MARTHA MEDEIROS
Sempre que saio da minha
consulta no analista, há uma senhora na sala de espera aguardando sua vez.
Antes, eu cruzava por ela e fazia um aceno educado com a cabeça. Com o tempo,
passei a sorrir e dizer tudo bem?. Em breve, me sentirei tão à vontade que
perguntarei : E aí, qual é a sua encrenca? Dificuldade de desapegar, síndrome do
pânico, bipolaridade?
E tudo terminará num bistrô, entre boas risadas.
Obviamente, meu comportamento demonstra um desajuste. Não é por acaso que preciso frequentar um profissional que aperte meus parafusos frouxos.
Já quando sou eu que estou na sala de espera aguardando, a situação se inverte. O paciente anterior sai e nem olha para os lados. Cruza por mim como se eu fosse uma cadeira vazia. Nem uma espichada de olhos, nem um esgar, nem um grunhido. Não existo. Ele passa reto. Sou uma cadeira.
Eu poderia ficar com a autoestima abalada, ele não sabe o risco que está causando. Ou talvez saiba, mas não se importa com o que sinto. Será que ele não se importa com o que sinto? Acho que estou desenvolvendo um complexo de inferioridade. Mais essa agora. Desse jeito, minha alta não virá nunca.
Sempre que entro em uma pequena sala de espera, qualquer que seja, cumprimento quem ali está. Não saio distribuindo beijinhos, mas demonstro educadamente que percebi a presença de outros no recinto. Logo, é natural que eu faça o mesmo numa sala de espera que frequento toda semana à mesma hora, e onde eventualmente vejo as mesmas pessoas saindo ou entrando. Compartilhamos uma rotina, ora.
Só que não é simples assim. Ninguém fica com vergonha de ir ao dermatologista, ao oftalmo ou ao otorrino, mas consultar um analista ainda é algo extremamente íntimo. Os pacientes sentem-se constrangidos ao serem vistos num ambiente onde costumam confessar seus traumas e fraquezas.
Talvez não acreditem na eficiência do revestimento acústico das paredes, desconfiam de que aquela criatura ali na sala de espera escutou os detalhes de suas compulsões sexuais e de suas neuroses cabeludas. Era para ter ficado tudo em segredo, era para ter sido um momento privado, inviolável, confidencial – e é! – porém, em poucos minutos, aquele estranho sentará na mesma poltrona (ou deitará no mesmo divã) e privará dos cuidados do mesmo profissional, imediatamente depois de termos estado ali, e a sensação é de promiscuidade.
Queremos acreditar que o terapeuta é só nosso.
Mas não é: o paciente sentado na sala de espera revela que somos apenas mais um, que nossos problemas não são o centro da atenção de quem nos analisa e de que é provável que as paranoias dele sejam mais interessantes do que nossos questionamentos banais. Intolerável. Melhor mesmo fazer de conta que ali fora está apenas mais uma cadeira vazia.
E tudo terminará num bistrô, entre boas risadas.
Obviamente, meu comportamento demonstra um desajuste. Não é por acaso que preciso frequentar um profissional que aperte meus parafusos frouxos.
Já quando sou eu que estou na sala de espera aguardando, a situação se inverte. O paciente anterior sai e nem olha para os lados. Cruza por mim como se eu fosse uma cadeira vazia. Nem uma espichada de olhos, nem um esgar, nem um grunhido. Não existo. Ele passa reto. Sou uma cadeira.
Eu poderia ficar com a autoestima abalada, ele não sabe o risco que está causando. Ou talvez saiba, mas não se importa com o que sinto. Será que ele não se importa com o que sinto? Acho que estou desenvolvendo um complexo de inferioridade. Mais essa agora. Desse jeito, minha alta não virá nunca.
Sempre que entro em uma pequena sala de espera, qualquer que seja, cumprimento quem ali está. Não saio distribuindo beijinhos, mas demonstro educadamente que percebi a presença de outros no recinto. Logo, é natural que eu faça o mesmo numa sala de espera que frequento toda semana à mesma hora, e onde eventualmente vejo as mesmas pessoas saindo ou entrando. Compartilhamos uma rotina, ora.
Só que não é simples assim. Ninguém fica com vergonha de ir ao dermatologista, ao oftalmo ou ao otorrino, mas consultar um analista ainda é algo extremamente íntimo. Os pacientes sentem-se constrangidos ao serem vistos num ambiente onde costumam confessar seus traumas e fraquezas.
Talvez não acreditem na eficiência do revestimento acústico das paredes, desconfiam de que aquela criatura ali na sala de espera escutou os detalhes de suas compulsões sexuais e de suas neuroses cabeludas. Era para ter ficado tudo em segredo, era para ter sido um momento privado, inviolável, confidencial – e é! – porém, em poucos minutos, aquele estranho sentará na mesma poltrona (ou deitará no mesmo divã) e privará dos cuidados do mesmo profissional, imediatamente depois de termos estado ali, e a sensação é de promiscuidade.
Queremos acreditar que o terapeuta é só nosso.
Mas não é: o paciente sentado na sala de espera revela que somos apenas mais um, que nossos problemas não são o centro da atenção de quem nos analisa e de que é provável que as paranoias dele sejam mais interessantes do que nossos questionamentos banais. Intolerável. Melhor mesmo fazer de conta que ali fora está apenas mais uma cadeira vazia.
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