O inesquecível de uma
atitude
J.J.Camargo [ é cirurgião
torácico e diretor do Serviço
de Transplante da Santa Casa de Misericórdia]
Nas relações coletivas ,há
uma compreensível tendência a valorizar o macro,em dettrimento do
pormenor,porque este teoricamente interessa a menos gente.Esse princípio,que
pode ser válido,por exemplo,na avaliação de marketing,não funciona assim na
percepção de alguém fragilizado pelo medo da morte,atento aos mínimos
detalhes,terrificado que está pela sensação torturante de que é o mais
vulnerável dos mortais.
Isto explica as respostas
inesperadas quando perguntamos a um paciente qual foi a experiência mais
marcante ou a descoberta mais memorável de sua internação.
Usualmente , a resposta é a
descriação de uma situação que não valorizamos e contransgedoramente,assumimos
que nem havíamos percebido.
O Ramires ,um advogado do
centro - oeste,queixoso de maus tratos em outro centro onde seu transplante de
pulmão foi negado porque ele tinha também uma grande hérnia de hiato,foi
admitido no nosso programa e três meses depois
transplantado.
No fim do procedimento ,a
hérnia que tinha sido o pivô da recusa foi corrigida,e o pós operatório foi uma
maravilha.
Duas semanas,depois,por
ocasião da alta,peguei uma carona na sua alegria e talvez por carência ou
simplesmente necessitado de um elogio,perguntei-lhe:" O que foi o mais
inesquecível dessa sua experiência hospitalar?"
E,ele ,meio encabulado ,mas
com o olho brilhando de emoção:" de tudo o que aconteceu aqui ?!"... - "
Sim,tudo !"
" Bem,foi a chegada ao
hospital.O Senhor lembra que me chamou às duas da madrugada? Pois quando cheguei
ao Dom Vicente Scherer ,eu estava com tanta falta de ar,que nem me animei a
acompanhar minha mulher no estacionamento,apesar de saber dos riscos daquele
hora.;Ela me deixou na portaria onde fui recebido pela Ana Lúcia,uma mulata de
sorriso lindo,que me disse:" não perrca tempo aqui,porque a burocracia eu faço
depois com a sua esposa.Suba diretamente para a UTI,aonde vão lhe preparar para
o transplante".
E então ela me ajudou com o
carrinho do oxigênio até o elevador e quando a porta ia fechar ela pôs a mão,a
porta reabriu,ela me deu um beijo e me disse "" boa sorte... eu vou rezar pro
senhor!"
Voces são maravilhosos mas o
que certamernte nunca vou esquecer é a sensibilidade e o afeto daquela moça,que
tendo percebido meu medo e aminha solidão naquela madrugada fria,foi capaz de
ser solidária,doce e generosa.
Foi assim que uma simples
atitude se cristalizou no coração daquele homem.
Inesquecivelmente,e ah....
doutor,o seu transplante foi bem legal!
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