terça-feira, 8 de outubro de 2013

" Uns quinze minutos " << Luís Augusto Fischer >>


Tornar-se leitor: tarefa que vai de bem simples a muito complexa. Para quem não tem fluência de leitura no sentido mecânico da coisa, para quem não convive com livros (e jornais, revistas, internet) e para quem não tem exemplos positivos por perto, o objetivo parece inalcançável. Mas até esses podem vir a ser leitores.

Depende, claro, do que a gente considerar como “ser leitor”. Pensemos num conceito mínimo: leitor é o cara que para para ler, não importa em qual suporte (livro, revista, meio digital) nem qual gênero de texto (romance, ensaio, poesia, livro de ensinamento prático, livro de religião). Para para ler: o leitor precisa sair do fluxo rotineiro, afastar-se da pressa de realizar coisas de necessidade imediata, se entregar ao texto – para poder ter alguma intensidade na viagem mental que a leitura proporciona e exige. Digamos 15 minutos, para começar. Nada além de 15 minutos.

Ora, um quarto de hora na companhia de um texto, especialmente se for um texto de qualidade, em qualquer gênero ou suporte, já dá um caldo. Aliás, 15 minutos bastam para muita coisa: para o cara começar a gostar de estar numa companhia; para entrever a grande qualidade de um amigo; para perceber o abismo de uma dor; para abrir espaço interno adequado para acompanhar qualquer narrativa longa, de filme a telenovela. Quinze minutos bastam para o sujeito começar a perceber a força da sua própria vida mental e espiritual, reserva que qualquer um traz junto consigo, invisível.

Funciona assim em tudo, é claro. Fumantes (eu fumei por um tempo tão longo...) não conseguem se imaginar sem o cigarro. Mas quando reúnem força suficiente, percebem, felizes, que um primeiro dia sem fumo pode acontecer. Depois um segundo e um terceiro.

Mal comparando, o leitor pode nascer de um processo assim. Um dia com 15 minutos de leitura, que possivelmente vai ser confusa ou irrelevante. Um segundo dia com outros 15, não mais do que 15; e a simples retomada da impressão do dia anterior vai compor sentido novo. Não demora, vão se passar uns quantos dias, e a sucessão vai fazer brotar uma nova percepção daquilo que a leitura traz e daquilo que o leitor aporta, sem nem mesmo perceber, ao ato da leitura.

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