quarta-feira, 24 de setembro de 2014

" Catarata e Eleições "


Artigo Zero Hora

CRISTIANE AVANCINI ALVES
Professora universitária, doutora em Direito
 
No jogo eleitoral é difícil limpar os olhos da propaganda enganosa.
Foi impossível não se emocionar com o que meus olhos puderam ver: uma reportagem mostrou casos de brasileiros que sofrem de catarata e, por não terem informação ou condições financeiras, passam anos sem enxergar.
 
Os dados indicam que a catarata atinge metade da população acima dos 60 anos.
 
 Em um mutirão criado para combater a doença gratuitamente, algumas histórias chamaram a atenção, como a de Seu Rosalvo.
 
 Ele dependia da esposa, Dona Zélia, inclusive para fazer a barba, e quando ela o arranhava um pouco, ele dizia: “Por que você não cortou o pescoço?”. Após a cirurgia, Seu Rosalvo, emocionado, abraça a esposa. Enxerga tudo. Já Dona Alzira ficou 10 anos sem distinguir vultos, cores, formas. Em menos de 10 minutos, a cirurgia restituiu a ela não apenas o olhar, mas a percepção da vida e dos fios brancos de seu filho.
De acordo com a matéria, além da catarata decorrente do envelhecimento, a Organização Mundial da Saúde (OMS) atesta que, de cada 100 mil pessoas no mundo, apenas três sofrem de catarata congênita, ou seja, hereditária. Ela pode ocorrer por diversos fatores, como doenças durante a gravidez que atingem o feto, ou alterações genéticas. Os casos relatados e a emoção do “olhar” pela primeira vez ou após muitos anos fazem, também, refletir sobre o olhar que devemos lançar para as eleições que se aproximam.
No jogo eleitoral, é difícil limpar os olhos da propaganda enganosa, da promessa infundada, do discurso que desvia nossas mais humanas percepções. Parece que, ao contrário dos dados da OMS, sofremos de forte catarata congênita, e quando surge mutirão para nos fazer ver o caminho a seguir, os dados exitosos ainda são baixos: a cegueira insiste em ofuscar a luz para se chegar a um país efetivamente digno. Mas, a exemplo de Seu Rosalvo e Dona Alzira, as cores e formas podem voltar: a autonomia em manter intacto nosso pescoço porque enxergamos é força propulsora de mudança. Seu Rosalvo e Dona Alzira, ao ver, se tornaram plenamente livres para caminhar por si. Que possamos enxergar, no voto, essa mesma força e superação. Merecemos um Brasil sem catarata política.

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