terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Reflexões do primeiro dia, 2013

de Jairo Marques
Começar o ano é como entrar num campo muito fértil para incentivar o desabrochar de novos e esquecidos valores

É certo que tentar pensar em algo que não seja a frugal morte da bezerra num momento em que o bucho ainda digere o pernil da ceia de ontem regado a todo tipo de espumante é complexo, mas não há tempo melhor para fechar compromissos consigo mesmo do que o primeiro dia.

No primeiro dia de vida, o filho é desenhado pelos pais como meninão forte, bonito e vitorioso que levará ao ápice o orgulho da família com seus gols no futebol ou na disputa quase selvagem para virar um "seu doutor".

Mas seria ótimo se todos pudessem assinar também, logo após o tenro momento da existência, um documento na consciência firmando propósito de esforço para que aquele pequeno jamais seja desses que batem em gays pelas ruas, que são desaforados com as diferenças humanas.

No primeiro dia da escola, da faculdade, as folhas brancas dos cadernos novinhos guardam a esperança do conhecimento libertador. Projeta-se no futuro como o chefe da firma, como o descobridor da cura de algum mal.
 


Hora ideal para se comprometer a ser um profissional que não faltará aos plantões de final de ano seja qual for o tamanho da comemoração na casa da tia. Há sempre alguém cuja vida depende de serviços fundamentais.

E como não achar que o coração, finalmente, irá aportar o medo terrível da solidão ao abraçar e beijar a primeira namorada, ao receber o primeiro "eu te amo" em um romance? Mas relacionar-se implica selar, no mínimo, um pacto de felicidade mútua. Não há sentimento nobre em satisfação de um lado só.

Na hora do bem-bom, é salutar entender que sentimento também exige força na tristeza.

No primeiro dia após uma perda, é comum redesenhar momentos, pensar naquilo que poderia ter sido se... Mas ainda é impossível apertar o botão de retroagir para a vida, embora ele fosse algo "maraviwonderful" mesmo que pudesse ser acionado apenas uma vez.

Como a realidade é inexorável, um caminho que, tenho convicção, leva mais longe é fazer pacto de tentar ser melhor com quem ficou, com o que restou, com a forma que mudou. De cara, a revolta pode até ser legítima, mas é sempre inútil e em nada agrega no porvir, que vai exigir novos começou todos os dias.

E, para o apreço das reflexões, a coleção de primeiros dias é extensa. Do diagnóstico terminal, que pode se render ao tempo que ainda existe; da conquista de um campeonato, que abre alas para uma coleção de troféus e para muito mais vibração dos "fiéis".

Ainda compõem o rol o do novo emprego, o do desemprego, o das férias, o da posse de algum objeto de muito desejo, que seguramente vai instigar pensamentos a respeito de privilégios.

Começar o ano é como entrar em um campo muito fértil para incentivar o desabrochar de novos e esquecidos valores atropelados pelo egoísmo e pelo rame-rame de tocar o barco para a frente.

Seguir adiante sem, no mínimo, revisar o rumo, sem reconduzir o olhar para direções inéditas e potencialmente frutíferas para o bem, é perder oportunidade valiosa da aparente pureza energética e límpida que um primeiro dia apresenta.

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