quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

" Ideias que matam - como aprender línguas "


19 de fevereiro de 2015 




Povo nenhum tem ideologia. Povo nenhum é de esquerda ou de direita. Povo mesmo, o comum das gentes, o que o povo quer é viver bem e morrer em paz. Se essas necessidades forem atendidas, pouco importa se quem governa é o Médici, o Lula, o Fidel ou o Obama.

Igualdade? Liberdade?

Um pouco de desigualdade não incomoda ninguém. E a ânsia de liberdade só palpita no peito depois que o estômago parar de palpitar. A liberdade é um requinte, uma obra do intelecto.

Não acreditar em ideologias é prova da sabedoria popular. Na história do mundo, as ideologias cometeram muito mais atrocidades e assassinatos do que as religiões, e isso que as religiões são bem mais antigas.

As ideologias foram inventadas pela Revolução Francesa. Antes, não se precisava de hipocrisia para matar. Quando um país entrava em guerra com outro, estava claro que era por poder ou por dinheiro. Ou por acinte, como no caso dos gregos, que não perdoaram os troianos pelo rapto de Helena de Esparta. O que não admira: ela era mais linda do que Afrodite, a sinuosa deusa do amor. É como se os paraguaios nos roubassem a Paolla Oliveira.

Claro que isso de fazer guerra por uma mulher serve à literatura, não à História, embora as duas, literatura e História, sejam irmãs. No caso da citada Guerra de Troia, irmãs gêmeas – foi por causa da literatura do grego Homero que o alemão Schliemann descobriu Troia, para gáudio da História.

Johann Ludwig Heinrich Julius Schliemann tinha capacidade cerebral maior do que seu nome. Era um gênio. Quando completou sete anos de idade, ganhou do pai um livro que fazia menção aos clássicos de Homero, a Ilíada e a Odisseia. As façanhas de Ulisses e Aquiles o encantaram, e ele pediu ao pai que lhe falasse mais a respeito.

O velho Schliemann devia ser grande contador de histórias, porque aquilo mudou a vida do filho para sempre. Mais: aquela singela narração paterna deu sentido à vida de Heinrich, fazendo com que se tornasse imortal, tanto que hoje, quase 200 anos depois, estou escrevendo sobre ele, em vez de me solidarizar com o Felipão ou contar o que sofri na mesma altura do mundo em que o Inter sofreu.

O pequerrucho Heinrich, em sua inocência, jurou de punho cerrado que um dia encontraria Troia. Mas sua família não tinha posses e, aos 14 anos, ele teve de parar de estudar para trabalhar numa mercearia. Um dia, um bêbado entrou no lugar declamando algo em língua estranha. Schliemann perguntou do que se tratava. O outro respondeu que era Homero puro. Aquilo era grego para Schliemann, mas ele pediu que o bêbado repetisse a cantilena e repetisse outra vez e ainda outra, tantas que o homem se aborreceu, o que não intimidou Schliemann: ele ofereceu dinheiro para que o sujeito lhe recitasse Homero todos os dias.

Foi assim que Schliemann desenvolveu seu extraordinário método de aprendizado de línguas: em apenas seis semanas, ele se tornava fluente em qualquer idioma. Sabia falar o seu alemão materno e mais inglês, francês, português, espanhol, holandês, russo, grego, grego antigo, latim, italiano, copta, romeno e até chinês. Como fazia isso? Vou contar, para você economizar em curso de inglês: Schliemann não traduzia nada. Pegava um texto e lia em voz alta, mas bem alta, a ponto de os vizinhos reclamarem do barulho, não raro obrigando-o a trocar de endereço. Às vezes, Schliemann contratava alguém para ler em voz alta para ele. Depois de acostumar o ouvido ao som das palavras, retomava o texto e tentava entender o significado. Um mês e meio, e pronto: podia ver filmes na nova língua sem legenda nem close caption.

Gênio.


Só que, para descobrir Troia, Schliemann precisava de tempo para viajar e pesquisar, e de dinheiro para contratar operários que o ajudassem nas escavações. Quer dizer: precisava ficar rico. Ora, ficar rico é muito mais fácil do que aprender todas as línguas europeias. Na verdade, ficar rico é bem fácil. Schliemann, portanto, enricou e... Mas estou me alongando. Queria falar das ideologias e tergiversei. O espaço acabou. Vou ter que continuar amanhã.

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