Bertrand Russell (1872-1970) |
Três paixões, simples, mas irresistivelmente
fortes, governaram-me a vida: o anseio de amor, a busca do conhecimento e a
dolorosa piedade pelo sofrimento da humanidade.
Tais paixões, como grandes vendavais,
impeliram-me para aqui e acolá, em curso, instável, por sobre o profundo oceano
de angústia, chegando às raias do desespero.
Busquei, primeiro, o amor, porque ele produz
êxtase – um êxtase tão grande que, não raro, eu sacrificava todo o resto da
minha vida por umas poucas horas dessa alegria. Ambicionava-o, ainda, porque o
amor nos liberta da solidão – essa solidão terrível através da qual nossa
trêmula percepção observa, além dos limites do mundo, esse abismo frio e
exânime. Busquei-o, finalmente, porque vi na união do amor, numa miniatura
mística, algo que prefigurava a visão que os santos e os poetas imaginavam. Eis
o que busquei e, embora isso possa parecer demasiado bom para a vida humana, foi
isso que – afinal – encontrei.
Com paixão igual, busquei o conhecimento. Eu
queria compreender o coração dos homens. Gostaria de saber por que cintilam as
estrelas. E procurei apreender a força pitagórica pela qual o número permanece
acima do fluxo dos acontecimentos. Um pouco disto, mas não muito, eu o
consegui.
Amor e conhecimento, até ao ponto em que são
possíveis, conduzem para o alto, rumo ao céu. Mas a piedade sempre me trazia de
volta à terra. Ecos de gritos de dor ecoavam em meu coração. Crianças famintas,
vítimas torturadas por opressores, velhos desvalidos a construir um fardo para
seus filhos, e todo o mundo de solidão, pobreza e sofrimentos, convertem numa
irrisão o que deveria ser a vida humana. Anseio por afastar o mal, mas não
posso, e também sofro.
Eis o que tem sido a minha vida. Tenho-a
considerado digna de ser vivida e, de bom grado, tornaria a vivê-la, se me fosse
dada tal oportunidade.
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(Bertrand
Russell, Autobiografia. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira,
1967.)
Fonte:
http://luzecalor.blogspot.fr/2013/01/23
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