sábado, 18 de novembro de 2017

 

18 DE NOVEMBRO DE 2017

CLAUDIA LAITANO

O abraço do tempo

A crise da meia-idade é bem diferente vista daqui das primeiras filas. Aos 25, quando ouvia alguém usando essa expressão, ela me soava não apenas distante como as montanhas do Tibete, mas um tanto ridícula. (O que a gente não acha ridículo quando tem 25 anos?) Se existia mesmo algum desconforto ligado à chegada da maturidade, as vítimas não eram as pessoas razoáveis e sensatas, entre as quais eu gostaria de estar incluída quando o futuro chegasse, mas apenas os pobres de espírito que perdiam tempo tentando nadar contra a corrente.

Aos 51, percebo que alguma crise de meia-idade é inescapável - mas, como quase tudo, será reflexo do que se viveu (ou não viveu) antes. Minha impressão, até aqui, é que as mudanças no rosto e no corpo são menos decisivas para esse mal-estar do que eu imaginava. OK, a parte mais visível da passagem do tempo tem um impacto imediato evidente, mas, ao contrário do que costumam pensar os mais jovens, o que procuramos no espelho, depois de uma certa idade, não é necessariamente nosso eu mais novo ou mais bonito, mas aquele que representa melhor a imagem mental que fazemos de nós mesmos. É a dificuldade de sintonizar essas duas imagens, a interna e a externa, que produz tantos homens e mulheres de triste figura.

Parte de qualquer crise da meia-idade, me parece, tem a ver com a necessidade de reconfigurar o espaço que as memórias do passado e os planos para o futuro ocupam em nossos pensamentos. Durante boa parte da vida, viajamos de uma etapa para outra com a bagagem leve dos primeiros anos. O resto é a própria história sendo escrita - família, estudos, amores, trabalho, viagens... - e um futuro a perder de vista onde cabem todos os projetos.

Em determinado momento, essa valise se torna um contêiner. Já não carregamos apenas as nossas lembranças, mas cada momento da vida dos nossos filhos e, em muitos casos, também as memórias de pais e avós que fazemos questão de proteger do esquecimento. Nos tornamos um livro de 500 páginas cheio de histórias para organizar e dar sentido - com alguns capítulos em branco para planejar, é verdade, mas sem muita margem para rascunhos. Experiências se acumulam, se sobrepõem, se misturam. O futuro, ao contrário, vai ficando estreito como uma faixa de areia depois que o mar avançou, o que nos obriga a cuidar dele com inteligência e um certo pragmatismo.

A maioria das pessoas que eu conheço não gostaria de voltar ao passado. Do que a gente realmente sente falta é de não pensar tanto assim na passagem do tempo. Acompanhamos o início e o fim de muita coisa. Vimos nossos ídolos ficando velhos, nossos amigos de infância perdendo o ar de moleques, nossos bebês se tornando adultos, nossos planos mais malucos sendo trocados por outros, menos espetaculares, mas mais factíveis.

Não importa o que tenham nos dito a respeito antes. A história mais antiga do mundo - a voraz transitoriedade de tudo que nos cerca - sempre nos pega de surpresa.

CLAUDIA LAITANO
 

18 DE NOVEMBRO DE 2017
DRAUZIO VARELLA

Exercício e mortalidade

o corpo humano é uma máquina que a evolução moldou para o movimento

Atividade física é o mais próximo do que poderíamos chamar de panaceia, na medicina moderna. Nos últimos anos, diversos estudos comprovaram que o exercício incorporado à rotina diária reduz o risco de doenças cardiovasculares, diabetes do tipo 2, câncer, obesidade, problemas reumatológicos e ortopédicos, depressão e o declínio cognitivo característico das demências.

Essas publicações mostraram de forma consistente que a prática de exercícios está associada a cerca de 30% de redução dos índices de mortalidade.

Talvez a lógica devesse até ser invertida: não é que o exercício faça bem para o organismo, a vida sedentária é que faz muito mal. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o impacto nocivo do sedentarismo na saúde é comparável ao do cigarro.

Não é de estranhar: o corpo humano é uma máquina que a evolução de nossa espécie moldou para o movimento. Por esse longo processo que eliminou os menos aptos, chegaram até nós corpos com pernas e braços longos e articulações que fazem as vezes de dobradiças para ampliar a mobilidade e o alcance de objetos distantes.

Com base na experiência científica acumulada, os serviços de saúde passaram a recomendar pelo menos 150 minutos semanais de atividade física moderada ou 75 minutos de atividade mais intensa. A crítica a esses trabalhos sempre foi a de que se baseavam na descrição dos níveis de atividade física colhidos em relatos individuais, que costumam ser imprecisos.

Um grupo da Universidade Harvard acaba de publicar na revista Circulation os resultados de um inquérito que envolveu 17,7 mil mulheres saudáveis, com idade média de 72 anos, cujos níveis de atividade foram avaliados por meio de acelerômetros, aparelhos que medem com mais acurácia a intensidade dos exercícios, o número de horas dedicadas a eles e o tempo gasto em inatividade.

As participantes usaram o acelerômetro os dias inteiros, durante uma semana típica de suas rotinas.

Metade das mulheres gastou 28 minutos diários na prática de exercícios moderados ou mais intensos (como andar bem depressa). A média diária de tempo dedicado a atividades leves (como o trabalho doméstico ou andar devagar) foi de 351 minutos.

Num período de observação que teve a duração média de dois anos, ocorreram 207 óbitos. De acordo com os níveis de atividade, as participantes foram divididas em quatro grupos. Na comparação com as menos ativas, as que se empenharam em exercícios mais intensos tiveram a mortalidade diminuída em 70%.

Os autores ressaltam que mesmo as que chegaram aos 80 anos se beneficiaram da prática de exercícios mais intensos e da redução do número de horas de inatividade.

A fragilidade mais importante desse estudo foi a de haver selecionado mulheres ativas e saudáveis. Teria sido interessante compará-las com sedentárias da mesma faixa etária.

O formato do estudo não permite estabelecer com segurança a relação de causa e efeito entre atividade física mais vigorosa e a longevidade, mas a probabilidade de se tratar de relação causal é alta.

No passado, os médicos recomendavam que as pessoas mais velhas fizessem repouso, para não "sobrecarregar" o organismo. A imagem dos avós aposentados que passavam os dias cochilando na poltrona da sala, até caírem fulminados pelo infarto do miocárdio ou derrame cerebral, faz parte das memórias daquela época.

Pacientes operados ficavam proibidos de levantar da cama por três ou quatro dias para não "dificultar" a cicatrização. Hoje, o coitado mal saiu do centro cirúrgico e o cirurgião aparece no quarto para expulsá-lo do leito, a ponta-pés, se necessário. O combate à imobilidade ajudou a reduzir significativamente o número de tromboses venosas e embolias pulmonares, responsáveis pelos altos índices de complicações e mortalidade pós-operatória daqueles dias.

A tendência atual é considerar tímida a recomendação de 150 minutos de exercícios leves ou 75 minutos de exercícios mais intensos, por semana, uma vez que o dia tem 1.440 minutos, e a semana 10.080.

- Como fazer com a falta de tempo? - você perguntará.

- Cara leitora, isso é problema seu.

      DRAUZIO VARELLA

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