conclusões da assembleia plenária do Pontifício Conselho da Cultura
As conclusões da assembleia plenária do
Pontifício Conselho da Cultura, que entre quarta-feira e sábado refletiu em Roma
sobre as "culturas juvenis emergentes", apresentam um retrato das principais
características da juventude, tal como é vista aos olhos da Igreja
Católica.
Prolongamento da idade juvenil,
instabilidade, mito da juventude, permanência na casa dos pais, analfabetismo
comunicativo, vulnerabilidade, violência, droga, economia de mercado,
tecnologia, ausência de perspetivas de futuro, redes sociais, relação com o
corpo, vida sexual e comunicação com a Igreja são alguns dos pontos
focados.
O Secretariado Nacional da Pastoral
da Cultura inicia hoje a transcrição, oficiosa e não integral, da primeira de
três partes do documento assinado pelo bispo português D. Carlos Azevedo,
delegado do Pontifício Conselho da Cultura. O texto original, em italiano, foi
publicado no site do dicastério do Vaticano.
Jesus inventou a parábola do
semeador para explicar as razões pelas quais a semente da Palavra, da mensagem
do Reino de Deus não entrava nos corações e não mudava a vida. Percebeu que era
uma questão de cultura, isto é, dizia respeito ao terreno.
«Escutai: o semeador saiu a semear.
Enquanto semeava, uma parte da semente caiu à beira do caminho e vieram as aves
e comeram-na. Outra caiu em terreno pedregoso, onde não havia muita terra e logo
brotou, por não ter profundidade de terra; mas, quando o sol se ergueu, foi
queimada e, por não ter raiz, secou. Outra caiu entre espinhos, e os espinhos
cresceram, sufocaram-na, e não deu fruto. Outra caiu em terra boa e, crescendo e
vicejando, deu fruto e produziu a trinta, a sessenta e a cem por um.» E dizia:
«Quem tem ouvidos para ouvir, oiça.» (Marcos 4)
S. Gregório Magno, na passagem da
Antiguidade para a Idade Média, escreve a "Regra Pastoral", onde indica o dever,
para os anunciadores do Evangelho, de respeitar a diversidade dos destinatários
da Palavra, da qual compila uma lista de 35 tipos.
" Hoje, a realidade juvenil em si
pede uma atenção particular, um discernimento crítico e uma conversão da
linguagem e das atitudes. "
< 1.
Observação >
Escutar as culturas juvenis é
conhecer os vários "géneros de terreno".
É notório um prolongamento da idade
juvenil, que hoje se mostra de maneira precoce porque fortemente estimulada e,
simultaneamente, dilata-se exageradamente dado que a saída do meio parental
ocorre após a estabilidade afetiva e profissional, esta última perturbada pelo
desemprego crescente. A instabilidade, que atinge diversas dimensões essenciais
da vida, da economia até à atividade profissional, da vertente educativa à
política, faz dos jovens, neste tempo "líquido", a parte mais fraca e vulnerável
da sociedade.
A atitude do ser jovem tornou-se
agora um mito ou um imperativo no horizonte social da eterna juventude, mesmo se
a faixa juvenil está geralmente excluída da vida económica, forçada à privação
social e acolhida com esforço nas comunidades cristãs. Por isto é ainda mais
urgente uma aproximação respeitosa ao "multiverso" juvenil.
Os jovens são caixa de ressonância
da crise da sociedade, com conotações culturais diversificadas em função das
condições, contextos e formações. Efetivamente, alguns jovens possuem enormes
recursos de conhecimento e informação e outros jazem em condições de
analfabetismo comunicativo; alguns jovens vivem uma situação de privilégio e
dispõem de recursos económicos, enquanto outros gozam de garantias sociais e
oportunidade de trabalho, mas muitos outros experimentam a precariedade, sem
possibilidades, incapazes de sair do "ninho" familiar e obrigados a emigrar, a
um deslocamento forçado, quase de fuga, com risco da própria vida, do falhanço
total, expostos a uma vulnerabilidade extrema e sem os direitos
fundamentais.
Outros, ainda, aceitam o mecanismo
do mercado e adotam o ciclo produtivo sem avaliação ética. Por outro lado há
quem entre no narcotráfico, na violência, mesmo por pura sobrevivência ou como
consequência do desencanto radical relativamente à sociedade e às instituições,
ou adesão como opção criminal em oposição à sociedade, enquanto alguns escolhem
o suicídio como renúncia a si próprios e sinal do vazio e da solidão.
No início do século XXI ocorre uma
grande viragem nas culturas juvenis, fruto de processos ainda em marcha: a
redução do papel do Estado nas políticas sociais; a aceleração das tecnologias e
a digitalização das comunicações unida a uma globalização cultural, o poder
crescente do mercado que extremou o consumo e ao qual muitos jovens se
submetem.
O fenómeno do protesto, nos anos
2011 e 2012, designado de movimento de "indignados", exprime por um lado o
desencanto e a exaustão das jovens gerações face ao sistema, as transformações
radicais na maneira de conceber a liderança, a velocidade de circulação de
informação; por outro, coloca em questão as velhas práticas políticas e a
maneira habitual de transmitir a fé.
O amadurecimento social não
constitui uma aspiração determinante dos jovens. Eles vivem um "presentismo" sem
futuro, onde a experiência tem valor em si mesma, passando-se de uma a outra sem
finalidade e sem distinguir os limites entre objetivo e subjetivo, fazendo da
experiência pessoal uma coisa pública, criando relações globais que confluem
numa "ciberidentidade". com a possibilidade de aceder a outras visões do mundo e
de produzir reflexões que vão para além de si próprio e dos seus
horizontes.
A tecnologia é um traço central da
identidade jovem, é uma força que dá centralidade à sua vida. O labirinto das
redes oferece espaço para novas procuras. Apoderam-se do saber sem olhar para a
autoridade. Os jovens tomam posição sem medo perante as informações, rompem os
sistemas hierárquicos, escolhem os temas e problemas mais significativos segundo
a própria subjetividade, guardam distância das lógicas das instituições e dos
partidos.
A experiência da construção de si
próprio assume contornos novos: as novas gerações tornam-se filhas de si
próprias, distanciando-se dos adultos, desde que elas se tornem companheiros de
uma vida partilhada e não obstáculos de autoridade de um processo de
afirmação.
A afirmação da identidade no corpo
é vivida muitas vezes com forte tensão. O modo de vestir, o look, as
tatuagens ou os piercings fazem parte da construção da própria
personalidade, afirmações do domínio sobre o corpo. O modo como se apresentam é
uma linguagem, um distintivo. A relação com o corpo é um meio para marcar a
individualidade, expressão de autoestima.
O desconforto de ser si próprio, as
dúvidas sobre a própria identidade vivem-se e resolvem-se no grupo que oferece
modelos e suporte. O olhar de quem está próximo é essencial para a
autoestima.
As culturas juvenis são uma visão
que nos ajudam a decifrar a vida em perspetiva do futuro. As tecnologias
intervém na experiência das pessoas e permitem a ampliação das potencialidades
humanas. O ambiente digital faz parte do quotidiano, é uma extensão do espaço
real da vida do nativo digital. Procuro, encontro, desfruto quando preciso.
Implica seleção, possibilidade de comentário e interação. Os jovens estão mais
prontos para a interação do que para a interiorização. Mas estas duas dimensões
devem ser conjugadas.
A pessoa humana, mais do que
procurar sinais e sentido, é invadida por respostas que não procurou. O
problema, hoje, consiste em descodificar os múltiplos dados recebidos.
Os jovens tornam-se narradores
através da revolução da fotografia, que além de ser um suporte para a memória,
torna-se um meio para fazer experiência da realidade.
É preciso salvaguardar espaços que
permitam à interioridade desenvolver-se, acolher as perguntas radicais e a
necessidade de silêncio e de meditação.
O modo de pensar está em fase de
mutação; o nativo digital vive a espiritualidade como algo que rompe o sistema,
muda as regras, a perspetiva habitual, a lógica automática.
Queremos compreender a mentalidade
juvenil, a cultura que a move, que orienta inteligências marcadas pela era
digital e corações sujeitos a uma intensidade emotiva vivida numa cultura de
relações centrada no eu.
A dificuldade no desenvolvimento
harmonioso das capacidades de relacionamento consigo próprio e com os outros, de
gerir e interpretar as próprias emoções conduz à insatisfação e, por vezes, à
depressão.
A ausência de uma conceção
integrada do amor e a facilidade de paixões fortes, unida a uma vida sexual
intensa constituem um desafio às comunidades educativas, a começar pela base
familiar, tantas vezes inexistente.
O equilíbrio emotivo entre
autonomia e dependência, entre escolha da felicidade e realidade sem saída, gera
ansiedade e angústia. Esta cultura possui uma linguagem que é preciso entrar e
que se exprime num género de música, de arte, com uma gramática própria.
Muitas vezes os jovens não
compreendem a linguagem da Igreja e a Igreja não compreende a linguagem dos
jovens. A comunicação fracassa por causa de um abismo de incompreensão cultural,
dado que a transmissão da fé é transmitida com metodologias ultrapassadas e sem
um testemunho credível e significativo.
Cada comunidade cristã, da família
á paróquia, da comunidade educativa ao movimento, é martelada com perguntas
sobre a ineficácia dos processos de iniciação cristã, perante uma contracultura
poderosa e eficaz.
Não obstante estes indicadores
negativos da análise sociológica das culturas juvenis, abrem-se fascinantes
motivos de esperança.
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Reportagem por Rui
Jorge Martins
Fotografias: Jornada Mundial da Juventude 2011, Madrid
Fotografias: Jornada Mundial da Juventude 2011, Madrid
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