sexta-feira, 29 de maio de 2015

" Interioranos "

MOISÉS MENDES

29 de maio de 2015
moisesmoises.mendes@zerohora.com.br
Se a pessoa que anda a sua frente no centro de Porto Alegre caminha olhando para o alto, é óbvio que se trata de um interiorano. Não é um forasteiro de outra cidade grande, é alguém do Interior. O interiorano olha para cima em busca das surpresas da cidade vertical.



Isso é o básico, todo mundo sabe. Mas meu amigo Gustavo Ferenci identifica a origem do interiorano pelo jeito de andar. Não pelo tipo físico ou pelas características étnicas, mas pelo caminhar.

Gustavo é capaz de dizer se alguém andando pela Avenida Otávio Rocha, virando-se para um lado e para o outro, como quem procura a rodoviária, é de Passo Fundo ou de Vacaria. Ele observa o ritmo, a pressa ou a lerdeza, os movimentos dos braços.

Alguém de Bento ou Caxias, por exemplo, anda com as pernas à frente do tronco, como se a parte abaixo da cintura tivesse que chegar sempre antes.


Já o fronteiriço é o contrário. Oriundos de Livramento e de Uruguaiana caminham com o tronco para a frente e com as mãos nos bolsos. Cabeça e peito chegam antes das pernas. Preste atenção nos que andam de bota e bombacha. É a ciência do Gustavo.


A passada do fronteiriço também é mais larga e mais firme. E há um molejamento de tronco. Já o morador do litoral é parecido com o da Capital, com a diferença de que anda mais devagar e quase arrastando os pés _ pelo costume de andar de chinelos na areia.

São estudos empíricos da antropologia ferenciana. Gustavo fica uma hora debatendo as possíveis diferenças entre o tipo de Quaraí e Itaqui, por exemplo. São mínimas.
Ele se inspira nos estudos do grande Claude Lévi-Strauss, que observava tudo, dos índios aos japoneses, para concluir que não há superioridades entre povos, como não há diferenças fundamentais entre o que seria o civilizado e o primitivo.

Pelos estudos de Gustavo, conclui-se que, apesar das peculiaridades, também não há distinções fundamentais entre o interiorano e o morador da Capital _ além da fala e do jeito de caminhar
.
O homem da Capital, concluiu Gustavo, caminha quase sempre olhando para o chão. Preste atenção nos pedestres da Rua dos Andradas. E quem caminha olhando para baixo não pode se achar superior a quem perscruta a cidade olhando para o alto. Pena que Lévi-Strauss tenha morrido sem falar com o Gustavo.

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