Martha Medeiros*
Peguei um táxi rumo ao aeroporto e
antes mesmo de percorrer cem metros percebi que o motorista estava com sua
atenção voltada para qualquer outro lugar, menos para o que acontecia diante do
volante, já que enviou uma mensagem pelo celular em meio ao trânsito. Resolvida
sua emergência, recolocou o aparelho no bolso da camisa e, quando achei que
iríamos tranquilos até o nosso destino, ele começou a procurar algo no
porta-luvas, primeiro só através do tato, mirando em frente enquanto dirigia,
até que resolveu dar uma espiada lá dentro. Foi quando se deu o estrondo. Nossa,
que susto. Metade do carro estava em cima da calçada. Por sorte, não havia um
poste e tampouco algum pedestre caminhando por ali. Ele subiu o cordão e
estourou os dois pneus do lado direito, o dianteiro e o traseiro. Mal havia
começado seu turno de trabalho e o dia, para ele, já estava perdido. Saí do
veículo, pedi para retirar minha mala, e ele, avexado com a situação,
providenciou outro táxi para me levar ao aeroporto – mas cobrou a corrida até
ali, e paguei, porque me deu pena daquele mané, mesmo ele tendo feito tanta
gente correr risco sem necessidade. O que ele procurava de tão importante
naquele porta-luvas que não poderia esperar um sinal fechar? Mané.
Ao dirigir, estamos constantemente sendo atraídos por coisas diversas: a bolsa que caiu do banco durante uma travada, a troca da faixa de música, o cabelo que está sobre os olhos e o retrovisor ajuda a ajeitar, o cartaz de promoção em frente ao supermercado, o isqueiro perdido no porta-luvas – ah, o porta-luvas. Tudo convida a um segundo fatal de distração.
Eu faço muito disso também. Não há quem consiga guiar vidrado, rígido, sem piscar nem virar o pescoço um segundinho. Digo mais: eu nem deveria dar carona para pessoas que vejo pouco e que exigem atualização da conversa durante o trajeto, pois isso também me tira a concentração. E não me aponte o dedo, somos muitos: outro dia fui levada a passear por uma amiga que não via há anos, tínhamos milhões de assuntos pendentes e, enquanto conversávamos, ela cometeu um bom número de barbeiragens. Ao chegarmos a sua casa, assumiu: “Sou boa pilota só quando estou sozinha”. Nem precisava explicar. Almas gêmeas.
Se você também está se reconhecendo, anote: somos todos manés. Podemos causar acidentes sérios, podemos matar e morrer só porque demos uma espiada para checar se havia luz na janela do apartamento de um amigo e não percebemos que o motorista da frente freou de repente. Bum.
Estando com o carro em movimento, nada de celular, nada de passar batom, nada de juntar o que caiu no chão, nada de espiar a vizinhança, nada de procurar bobagens no porta-luvas, nada de conferir vitrines com o olho espichado, nada de paquerar quem está caminhando na calçada. Dois pneus furados são uma chatice, mas o taxista deveria comemorar o saldo daquela sua distração, e eu também. Basta um segundo, e o “em frente” pode deixar de existir.
Ao dirigir, estamos constantemente sendo atraídos por coisas diversas: a bolsa que caiu do banco durante uma travada, a troca da faixa de música, o cabelo que está sobre os olhos e o retrovisor ajuda a ajeitar, o cartaz de promoção em frente ao supermercado, o isqueiro perdido no porta-luvas – ah, o porta-luvas. Tudo convida a um segundo fatal de distração.
Eu faço muito disso também. Não há quem consiga guiar vidrado, rígido, sem piscar nem virar o pescoço um segundinho. Digo mais: eu nem deveria dar carona para pessoas que vejo pouco e que exigem atualização da conversa durante o trajeto, pois isso também me tira a concentração. E não me aponte o dedo, somos muitos: outro dia fui levada a passear por uma amiga que não via há anos, tínhamos milhões de assuntos pendentes e, enquanto conversávamos, ela cometeu um bom número de barbeiragens. Ao chegarmos a sua casa, assumiu: “Sou boa pilota só quando estou sozinha”. Nem precisava explicar. Almas gêmeas.
Se você também está se reconhecendo, anote: somos todos manés. Podemos causar acidentes sérios, podemos matar e morrer só porque demos uma espiada para checar se havia luz na janela do apartamento de um amigo e não percebemos que o motorista da frente freou de repente. Bum.
Estando com o carro em movimento, nada de celular, nada de passar batom, nada de juntar o que caiu no chão, nada de espiar a vizinhança, nada de procurar bobagens no porta-luvas, nada de conferir vitrines com o olho espichado, nada de paquerar quem está caminhando na calçada. Dois pneus furados são uma chatice, mas o taxista deveria comemorar o saldo daquela sua distração, e eu também. Basta um segundo, e o “em frente” pode deixar de existir.
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* Escritora. Cronista da ZH
Fonte: ZH on line, 16/01/2013
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