fonte: ZH online, 21/12/2013
Pasmem: como o bom velhinho Papai Noel, o coelhinho da Páscoa e a igualdade social, a dita felicidade, com a estabilidade paralisante do funcionalismo público e o lucro selvagem da iniciativa privada, não passa de uma ilusão comercial do marketing religioso de praticamente todas as seitas e promessas eleitorais.
É como a tentação macieira de Eva e Adão contemporâneos seduzidos por apostas lotéricas dos jogos de azar que se justificam pela promessa de golpe de sorte que vai nos livrar da inadimplência existencial. Felicidade é palavra tão desgastada, que a toda hora jogador de futebol usa-a para divulgar, sem nenhuma prova de sensibilidade e com as feições faciais inalteradas, a imensa sensação de que está imbuído no clube, que logo trocará por outro de melhor remuneração.
Estar feliz é um termo tão corriqueiro no vocabulário moderno, que está associado invariavelmente a bens de consumo, com posses devidamente estimuladas pela publicidade que, claro, cumpre seu papel capitalista de vender, com remorsos ou pruridos sepultados sob o som imaginário da caixa registradora dos ganhos superlativos. Um carro zero, uma garota siliconada de glúteos hortifrutigranjeiros ou uma bebida colorida são clichês de felicidade, nos aplicados à exaustão,desde o século passado.
Felicidade plena é uma expressão vocabular que pode ser abolida pela sua completa inadequação vivencial. Mas, principalmente, pelo caráter de alcançabilidade invariavelmente futura de que está impregnada. Desejamos mais felicidades quando emitimos cumprimentos pelo ano vindouro ou por eventos futuros. Ou quando cumprimentamos alguém pelo aniversário ou saudamos por uma formatura em curso acadêmico, almejando sempre o porvir, o tempo que virá.
Uma trajetória de saltos e sobressaltos,calços e percalços, tão antimaterialista quanto antidivinista, me ensina que os melhores instantes da vida só se revelam no cotidiano diário que sempre nos reserva pequenas fortunas de satisfação que, quando verdadeiramente solidárias, sinceras e amistosas, sem pieguice nem egoísmo, legitimam a soma desses momentos que nos fazem sentir bem,especialmente conosco mesmo, aqui e agora,sem nenhuma postergação enganosa.-------------------
*Jornalista
Fonte: ZH online, 21/12/2013
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