domingo, 14 de abril de 2013

" Os nomes que doamos "


ANNA VERONICA MAUTNER*

Se a bebê é chamada de Terezinha,
a personalidade que
foi sonhada para ela não
é a de Tereza de Ávila
O sobrenome é herança, o nome é doação. Quando escolhemos o nome para um recém-nascido, estamos declarando algo sobre o que esperamos que ele venha a ser.
Ao batizar alguém de Tereza é preciso saber se pensamos em Terezinha de Lisieux, a carmelita francesa, ou em Tereza de Ávila, a poeta santa, erótica, que levitava de prazeres. Se a nossa recém-nascida ganha o apelido de Terezinha, a personalidade que foi desejada para ela não era a de Ávila.
 
 
O apelido também faz parte da dinâmica de projetar o destino desejado ao portador. Raras são as pessoas que não sabem o porquê dos seus nomes. Pais, avós e irmãos mais velhos adoram relembrar como o nome surgiu.
E tome histórias dos tempos em que um nome ou apelido emergiu e pegou. É uma Rafaela ou um Rafael que ganhou o nome do amigo que apresentou a mãe ao pai... e relatos do tipo. E tome histórias de como ocorreu, se por acaso ou de propósito.
Parentes recém-falecidos são lembrados, crianças são batizadas com os seus nomes. E figuras célebres na época do nascimento ganham espaço nas certidões: um jeito de manifestar admiração.
E ainda há famílias, felizmente raras, que se especializam em criar nomes. Waldemar com Eunice pode dar: Euniwals, Walmes, Waldimas e sei lá mais o quê.
 
 
Para evitar essas estripulias, alguns países não permitem o registro de nomes como os citados ou piores -tipo Um Dois Três de Oliveira Quatro ou Dix-Huit Rosado (esse devia ser o 18º filho de uma família brasileira e se tornou um político conhecido na década de 50). São países que limitam a escolha entre nomes de uma lista oficial.
Na Europa central, no começo do século, para evitar a proliferação de nomes de origem bárbara (de antigos asiáticos invasores) só eram admitidos nomes de santos.
Poderíamos continuar longamente esse périplo pelo mundo dos nomes próprios. Temos ao menos três tradições a nos orientar: europeia, indígena e africana.
Agora me ocorreu mais um caso, de alguém cujo pai estava lendo um livro e adorou uma das personagens. O nome era bonito, mas a portadora dele nunca quis ler o romance, não queria saber o que o pai esperava dela.
 
 
Morre o pai e a filha lê o livro, que sempre estivera na estante sem nunca ter sido tocado por ela. Qual não foi sua surpresa quando constatou que cumprira o desejo do pai?
Todo nome tem história ou faz história? E quem tem mais histórias para me contar?
Na próxima vez, falarei de apelidos que refletem a fantástica criatividade do povo!
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* ANNA VERONICA MAUTNER, psicanalista da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, é autora de "Cotidiano nas Entrelinhas" (ed. Ágora) e "Educação ou o quê?" (Summus)

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