quinta-feira, 23 de outubro de 2014

" Olhar e Dar Ouvidos Aos Invisíveis "

Artigo Zero Hora


CLÓVIS MALTA
Jornalista
clovis.malta@zerohora.com.br

Estamos aí há meses ouvindo discursos de candidatos e mal percebemos que muitos temas relevantes são ignorados, mas já motivam alguns brasileiros a se adiantar e a fazer sua parte.

 Exemplo disso é a iniciativa de moradores de grandes centros urbanos de usar as redes sociais para dar visibilidade a quem não costuma ser visto ou ouvido: os moradores de rua. Uma das comunidades no Facebook se chama Porto Alegre Invisível.

 Segue o mesmo padrão das páginas criadas para São Paulo, que ontem ganhou destaque no programa televisivo Encontro com Fátima Bernardes, e para o Rio de Janeiro, entre  outras cidades.

 O objetivo é simplesmente chamar a atenção para a pessoa de rosto maltratado, de cabelos em desalinho, de expressão de carência que ninguém vê, ou não quer ver, por razões nem sempre fáceis de entender.

É pouco? É muito para quem tantos de nós gostaríamos de ver fazendo qualquer outra coisa, menos vivendo ao relento? É um começo. Quem não esbarra ou se esquiva de pelo menos uma face muitas vezes ameaçadora de sem-teto a cada dia?
 São esses rostos que as páginas em busca de mais visibilidade para quem não tem um lar, nem uma família, nem dinheiro suficiente, nem cama quente e macia, nem refeições regulares, se preocupam em mostrar. 

E isso numa rede onde predominam o fake e um mundo idealizado, de cenários majestosos e fotos retocadas. 
Junto de cada retrato, há um resumo da história de cada um, com relatos de desamparo, de drogas, de álcool, de carência, mas também de crença na vida, de vontade de mudar, de receber ao menos um olhar, um bom-dia, um abraço. Há inclusive quem se mostre solidário, querendo dividir o pouco que tem _ até comida.

A primeira iniciativa concreta de dar voz a quem não tem da qual ouvi falar foi a do lama Padma Samten. Quando se viram cercados por ocupações, o que fizeram os moradores da comunidade budista na qual se dedicam a meditar e a recitar mantras, em Viamão? Saíram de casa em casa, perguntando coisas como: Qual o seu sonho? Tem foto sua? Da família? Deram voz e rosto a cada um. E viveram em paz para sempre.

A criação de perfis de sem-teto nas redes sociais ajuda a mostrar o ser humano atrás de cada rosto sofrido, numa escala sem limites. Sem o reconhecimento do que se é, como pessoa, não há como falar em dignidade.

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