Siro Darlan *
Viver em grandes cidades é um exercício de
solidão na multidão.
A vida urbana, a arquitetura e o urbanismo nas grandes
cidades faz com que voltemos ao início da civilização quando não havia a
linguagem escrita e vivíamos no isolamento da imensidão de terras ainda não
habitadas.
Nas grandes urbes as edificações são o reflexo das classes sociais.
Enquanto os ricos vivem em moradas de luxo, próximo dos serviços, do lazer e com
comodidade, os pobres são categorizados segundo o espaço em que habitam e a
falta de comunicação com o exterior. Na periferia e nas favelas faltam serviços
públicos, áreas de lazer e o transporte é caro, longe e de péssima
qualidade.
Assim como as pessoas, os logradouros e ruas
são paralelos e não se encontram. O progresso dos meios de comunicação das redes
sociais criados para aproximar as pessoas, paradoxalmente as afasta isolando-as
eis que transformaram o universo imenso numa telinha de computador onde tudo
encontram e tudo fazem: compram, vendem, ouvem musicas, assistem filmes,
conversam, interagem e até fazem sexo sem o contato físico. O paradoxo do nosso
tempo é que temos edifícios mais altos e temperamentos mais reduzidos.
Esse egoísmo comunicacional atinge até mesmo os
animais contaminados pela neurose urbana que adquirem as mesmas doenças
psicóticas dos humanos chegando até ao suicídio. O isolamento das pessoas além
das doenças refletidas nas grandes cidades leva ao desgaste físico e mental
aumentando o consumo de medicamentos psicotrópicos e inibindo os exercícios
físicos. Cada vez temos mais conforto e menos tempo para o outro.
A falta de comunicação e contatos físicos
também traz consequências psicológicas no próprio desempenho sexual, levando a
falta de libido e impotência, além das doenças já epidêmicas como diabetes,
hipertensão e obesidade. Apesar dessas conquistas na área da comunicação o homem
se sente oprimido e deprimido por essa falta de interação entre os humanos e a
arquitetura e o urbanismo refletem esse drama nas coisas mais simples como o
excesso de fios que impede a visão do céu, das nuvens e das estrelas. A teia
criada pelas fiações prejudicam até mesmo as expressões culturais mais
importantes como a literatura e a poesia porque nos afasta de nossas
tradicionais e universais inspirações. Conquistamos o espaço exterior, mas não o
interior.
O excesso de construções não planejadas criando
contrastes entre os estilos e o social faz surgir espaços neutros e de pouca
utilidade que chamam de “medianeiras” onde o consumismo tira proveitos com
publicidade. Alguns, mais inspirados e criativos, buscam nesses espaços
possibilidades ilegais de se encontrarem com a luz, o ar e o mundo
exterior.
No fundo essa neurose urbana leva as pessoas a
se procurarem sem se encontrarem. Muitas vezes vivem porta com porta, mas não se
encontram porque não se comunicam. Conseguimos ir à lua e voltar, mas temos
dificuldades em cruzar a rua para conhecer um novo vizinho. São como as ruas
paralelas que estão tão próximas, mas tão distantes. Enfim olhar na tela de
computador é uma busca dos outro olhando para o espelho da informática.As
estradas são cada vez mais largas e o ponto de vista mais estreito. A tecnologia
é de suma importância para o progresso da humanidade, mas nada será tão
importante quanto o olhar para o outro com sensibilidade e respeito.
Prospera cada vez mais o uso dos aparelhos
eletrônicos para que cada um olhe para sí sem ver o outro. Têm-se mais
graduações, mas menos sentimentos comuns. Assim é que cada vez mais as pessoas
buscam se retratar em autorretratos, os chamados “selfies” ainda que tenham do
seu lado pessoas atraentes, charmosas e interessantes.
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* Desembargado do
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e Coordenador Rio da Associação Juízes
para a democraciaFonte: Jornal do Brasil
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