Artigo Zero Hora BIOÉTICA, BIOPOLÍTICA E BIOPODER
23 de outubro de 20140
JOSÉ ROBERTO GOLDIM
Professor de Bioética
Professor de Bioética
Algumas empresas norte-americanas estão incluindo, entre os benefícios aos seus trabalhadores, o pagamento para o congelamento de óvulos. Esse é um exemplo do que Foucault denominou de Biopoder, entendido como sendo uma forma de “explorar numerosas e diversas técnicas para subjugar os corpos e controlar a população”.
O congelamento de óvulos humanos, projetado para tratar ou evitar a infertilidade de mulheres, não é isento de riscos, pois as expõem à estimulação hormonal e à coleta invasiva de óvulos. A taxa de sucesso deste procedimento é inversamente proporcional à idade da mulher no momento da coleta dos óvulos.
O Biopoder, antes associado aos Estados, agora é exercido pelas organizações. Este procedimento médico é utilizado, indevidamente, como uma estratégia biopolítica, considerando o corpo como um mero objeto. A antiga Biopolítica, que era entendida como “matar ou deixar viver”, passou a ser “fazer viver e deixar morrer”, e agora como “adiar o fazer viver”.
Como em várias outras situações, o que foi um desenvolvimento científico voltado a melhorar o viver das pessoas acaba sendo utilizado com outras finalidades.
Financiar este procedimento como um benefício associado ao trabalho das pessoas pode ser entendido como uma indução a postergar o projeto de ter filhos, com a finalidade de reduzir o afastamento do trabalho e de não interromper a carreira profissional. Paradoxalmente, o sistema de saúde do Reino Unido negou a solicitação de pagamento para o congelamento de óvulos, visando uma reprodução futura, para uma paciente com indicação de realizar uma quimioterapia. Não se garante o financiamento para a real finalidade deste procedimento, mas sim o seu desvio.
O impacto e as repercussões destas novas estratégias e apropriações na vida e no viver das pessoas exige que se faça uma reflexão bioética de forma compartilhada com toda a sociedade. É necessário que se incluam diferentes referenciais teóricos a esta reflexão, ultrapassando apenas a questão da autonomia das pessoas e dos benefícios eventualmente associados.
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