Nós, cristãos, com razão, estamos
habituados a considerar o individualismo sob o ângulo moral religioso. Opõe-se à
atitude evangélica. Jesus Cristo viveu existência centrada em Deus Pai e no
irmão. E mostrou-nos que aí reside a verdadeira felicidade do ser humano.
Um pensador francês afirma sem rodeios que o
individualismo é a ideologia da modernidade. E entende por ideologia o conjunto
de valores, de ideias, de símbolos que nos configuram a visão do mundo. Isso
quer dizer então que o cidadão moderno vê todas as coisas a partir da ótica
individualista. Soa terrível, mas parece verdade.
Cada um de nós é provocado então a
perguntar-se, se realmente, quando vai tomar uma decisão, quando vai escolher
uma profissão, quando aceita um emprego, o seu espontâneo e principal olhar se
dirige a si próprio, a seus interesses. Quando julga os acontecimentos, quando
analisa a situação, a sua ótica primeira é o próprio interesse. Então o filósofo
francês tem razão.
Se, porém, o bem comum, a vocação cívica, a
consciência de cidadania, a perspectiva social ocupam o primeiro lugar,
significa que nos afastamos da ideologia individualista.
Convergem para a criação de tal visão de mundo,
tanto o pensamento centrado no sujeito, como o sistema econômico voltado para a
iniciativa pessoal em vista do maior lucro. Respiramos tal ar todo o tempo.
É-nos então difícil escapar do peso dessa influência.
Além disso, tal cultura casa com o instinto de
autodefesa. Os instintos são as defesas avançadas de nossa vida. E funcionam por
primeiro. Há instintos individuais e instintos sociais. Mas mesmo os sociais
convergem para a proteção do indivíduo. Desta sorte, o instinto de sobrevivência
individual leva-nos a alimentar-nos, a cuidar das necessidades básicas com
ferocidade primordial. O instinto procriativo exerce também forte pressão sobre
o indivíduo.
A cultura humaniza os instintos. Desde o comer,
transformando o gesto animal em ato tão bonito e fraterno, como é a refeição
entre amigos. Assim por diante. Ora bem, só a cultura consegue orientar o
instinto individualista para atitude social. Para tanto, o evangelho oferece
excelente contribuição, ao converter as pessoas para a saída de si em direção ao
irmão. Trava-se verdadeira batalha entre a cultura ocidental capitalista, que
reforça o instinto individualista, e o anúncio da mensagem de fraternidade e
serviço. Anima-nos, porém, a certeza de que as pessoas perceberão a força
humanizante da cultura do outro, que encontra na pessoa, mensagem e prática de
Jesus exemplo perfeito.
--------------* Teólogo jesuíta. Licenciado em Teologia em Frankfurt (Alemanha) e doutorado pela Universidade Gregoriana (Roma). É professor da FAJE (Faculdades Jesuítas), em Belo Horizonte
Fonte: http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?boletim=1&lang=PT&cod=73473
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