sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Em algum Lugar do Paraíso



Por Gonçalo Junior De São Paulo

Verissimo diante da balança do tempo

Verissimo: elegância em textos sobre brevidade da vida, escolhas e amores não vividos.

Há quem ainda considere a crônica um gênero literário menor ou superado. Mesmo que grandes nomes das letras nacionais tenham se destacado nele - Carlos Drummond de Andrade, Fernando Sabino, Rubem Braga, Paulo Mendes Campos, Carlos Heitor Cony etc. Tudo bem que nas três últimas décadas o número de cronistas não tenha sido muito relevante. Mas bastou apenas um para carregar a tradição com maestria: Luis Fernando Verissimo. Desde a década de 1970, ele é um best-seller - quem não se lembra dos livros da L&PM? - com um jeito próprio de fazer textos curtos de humor com fins invariavelmente arrebatadores.

O autor criou tipos que se tornaram muito populares, como o Analista de Bagé e a Velhinha de Taubaté, e figuras avulsas às vezes anônimas. Como esquecer, por exemplo, o casal de vizinhos que se conheceu observando o lixo um do outro?

Desde então, Verissimo deixou de ser o filho do conceituado escritor Érico Veríssimo para andar com o próprio sobrenome. Aos 75 anos, seus textos continuam sutis e refinados, duas de suas marcas, e têm um quê de amadurecimento, de mais reflexivo do que da busca exclusiva do humor, como quem olha o tempo e a existência pela experiência e pela sabedoria - sem abandonar sua paixão por Jorge Luis Borges. Tornou-se um menestrel, mas que se mantém insubordinado ao rei.
A coesão das crônicas, contos e aforismos reunidos em seu novo livro - "Em Algum Lugar do Paraíso" - mostra uma visão da atualidade que pode passar despercebido a quem lê sua coluna semanal em jornais de todo país. A ótima seleção - não se sabe de quem - faz uma reflexão sobre a brevidade da existência, as escolhas que fazemos, os amores não vividos, as chances perdidas.

Elegância narrativa permeia essas crônicas de temática quase obsessiva que Verissimo, de modo irônico, chama de filosofia de vida. Como a do dilema do empresário compadecido com a truta viva que deve escolher para sua refeição. Ou a do homem de meia-idade que deixa a mulher preocupada porque não conseguiu fechar o zíper de seu vestido, após 30 anos de casamento.

Ou a do preço de um velório e a que trata de como dividir os CDs numa separação. Há também a da teoria do ralo, criada pelo dono de restaurante que compara as fortunas humanas ao mar. Num momento ruim, ele diz: "As ondas não estão só indo, estão só vindo. É como se o mar se retraísse. Como se o mar que ele via através dos janelões do seu restaurante se esvaziasse. Como se um ralo tivesse sido aberto no fundo do mar".

Na segunda metade do livro, as reflexões se tornam mais leves e o humor se sobrepõe, em ritmo que busca mais a graça. Verissimo mantém o pique quando implica com a inutilidade do bicho-preguiça e dá voz ao memorialista que ficou velho na época errada.

Pior, chegou às diferentes fases da vida quando elas já tinham perdido suas vantagens. A ponto de se casar, sem saber, claro, um dia antes do começo da revolução sexual, apenas para dormir com a namorada.

A escrita de Verissimo se destaca também pelo seu estilo econômico. Nenhuma palavra ou frase é desperdiçada. Nada está ali por acaso. Tudo é conduzido, sempre, para amarrar uma ideia, uma grande sacada.

Por mais esperançosas que possam parecer sobre relacionamentos duradouros, desgaste, traição, desejo secreto pela mulher do amigo etc., suas observações não têm nenhum propósito de autoajuda. A não ser nos fazer rir - ou chorar - como se estivéssemos diante do espelho.

"Em Algum Lugar do Paraíso"















Nenhum comentário:

Postar um comentário