domingo, 16 de julho de 2017

Cemitério de animais de Casa Rosa (Itália). ALBERTO PIZZOLIAFPGetty Images

Cemitério de animais de Casa Rosa (Itália). ALBERTO PIZZOLI/AFP/Getty Images

Às vezes, o impacto provocado pela morte de um animal é comparável ao luto por um ser humano



Quando Ada Menéndez perdeu seu gato Rodolfo depois de uma longa convalescença, tomou a decisão de procurar ajuda psicológica para lidar com a ausência do animal de estimação com o qual viveu por quase 12 anos. Depois de se despedir dele e de guardar suas cinzas, Menéndez foi ao Espacio Ítaca, um centro espanhol onde psicólogos e terapeutas ajudam aqueles que acabaram de perder um animal de estimação. “Eu fiquei muito mal porque o Rodolfo ficou comigo durante toda a vida dele, vivemos só nós dois durante muito tempo e tínhamos uma relação muito especial”, conta Menéndez ao Verne. “Para mim, não era apenas um animal de estimação, era parte da minha família”.



Durante cerca de quatro meses, Menéndez fez terapia duas vezes por semana até que conseguiu integrar a morte do seu gato. “Fiquei deprimida, muito afetada, e como é algo que muitas pessoas não entendem, não se pode falar disso no trabalho ou com os amigos”, acrescenta Menéndez. “Me ajudou muito falar disso com a psicóloga, porque fora dali não havia lugar para desabafar e chorar”.

Às vezes, o impacto provocado pela a morte de um animal é comparável ao processo de luto que se vive depois de perder um amigo ou parente. Em 1988, Sandra B. Barker, atual diretora do Center for Human-Animal Interaction da Faculdade de Medicina da Virginia, realizou um estudo que mostrou como algumas pessoas percebiam a relação com seu animal de estimação de da maneira mais próxima do que o vínculo com seus parentes. Os indivíduos tinham de representar a família por símbolos e muitos deles colocaram o cachorro mais perto deles. “Identificamos que não havia diferença entre a proximidade com a família e com um animal de estimação”, explica Barker ao EL PAÍS por telefone. Uma década depois, em 1998, outro estudo revelou que a teoria do apego desenvolvida por John Bowlby (que define o fenômeno pelo qual os bebês estabelecem um vínculo com seu cuidador como instinto de sobrevivência) podia ser aplicada à relação animal de estimação-ser humano.

“Quando você introduz um animal em casa e convive com ele muitas horas por dia, ele faz parte de sua rotina e do seu dia a dia”, diz Sandra Sánchez, a psicóloga que tratou Menéndez. “As famílias mudaram e agora podemos ver vários modelos em que o animal se integra como mais um membro”, afirma.

“Nos ocupamos principalmente de casos de cães e gatos. Mortes inesperadas e casos de mortes de longa duração e doenças degenerativas. Também somos procurados por muita gente que precisa tomar a decisão de por um fim à vida do seu animal de estimação”, explica sobre sua experiência. “Nas sessões, trabalhamos a canalização emocional, técnicas de relaxamento... Em alguns casos, depois de poucas sessões as pessoas já conseguem seguir seu rumo, mas outras levam mais tempo. Há pessoas que precisam talvez de um ano”.

Um luto menos aceito socialmente

Segundo um estudo realizado pelo Canadian Veterinary Journal, 50% das pessoas que perderam seu animal de estimação dizem que a sociedade não avalia que essa morte seja digna de um processo de luto. “Nem todo mundo tem um animal de estimação e isso dificulta que as pessoas tenham empatia em relação a esses casos, e também porque se subestima o vínculo emocional que a pessoa pode ter com o animal”, acrescenta Sánchez.

A veterinária Mercedes González tem a mesma visão. “Como não é socialmente aceito que uma pessoa possa estar triste pela perda do cachorro, não se passa por todas as frases de luto e aí pode aparecer o problema. Por um lado, porque as pessoas ao seu redor não entendem e porque você mesmo não se permite estar triste”.

O que fazer e o que não fazer quando seu animal de estimação morre

Normalizar a tristeza e se permitir sofrer pela perda é um dos principais conselhos de Moira Anderson Allen, educadora especializada nesse tipo de luto. “Algumas pessoas acham útil expressar seus sentimentos e memórias através de poemas, histórias ou cartas para o animal de estimação”, diz Anderson Allen em seu site. “Outra estratégia é reorganizar sua agenda para preencher com outras atividades os momentos do dia que você costumava passar com o animal de estimação”, acrescenta a educadora.

“As formas de apoio variam muito, dependendo da pessoa”, diz Sandra Barker. “Um dos nossos pacientes tinha de aprovar a eutanásia do cachorro, mas antes de fazer isso, como último desejo, o levou para a praia e para comer hambúrgueres, passatempos favoritos do animal”.

Uma reação comum é adotar outro animal logo após a perda. No entanto, introduzir um novo membro animal na família só costuma ser aconselhável uma vez que o luto tenha sido superado. “Tivemos pessoas que já estavam pensando adotar outro animal, ou que queriam colocar o mesmo nome, e dizemos que isso é muito negativo e que não devem fazê-lo”, diz Sánchez.

“Não se deve buscar uma substituição para evitar a dor”, acrescenta Barker. “Vimos pessoas que acabaram decepcionadas porque o novo animal não era da mesma raça ou porque se comportava como o animal de estimação anterior”.

Outra coisa fundamental é usar a terminologia adequada. “Nós também dizemos às pessoas para tirar a palavra sacrifício do vocabulário, porque tem uma conotação muito negativa”, diz Sánchez. “Com um ser humano nunca chamaríamos dessa forma. É preferível dizer ‘morte digna’ ou eutanásia. Com essa terminologia o luto pode melhorar”.

A psicóloga Sandra Sánchez compartilha um conselho: “Quando um paciente me diz que nunca vai superar a perda, eu sempre conto essa história: ‘Imagine que eu disse que esse calor é insuportável, que o inverno nunca voltará’. Certamente ele responderia que é absurdo dizer algo assim, que o inverno sempre chega’. Com o luto é a mesma coisa. É preciso de tempo”.

Como ajudar as crianças a superar a perda

“Os menores não entendem o conceito de morte”, diz Barker, “e muitos podem se sentir culpados porque pensam que não cuidaram suficientemente do animal”. Nos casos com crianças, os especialistas recomendam evitar eufemismos. “Se você disser a eles que o cachorro morreu durante o sono, talvez possam ter medo na hora de deitar”, acrescenta Barker. A especialista norte-americana encoraja as famílias a envolver as crianças nas homenagens ao animal de estimação, porque “as crianças são muito boas fazendo cerimônias e desenhos”.

A veterinária Mercedes González ressalta que a atitude em relação às crianças deve ser a mesma que com a perda de um parente próximo. “Você tem de explicar a elas o que aconteceu e às vezes isso não é feito da mesma maneira porque não se dá importância”, explica. “Os pais talvez não tivessem muito apreço pelo hamster, por exemplo, mas é preciso levar em conta que a criança pode ter criado um vínculo mais forte com o animal e pode ser mais doloroso para ela”. Em primeiro lugar, paciência.
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Fonte:  https://brasil.elpais.com/brasil/2017/07/04/ciencia/1499163248_507694.html

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