domingo, 30 de julho de 2017

Eu tenho algo a ver com isso? 

        - MARCIUS MELHEM

FOLHA DE SP - 30/07

A gente sabe que não tá fácil. Violência, crise econômica e o Flamengo que não deslancha deixam nossos nervos à flor da pele.

Então, depois de muito refletir, elaborei um manual de como agir frente às questões da vida.

Regra número um: diante de qualquer questão sempre se pergunte "eu tenho algo a ver com isso?" Fim do manual.

Sei que à primeira vista parece complexo. Mas com exemplos fica mais fácil.

Situação 1: meu vizinho é gay e namora outro homem.

Pergunta: "eu tenho algo a ver com isso?"

Resposta: não.

Consequência: eles seguem a vida deles, e eu a minha.

Situação 2: o hospital público do meu bairro está abandonado.

Pergunta: "eu tenho algo a ver com isso?"

Resposta: sim. Se o bem é público, é de todos.

Consequência: eu me junto a outras pessoas, incluindo meu vizinho gay e seu namorado, e vou cobrar do poder público que a situação melhore.

Situação 3: eu sou evangélico e tenho um vizinho que é do candomblé, religião de que eu não gosto.

Pergunta: "eu tenho algo a ver com isso?"

Resposta: não.

Consequência: eu continuo com a minha religião e meu vizinho com a dele.

Situação 4: meu bairro está com assaltos frequentes.

Pergunta: "eu tenho algo a ver com isso?"

Resposta: sim. O Governo estadual tem obrigação de prover segurança à população.

Consequência: me junto a meu vizinho gay, seu namorado, e meu outro vizinho do candomblé, vamos até a delegacia do bairro e ao batalhão da PM responsáveis pela área e cobramos um plano de ação.

Situação 5: tenho uma vizinha que planta maconha e fuma.

Pergunta: "eu tenho algo a ver com isso?"

Resposta: não.

Consequência: ela continua se arriscando com essa droga ilegal, e eu continuo saudável com meu cigarro e meu uísque legalizados.

Situação 6: não estou satisfeito com os representantes do meu Estado no Congresso Nacional.

Pergunta: "eu tenho algo a ver com isso?"

Resposta: sim. Sou eleitor e ajudei a colocá-los lá.

Consequência: estudo melhor quem são os candidatos, depois me uno a meu vizinho gay, seu namorado, meu outro vizinho do candomblé, e minha vizinha maconheira. Juntos tentamos votar com mais consciência.

A questão no fundo é que 90% dos problemas do mundo não existiriam se as pessoas entendessem que se meter na vida do outro não melhora a nossa vida.

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