Artigo|
Zero Hora
MONTSERRAT MARTINS
Médico psiquiatra, bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais
Não sabemos disso, pois não está clara nossa identidade nacional, tão diversas são as regiões do país. Mas o Brasil pode ser reconhecido tanto no interior do Acre quanto no do Rio Grande do Sul, o que fica mais evidente se você atravessar a fronteira para a Bolívia ou para o Uruguai. Vendo as diferenças para os outros é que reconhecemos as nossas semelhanças, com nossas virtudes e defeitos. O fato é que há um padrão de construções, de vias, de arquitetura, de praças, de comércio, de pavimentações, de paisagem física e humana, padrões estéticos e comportamentais que perpassam todo o território nacional e que nos caracterizam, sem que notemos.
Um país continente manter semelhanças do Oiapoque ao Chuí não pode ser obra do acaso. No Brasil do século 19, é atribuída à capacidade estratégica e de articulação política de José Bonifácio a manutenção de um território nacional unificado, em contraste com as sucessivas secessões da América espanhola.
Os anos 1800, mais que os da independência nacional, foram os de revoltas regionais, onde os poderes locais, ao se rebelar, se afirmaram diante do Império central, espírito que persistiu intenso nos primeiros anos de República. Do século 20 até o 21, tivemos décadas de getulismo, depois de governos militares e agora de lulismo, todos fortemente centralizadores. Há ainda fatores culturais. O povo português é tido como um dos que mais apreciam a miscigenação, em contraste com os outros povos europeus. E o Brasil sempre foi um país aberto a receber imigrantes, tal como os alemães e italianos, de presença marcante no Rio Grande do Sul.
Os fluxos internos também têm um papel nessa identidade, em qualquer região do país você encontra gaúchos, paulistas, baianos, cearenses. Ser “tudo junto e misturado” é uma virtude, no sentido do ecletismo de que aumenta nossa tolerância com a diversidade, isolando os intolerantes e preconceituosos em nossa cultura miscigenada. O reconhecimento da contribuição dessas múltiplas origens, no entanto, tarda em gerar efeitos em questões como a preservação do que resta da cultura indígena, hoje reduzida quase que só aos nomes das localidades do nosso país.
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