terça-feira, 21 de abril de 2015

" Lampedusa, A Tragédia de Todos Nós "

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21 de abril de 2015
RODRIGO LOPES
Editor de ZH e professor universitário
rodrigo.lopes@zerohora


Quem decola do aeroporto de Túnis em direção a Roma percebe, pouco depois de o avião atingir altitude de cruzeiro, um punhado de terras no meio do azul mediterrâneo. Mal deixamos um continente de guerras e genocídios para trás e, alguns mil metros abaixo de nós, visualizamos o Eldorado europeu. O punhado de ilhas é o arquipélago de Pelágias. A maior delas é de Lampedusa, território italiano epicentro da tragédia dos imigrantes que confere, nos últimos dias, fotos épicas a ilustrar as capas dos jornais mundiais.
Lampedusa é um portal entre dois mundos: de quem tenta fugir dos conflitos e crises que assolam o norte da África e ingressar no sonho europeu. São apenas 300 quilômetros, por exemplo, entre a Líbia e Lampedusa. Mas, em sua maioria, essas travessias acontecem em condições precárias, comandadas por traficantes de pessoas, que colocam os imigrantes em embarcações pequenas e apertadas, como se fossem navios escravocratas do século 21.
A Europa rica se vê diante de um dilema: forjou seu discurso político na segunda metade do século 20 baseada na defesa intransigente dos direitos humanos. Mas mobilizar recursos para salvar milhares de pessoas em uma operação de massa pode incentivar novas levas de imigrantes. Por enquanto, só a Itália tem resgatado os refugiados. E o restante do continente? Irá se omitir como em Ruanda ou agir tarde como fez nos Bálcãs?

As mortes no Mediterrâneo são um drama silencioso, a conta-gotas, que só de tempos em tempos chama atenção: no ano passado, foram 3,5 mil. A se confirmar o desastre de domingo, quando até 900 pessoas podem ter morrido, será a maior tragédia de uma só vez no Mediterrâneo no pós-guerra.

A crise humanitária tem um componente político: Itália e Grã-Bretanha terão eleições nas próximas semanas. E o assunto imigração está na pauta, alimenta a retórica dos políticos. No momento em que a Europa dá uma guinada à direita, há quem defenda que o continente se feche ainda mais para os refugiados. Até um bloqueio continental é cogitado. O que seria uma vergonha e uma confissão de fracasso daquilo que conhecemos como humanidade.

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