MARIO CORSO
Sou avesso a rituais. Nada me aborrece mais do que casamentos, formaturas, missa para qualquer coisa, aniversários pomposos, tudo o que pede protocolo e roupa apropriada. Vou, mas como gato no cabresto. Admito que sou um chato, que dificilmente entro na frequência das emoções alheias. Pelo menos não estou sozinho, meu desconforto traz algo da minha geração, ou pelo menos, parte dela. Deixem dizer algo em nossa defesa: não se trata de misantropia gratuita.
Quem nasceu nos anos 50 e 60 viveu, fez, ou sofreu a revolução dos costumes. Depois dessa revolução, o mundo nunca mais foi o mesmo. Graças a ela, a vida ficou menos hipócrita, mais transparente, mais livre da opinião alheia. Mas num quesito esse movimento tomou um rumo que não imaginávamos: os rituais. Pensávamos que eles iriam declinar, que o importante era viver e não representar.
Nos anos 70 e 80, eles andaram em baixa. Eu recusei a crisma, minha formatura foi em gabinete e, para os padrões de hoje, meu casamento foi espartano. Mas voltaram redobrados, hoje temos formatura togada de 1º e 2º graus... quiçá de jardim de infância. Qualquer aniversário de criança é principesco, os casamentos são todos apoteóticos. A simplicidade foi esquecida.
Para usar uma gíria antiga, o mundo voltou a ser “careta”? Não creio, aliás, foi só nesse quesito que parece que engatamos a ré. Questões sobre igualdade de gênero, ou melhor, a dissolução das certezas sobre os gêneros seguem avançando. Para meu gosto, o mundo não é lá grande coisa, mas está mais arejado. O que aconteceu então?
A minha geração não levou em conta os avisos de Guy Debord quando escreveu A Sociedade do Espetáculo. Ele abordava a espetacularização da política, e a mídia tratando tudo como um show. Ora, o desdobramento disso para a vida privada é uma decorrência lógica desse processo. Para o autor, a vida esvaziou-se de sentido e inflacionou-se de imagens.
Creio que os rituais não esmoreceram, e até ganharam mais prestígio, por fornecer essas imagens que atestam que a vida acontece. Inclusive a palavra ritual nem deveria ser usada, pois eles já não marcam uma passagem, não fazem uma descontinuidade na vida, um antes e um depois diferentes. Talvez sejam feitos em uma dose mais forte até para fazer valer algo que não consiste.
Minha geração se sente traída ao ver essas cerimônias desmedidas e por isso fica tão mal-humorada quando nos exigem a gravata. Eu já estou mais conformado, talvez esses eventos não estejam esvaziados de sentido e, sim, sejam uma nova forma de experiência, nem melhor nem pior, outra. O mundo segue, não vou deixar de viver as emoções de meus amigos e familiares. Tento deixar de ser casmurro, já comprei as gravatas, mas ainda não sei dar nó.
Sou avesso a rituais. Nada me aborrece mais do que casamentos, formaturas, missa para qualquer coisa, aniversários pomposos, tudo o que pede protocolo e roupa apropriada. Vou, mas como gato no cabresto. Admito que sou um chato, que dificilmente entro na frequência das emoções alheias. Pelo menos não estou sozinho, meu desconforto traz algo da minha geração, ou pelo menos, parte dela. Deixem dizer algo em nossa defesa: não se trata de misantropia gratuita.
Quem nasceu nos anos 50 e 60 viveu, fez, ou sofreu a revolução dos costumes. Depois dessa revolução, o mundo nunca mais foi o mesmo. Graças a ela, a vida ficou menos hipócrita, mais transparente, mais livre da opinião alheia. Mas num quesito esse movimento tomou um rumo que não imaginávamos: os rituais. Pensávamos que eles iriam declinar, que o importante era viver e não representar.
Nos anos 70 e 80, eles andaram em baixa. Eu recusei a crisma, minha formatura foi em gabinete e, para os padrões de hoje, meu casamento foi espartano. Mas voltaram redobrados, hoje temos formatura togada de 1º e 2º graus... quiçá de jardim de infância. Qualquer aniversário de criança é principesco, os casamentos são todos apoteóticos. A simplicidade foi esquecida.
Para usar uma gíria antiga, o mundo voltou a ser “careta”? Não creio, aliás, foi só nesse quesito que parece que engatamos a ré. Questões sobre igualdade de gênero, ou melhor, a dissolução das certezas sobre os gêneros seguem avançando. Para meu gosto, o mundo não é lá grande coisa, mas está mais arejado. O que aconteceu então?
A minha geração não levou em conta os avisos de Guy Debord quando escreveu A Sociedade do Espetáculo. Ele abordava a espetacularização da política, e a mídia tratando tudo como um show. Ora, o desdobramento disso para a vida privada é uma decorrência lógica desse processo. Para o autor, a vida esvaziou-se de sentido e inflacionou-se de imagens.
Creio que os rituais não esmoreceram, e até ganharam mais prestígio, por fornecer essas imagens que atestam que a vida acontece. Inclusive a palavra ritual nem deveria ser usada, pois eles já não marcam uma passagem, não fazem uma descontinuidade na vida, um antes e um depois diferentes. Talvez sejam feitos em uma dose mais forte até para fazer valer algo que não consiste.
Minha geração se sente traída ao ver essas cerimônias desmedidas e por isso fica tão mal-humorada quando nos exigem a gravata. Eu já estou mais conformado, talvez esses eventos não estejam esvaziados de sentido e, sim, sejam uma nova forma de experiência, nem melhor nem pior, outra. O mundo segue, não vou deixar de viver as emoções de meus amigos e familiares. Tento deixar de ser casmurro, já comprei as gravatas, mas ainda não sei dar nó.
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