sábado, 20 de abril de 2013

" O BRASIL de Ninguém "

Brasil de Ninguém
Dr J.J.Camargo

é cirurgião torácico e chefe do Setor de Transplantes

da Santa Casa de Misericórdia - Porto Alegre RS -


Quando o Jorge chegou ao consultório com uma carta de encaminhamento de uma doutora de Aldeota,na periferia de Fortaleza, impressionava
o esforço que fazia para respirar e o uso de toda a musculatura do tórax e do pescoço, na busca desesperada pelo ar que se negava a entrar nos seus pulmões enrijecidos pela aspiração repetida e prolongada de pó de pedra.
E a doutora comunicava que se eu pudesse ajudar o Jorge com o transplante de pulmão ,ela tinha mais 29( sim vinte e nove ) pacientes em situação
idêntica ,todos com menos de 25 anos de idade.
Essa tragédia brasileira é produzida em série,nas minas de carvão do SUL,na busca dos filões de pedras preciosas do BRASIL central nas perfurações de poços artesianos no NORDESTE.
Nos últimos dois anos, começaram a morrer os primeiros nova- iorquinos que, tendo experimentado a inalação maciça de sílica resultante da pulve
rização das torres gêmeas foram vitimados pela tragédia que mutila milhares de trabalhadores braçais brasileiros , que nunca ouviram falar de terror
rismo.Pelo menos não daquele terrorismo.
 
 
A inalação desprotegida do pó de sílica faz com que ele migre para as profundezas do pulmão, de onde nunca mais será removido pelo mecanismo protetor da tosse.
A presença do corpo estranho desencadeia uma reação inflmatória que se perpetua, produzindo um tecido de cicatriz que torna os pulmões cada vez mais rígidos.A falta de ar resultante disso é progressiva e desesperadora para quem sofre , e um terrível exercício de impotência para quem tenta ajudar.
Quando soube que o rapaz que o acompanhava era o único dos seis irmãos que não tivera a doença , e que os outros quatro,todos jovens ,já tinham morrido, quis saber se não lhes davam nenhuma proteção , e ele confessou que sim : mas, que a máscara era tão vagabunda que depois de dez ( 10 ) minutos os poros entupiam, e eles tinham que reitará-las para não morrerem asfixiados dentro delas.
Então não resisti perguntar:
" mas, Jorge ,você não podia ter escolhido fazer outra coisa? "
E a resposta foi devastadora :
" O problema , doutor , é que lá no sertão a gente acaba tendo que escolher entre a fome e a falta de ar porque a fome mata mais rápido ".


            Se este BRASIL é o PAÍS de TODOS , eu abro mão da minha parte !

J.J.Camargo Médico

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