sábado, 8 de outubro de 2011

a conversa fiada em tempo real...



O mundo no sofá da sala
Cláudia Laitano,ZH 08.10.2011

Em Tramandaí, lá no comecinho dos anos 70, televisão era um luxo. Durante o veraneio, para não perder o andamento da novela, uma ou duas vezes por semana minha mãe pegava a filha caçula pela mão e lá íamos nós filar a TV na casa da vizinha. Era esquisito invadir a intimidade de uma outra família, mas tinha lá seu charme rude: ver TV em uma sala lotada de vizinhos bicões era quase tão divertido quanto ir ao cinema – ou assim me parecia aos seis anos.

O cinema é um espaço de convivência entre estranhos que exige um certo protocolo de atitudes (deixar para comentar o filme depois da sessão, por exemplo, embora muita gente acredite que a narração em voz alta da história é um direito legítimo do espectador pagante).

Diante da TV, quem dita as regras é o dono da casa, que pode ou não aprovar os comentários simultâneos, a movimentação no ambiente, as trocas de canal nos intervalos. Talvez por isso a maioria das pessoas não tenha o costume de ver televisão em grupo (a não ser em datas especiais, como a Copa). A chance de seus hábitos televisivos não baterem com os dos seus amigos é grande: a TV é um hobby da intimidade por excelência.













Ou era. As redes sociais estão modificando para sempre a experiência de acompanhar um programa. Você está lá, vendo a cerimônia de entrega do Oscar, e não precisa mais esperar até o dia seguinte para comentar que o apresentador é um chato ou que o vestido da Gwyneth Paltrow deixou a atriz com peitos de ovo frito.

O horizonte do espectador se expandiu para além da sala de estar: hoje só assiste TV sozinho quem quer ou quem não tem interesse por Twitter ou Facebook. Seja a novela das oito ou um filme japonês sem legendas, todo mundo pode comentar com os amigos – e com o mundo – o que está vendo, transformando até aquele programa ruim ou bizarro em uma atração com um interesse que transcende o conteúdo em si.

A notícia do Jornal Nacional já não disputa a atenção apenas com outros programas ou com a internet, mas com a gravata do William Bonner e o penteado da Fátima Bernardes, que podem gerar mais comentários do que a crise na Europa ou o retorno da inflação. Parece bobo – e é. Mas uma das maiores revelações da internet sobre a humanidade é exatamente essa: somos muito mais bobos (e loucos) do que imaginávamos 20 anos atrás.

A conversa fiada em tempo real é talvez a maior revolução na maneira de ver TV desde que inventaram o controle remoto. Muito mais do que a tela plana, a alta definição ou o serviço de vídeos sob demanda que está chegando agora ao Brasil e permite assistir a filmes e programas ilimitados.

A tecnologia oferece muitas possibilidades, mas o que realmente impacta a experiência de consumir conteúdos é a maneira como nos relacionamos subjetivamente com ela. E essa foi uma das muitas lições que Steve Jobs deixou para esta e as futuras gerações.

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