Artigo Zero Hora
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HUMBERTO TREZZI
Jornalista, repórter Especial de ZH
humberto.trezzi@zerohora.com.br
Jornalista, repórter Especial de ZH
humberto.trezzi@zerohora.com.br
Ao ver milhões de dólares e euros desfilarem impunemente pelos depoimentos dos delatores da Lava-Jato me dei conta de quão direta e pueril é a corrupção no Brasil. A única concessão à vergonha, entre os corruptos, era trocar a palavra “propina” por “consultoria”. E voavam fortunas _ literalmente, dentro de malas em aviões _ para azeitar contratos superfaturados, fazendo sangrar a Petrobras e a dona dela, a população brasileira.
Faltou aos vendilhões pegos pela Lava-Jato a sofisticação milenar dos chineses. “Chegar lá”, na China, requer um pouco mais de habilidade e paciência, como tudo num país com 5 mil anos de civilização.
É o que aprendi lendo o excelente Made in China, da antropóloga gaúcha Rosana Pinheiro-Machado, que morou na China para desvendar como funciona a rede da pirataria que se forma naquele país e passa pelo Paraguai, até abastecer os camelódromos do Brasil.
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Tentando resumir de forma tosca um dos pontos essenciais do livro: os chineses prezam muito o guanxi…uma espécie de empatia que resulta em confiança. Só a partir dele se estabelece qualquer negócio. Antes de um contrato, de qualquer menção a dinheiro (deselegante), negociantes estabelecem rodadas de jantares, festas, conversa fiada e muitos presentes (nunca em cédulas, mas delicadezas como um enfeite de porcelana). Tudo sinuoso, como é usual nas sociedades orientais. Ir direto ao ponto é feio.
Muito provável também que nada resulte desses contatos iniciais. O sujeito leva lembranças e agrada o anfitrião sem visar recompensa imediata, mas apenas consolidar amizade. Uma relação que pode render frutos num futuro distante _ ou nem isso. Um “amigo” que pode abrir caminhos na sua carreira, num momento inesperado. Tudo em câmera lenta, avesso à pressa ocidental. É divertido imaginar como um dos corruptos da Petrobras ficaria nervoso diante do negócio que não avança, não se consolida, das sutilezas…
O livro deixa claro que o guanxi permeia relações em qualquer nível social da China, lícitas ou ilícitas, dos mais humildes aos senhores do onipresente Partido Comunista. Corruptos também vão presos e até são fuzilados lá, claro. Mas é bem provável que isso ocorra mais por caírem em desgraça na política do que pelo guanxi capitalizado ao longo das décadas. Nuances
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de um país onde nossos toscos corruptos teriam algo a aprender.
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